Música alegre de piano Vamos ver um quadro enorme do pintor russo Wassily Kandinsky que trabalhava em Munique em 1913. Este quadro está em Moscow atualmente. Um ano antes da 1ª Guerra Mundial Exatamente. O nome desse quadro é Composição VII. Kandinsky usava muito nomes abstratos Ele pintou muitas composições. e muitas improvisações. É o tipo de título... Ele empresta isso da música. É. Isso é... É, como se houvesse uma orquestração Isso é uma orquestração pra ele. Há varias coisas importantes pra Kandinsky e uma delas é o modo como a cor está conectada à música e outros sentidos. Nós vemos certos sons e ouvimos certas cores É quase uma experiência sinestésica, né? Sim. Há um tipo de coligação. Há uma conexão natural ao casar som e cor ou cor e forma Achei que fossem todos os sentidos uma conexão de todos os sentidos Pode ser Acho que há experiências diferentes Acho que, tipo, essa sopa tem gosto azul Exato. Ou, a letra B é amarela. Eu tenho uma história sobre isso. Quando eu tinha 3 anos e fui ao médico e minha garganta doía O médico disse: " Como você está sentindo sua garganta?" Eu disse, "Vermelha" Eu lembro de gritar: "Vermelha" Eu só lembro da sensação de sentir a cor vermelha na garganta. É isso mesmo. Esse era o meu jeito de expressar como eu sentia a dor em minha garganta. Talvez haja uma conexão entre os sentidos e talvez haja um tipo de... Eu acho que Kandinsky meio que fala sobre isso Talvez não exatamente desse jeito mas que nosso cérebro de certa forma estragou isso. Que nós crescemos e entendemos a convenção mais e mais desassociados desses tipos de conexões primárias Mas Kandinsky passou muito tempo de sua vida tentando recuperar isso, né? É Se olharmos a pintura. Eu continuo olhando e depois me afasto e depois olho de novo e tento ver algum sentido nela. Eu acho que uma das coisas que são difíceis em Kandinsky é que eu não sei o que ele está fazendo na maior parte do tempo. Mas, se eu tento não pensar tanto sobre o que ele está fazendo e penso mais sobre como o quadro é e talvez alguma coisa com a qual a pintura soe. Ele nomeou seus quadros de Composição ou Improvisação... Ele também era amigo de um dos grandes compositores modernos o compositor vienense Arnold Schoenberg. Schoenberg trabalha com sons atonais e sistemas e composições atonais. Se você ouvir as músicas de Schoenberg e olhar para os quadros de Kandinsky acho que faz muito mais sentido. Nós temos uma parte da música né? Acho que sim (música suave de orquestra) Quando eu ouço Schoenberg e quando eu ouço músicas atonais Sempre sinto como se houvesse uma tentativa real de dar forma ao som e deixá-lo existir como quase uma representação abstrata dele mesmo Hm... Uhum. Eu vejo um tipo de coligação entre isso e o que alguns dos artistas desse período estavam fazendo. Principalmente alguém como Kandinsky Eu acho que a separação entre a representação e o mundo natural seja som ou música separados de uma composição narrativa... Mas, composição musical... quero dizer, música alta, o que chamamos de música clássica muitas vezes é desassociada. Há exemplos, como Beethoven A 6ª (sexta) Sinfonia imita uma tempestade Mas, muitas vezes não há uma narrativa direta. Há um tipo de abstração inerente. na música. na música. Quando se fala em uma referência atonal, mais consciente, do som da própria música uma representação da música quase. O que vejo como sendo mais compatível com essa abstração subconsciente na pintura Aham Mas, você acabou de qualificar um tipo de distinção muito importante e significativa entre pintar música que significa pintar tentando sempre criar algo que não é. Música, tem sido muito mais confortável historicamente, eu acho com a sua abstração inerente. Música pode provocar mudanças de humor e permite que você fique nesse espaço diferente e isso evoca emoções e meio que te leva àquele lugar específico Ouvir Schoenberg, isso é desconfortável para mim pros meus ouvidos. Não é algo tão agradável. Eu começo a me sentir fisicamente desconfortável. Simplesmente não gosto mas isso faz parte do conceito. Pintar, nesse momento, os modernistas no começo do século 20 estão tentando causar um tipo de disruptura. Acho que essa é uma questão interessante Quer dizer, o que tem essa atonalidade ou dissonância ou os quadros de Kandinsky. Formas que não parecem obviamente harmoniosas? Aham Como nessa pintura, na qual as formas e as linhas movem-se em diferentes direções como se fossem partes confrontando-se umas com as outras resultando num jeito dissonante. Como uma disrupção de espaço O que tem o modernismo que clama pela disrupção da melodia e sons harmoniosos e enxerga atonalidade como uma representação mais efetiva dele mesmo? Kandinsky está tentanto evocar sua própria experiência subjetiva de uma cor ou de uma forma