Todos os anos, 240 mulheres
são assassinadas no Afeganistão.
Todos os anos 565 mulheres
são assassinadas no Irã.
No Paquistão, 4 mil mulheres
são assassinadas.
Na verdade, essas 4 mil mulheres foram
assassinadas entre os anos de 1997 e 2004.
Não falo apenas de mulheres que estão
morrendo, mas sendo assassinadas.
Bem, vamos pensar a respeito.
Essas estatísticas são
mais uma subavaliação
da real ocorrência de assassinatos,
porque eles não são bem documentados.
Mas, quando pensamos
nessas mulheres que morrem,
que são assassinadas,
por que acham que isso acontece?
De fato, é em nome da honra,
do orgulho e da dignidade,
não somente da mulher,
mas do pai, dos tios, dos irmãos,
de qualquer homem da família.
É a imagem deles perante a comunidade.
Bem, vamos partir dos crimes de honra
para a mutilação genital feminina.
Para os que não sabem
o que é a mutilação genital,
trata-se do corte da genitália.
Algumas pessoas escolheram chamar
essa mutilação de "circuncisão feminina",
como um modo de suavizar isso,
para soar melhor.
Mas não façam isso,
porque a mutilação genital feminina
é a manipulação total
da parte exterior da genitália
para garantir que a abertura da vagina
não comporte a penetração do pênis.
E é tão comum no mundo todo
que a Organização Mundial da Saúde
estabeleceu uma classificação
em quatro tipos de mutilação.
Então, eis o primeiro tipo:
o clitóris é cortado.
Vocês talvez não saibam que o clitóris
é parte mais sensível do corpo feminino.
Ele possui 8 mil terminações nervosas,
2 vezes mais que o pênis.
Na verdade,
o equivalente ao clitóris,
no pênis, é a glande,
que tem outras funções,
como a uretra, por onde passa a urina.
Mas, na mulher, o único propósito
do clitóris é o prazer sexual,
mas ele é cortado.
No segundo tipo de mutilação,
o clitóris e os pequenos lábios,
ou "labia minora", são cortados.
O terceiro tipo é chamado de infibulação,
no qual se tenta estreitar
o orifício vaginal,
para assegurar que ele não abra,
formando um lacre.
Ou seja, lacram a vagina como se não
precisássemos dela para outras coisas,
por exemplo, para a eliminação
da menstruação todos os meses.
De que outra maneira
o sangue poderia sair?
Quarto tipo: tudo é permitido,
como raspagem e perfuração.
Ou seja, a garota tem entre 5 e 15 anos
e, de qualquer maneira, não é consensual.
Então, os adultos fazem o que quiserem,
de diferentes maneiras, livremente.
É como se essa garota
fosse uma mercadoria,
um produto que foi passado
do primeiro dono, o pai dela,
para o segundo, o marido ou "cliente".
E, para oferecer
um "serviço de alta qualidade",
eles têm que garantir que ela é intocada.
Não pode haver um produto
usado no mercado.
E se ele tiver sido usado,
manipulado ou modificado,
retiram-no do mercado.
E isso justifica o assassinato?
A manipulação da vagina
tem o objetivo de garantir que a garota
não tenha relação sexual
antes do casamento,
ou, se ela tiver,
será uma experiência dolorosa.
E está tudo bem?
Por quê?
Por que o mundo gira em torno da vagina?
Na Bíblia, no cinema e na literatura
o corpo feminino sempre
foi um receptáculo do pecado.
A mulher não tem permissão
para pensar em sexo,
para expressar a sexualidade,
muito menos para ter relações sexuais.
Muitas mulheres se abstêm
de relações sexuais antes do casamento,
o que deve ser respeitado.
Muitas mulheres decidem
nunca ter relações sexuais
para honrarem a Deus,
e isso também deve ser respeitado.
Mas também temos que respeitar
as escolhas de outras mulheres.
E tenho que esclarecer uma coisa:
o conceito de virgindade,
de abstinência sexual
não tem nada a ver com aquilo que fica
entre as pernas de uma mulher, o hímen.
Porque não podemos julgar
uma mulher com base nisso
se nem sabemos o bastante sobre o hímen.
Algumas mulheres nem têm um.
Bem, o que é o hímen?