ou qualquer coisa que ele esteja olhando. Ele está meio que criando aquele momento subjetivo fazendo-o parecer especificamente não referencial e não naturalista Não é sobre fazer uma ponte parecer uma ponte É sobre como você se sente quando está atravessando a ponte o que isso causa em você. Se olhar para o topo, quer dizer, isso é a linha de um horizonte lá em cima? Não sei. O que ele... Isso é uma paisagem? Descubra o que qualquer coisa é. Acho que isso é oque ele tenta passar É como se fosse um quadro sobre um conflito entre as próprias formas, né? Aham Acho que você está certa Acho que ele pressiona pra além do nosso desejo de associar isso com uma paisagem ou ainda com a vida ou algum tipo de representação mesmo que seja abstrata Podemos entender isso Ele é muito bem sucedido, eu acho, em nos empurrar para outro ponto no qual podemos levar a sério essa noção de forma e cor começando a conflitar de alguma forma fazendo o abstrato ser legítimo Vermelho contra amarelo, azul com verde... É, e de alguma maneira, é o que a música que acabamos de ouvir estava fazendo também O termo atonal fala sobre esse tipo de conflito entre os sons Mas tem algo sobre o mundo moderno que não faz sentido. Na música clássica há uma narrativa. Há uma narrativa há uma definição, mesmo que disruptiva. Sim. Sob o aspecto das coisas vindas do centro, não agarradas, né? É. Para falar em Yates de coisas desmoronando, desarticuladas O fato do mundo não ter uma narrativa que explica isso, que faz sentido, que não representa mais a posição dos humanos no universo Nesse contexto acho q. é irresistível dizer ok, estamos em 1913, a 1ª Guerra Mundial está para começar. Certo. Todos esses adversários estão aí Temos que ter cuidado ao afirmar isso Porém, é um mundo que está em um momento de crise Eu acho que a ideia de apocalipse é inevitável aqui. E nós não falamos sobre isso ainda mas ao olhar para o quadro, parece que Kandinsky está trabalhando com a ideia de apocalipse, que ele procura destruir e depois renovar o que é uma ideia muito atraente para o artista daquela época Realmente é, dentre as características italianas. Muitas obras passam essa ideia de destruir o que está lá Porque pra fazer algo novo tem que destruir o que já está lá Além disso, essa noção de limpar tudo Uhum. limpar tudo Com certeza, e criar uma utopia... ...que poderia substituir tudo isso Para mim, uma das coisas que são mais surpreendentes é que isso é antes da Primeira Guerra Mundial e tanta coisa mudou depois da Primeira Guerra Acho que quando percebem que... limpar tudo não é uma boa ideia Não. Não traz nada de bom É, e nós temos tecnologia agora que nos permite fazer isso. Temos metralhadoras. Nós temos....é. Veja o que acontece Pessoas são mutiladas e terrivelmente desfiguradas E não é nada bonito Pessoas não voltam E elas não tem visões que dão acesso à novas verdades. Eles apenas vêem, basicamente, o quão horríveis pessoas são umas com as outras Acho que esse quadro é anterior a isso Há uma ideia utópica sobre o que o apocalipse tratá que trará algum tipo de verdade interior Há também algum lado religioso? Há uma ideia espiritual um aspecto espiritual no quadro Kandinsky escreveu sobre espiritualidade na arte em 1911 dois anos antes de pintar isso Ele evoca uma conexão muito grande entre cor e arte e entre fé e espiritualidade sobre ter uma crença maior em algo. Para ele, o mundo moderno perdeu essa espiritualidade essa inocência, essa conexão com a emoção Uhum e uma emoção primitiva e o apocalipse pode restaurar isso para os seres humanos... o que a cultura de alguma forma roubou de nós É uma ideia bem primitivista. Eu acho essa ideia, as cores, a... os movimentos a conexão de tudo as coisas afastando-se e depois juntando-se Quando eu me permito ver as cores e linhas e formas como que sugerindo sentimentos e gostos e cheiros eu acho que esse quadro torna-se muito agradável. Há uma incrível liberdade no quadro que... nós usamos a palavra expressionismo que é tão diferente do Kandinsky posterior quando as coisas tornam-se muito mais sistematizadas e claras Há um senso de invenção maravilhoso E é enorme, então deve ter sido bem imersivo. Fico pensando que a meta central era nos dar uma grande declaração de uma sinfonia Acho que quanto mais eu olho para o quadro mais posso entender sobre ele mas tenho dificuldade em apreciá-lo É um quadro difícil. É um quadro difícil Acho que é pra ser difícil mesmo Talvez isso... É um momento difícil É interessante que ainda hoje seja difícil Duchamp e Warhol e todo o século do modernismo e pós modernismo passaram e ainda hoje é uma arte difícil Schoenberg ainda é difícil É, Schoenberg ainda é difícil Isso diz muito Verdade Ainda há muito poder (música alegre de piano) {Tradução: Mariana L. M. Amaral}