Acho que, como estudante de medicina,
tenho estudado anatomia o suficiente
para dizer a vocês que o hímen
se parece com uma rosquinha.
Ele tem um buraco.
Perdoem-me a comparação,
mas ele tem um buraco.
Na verdade, o hímen pode ter
diferentes buracos
e, às vezes, algumas franjas no meio.
Ele apresenta diferentes tipos,
tamanhos e formatos.
Aliás, eu gostaria de esclarecer
alguns equívocos sobre o hímen.
Alguns homens se orgulham
de fazerem a mulher sentir dor
por causa do rompimento do hímen.
Não, não.
A verdade é que o hímen
não tem terminações nervosas.
Então, a mulher não sente dor
pelo rompimento ou por algum dano.
Ela sente dor porque a abertura
do canal vaginal não está bem dilatada,
pois algo deve ser feito antes
da relação sexual, a estimulação.
Se a mulher não for estimulada,
se for uma agressão sexual
ou se ela simplesmente não quiser,
não haverá abertura do canal,
o que fará com que ela sinta dor.
Mas quando há estimulação
antes do ato sexual,
o cérebro transmite
estímulos nervosos aos músculos,
os quais ficam relaxados,
o canal dilata e...
seja bem-vindo!
(Risos)
Gostaria de esclarecer também
sobre as manchas de sangue no lençol.
Na verdade, não sei se vocês sabem,
mas apenas metade das mulheres
sangra na primeira vez.
É como tirar a sorte com uma moeda:
sangraremos ou não.
Bem, é como julgar uma mulher
com base nas manchas de sangue no lençol,
e matá-la se ela não sangrar,
e isso tem acontecido, todos sabemos,
está documentado, é só procurar.
É como jogar uma moeda
para saber se ela morrerá ou viverá.
O que acham disso?
Gostaria de falar também
sobre o exame de virgindade,
que é o exame do hímen,
para saber se ele já foi rompido.
É basicamente um exame
no qual o ginecologista
abre as pernas da mulher;
é um exame visual e invasivo
para verificar a condição do hímen.
Um estudo foi feito entre 36 gestantes,
isso mesmo "gestantes",
no qual o ginecologista
verificou o hímen delas.
E o resultado do teste foi que 34
delas eram virgens, e 2 não eram,
de acordo com a condição do hímen.
O que isso nos diz sobre a confiabilidade
do exame de virgindade?
Esse exame é feito em garotas
na Argélia e no Marrocos.
Estamos em 2019, e a privacidade
das mulheres ainda é invadida.
A Organização Mundial da Saúde,
a UN Women e o Conselho
de Direitos Humanos da ONU
declararam que o exame
de virgindade é falível e antiético,
uma forma de violência contra a mulher,
uma invasão de privacidade,
que deve, portanto, ser banido,
e as organizações estão trabalhando nisso.
As garotas se sentem
realmente amedrontadas.
Ensinam a elas que o valor,
o orgulho, a dignidade,
não somente delas, mas da família,
ficam entre as pernas dela.
Por quê?
Aquelas garotas têm medo
de andar de bicicleta e romper o hímen.
Ou de que o exercício físico
possa rompê-lo.
Porque o bem mais precioso delas,
que também é o da família,
fica lá embaixo.
Há garotas passando por himenoplastia,
um procedimento cirúrgico
que reconstrói o hímen,
para simular a virgindade.
Elas terão relações sexuais,
mas por causa do pensamento machista
e da comunidade,
elas terão que passar pela himenoplastia.
E esse é o grande problema.
Se pesquisarem on-line,
há uma imagem de um hímen artificial,
que é introduzido na vagina,
com sangue falso de virgem.
O patriarcado trabalha duro,
mas a China trabalha muito mais!
(Risos)
(Aplausos)
Então, vamos falar
sobre a sexualidade feminina.
Não julguemos uma mulher
com base no que ela decide
fazer com seu corpo,
algo totalmente instintivo e natural.
Se você quer saber
se uma garota é virgem ou não,
não que isso seja problema seu,
tudo o que tem a fazer é perguntar a ela.
E a vagina,
da qual as pessoas têm sentido
vergonha a vida inteira,
é a razão de todos nós estarmos aqui hoje.
E obrigada por virem à minha palestra TED.
(Aplausos) (Vivas)