Vou sair do guião e deixar Chris muito nervoso por provocar a participação desta plateia. Vocês estão comigo? Sim? Ótimo. Quero que levante a mão quem já ouviu um casal heterossexual a fazer sexo. Podem ser os vizinhos, um quarto de hotel, os vossos pais, desculpem. Ok, quase toda a gente. Agora levantem a mão, se o homem estava a fazer mais barulho do que a mulher. Só vejo ali um homem... Não vale, se foi você. (Risos) Ele baixou a mão. E uma mulher. Ok. Sentada ao lado do tipo barulhento. O que é que isso nos diz? Diz-nos que os seres humanos fazem barulho quando fazem sexo e, geralmente, é a mulher quem faz mais barulho. Isso é conhecido como vocalização copulatória feminina, para os que estão a tomar notas. Eu nem sequer ia referir isto, mas alguém me disse que Meg Ryan podia estar aqui, (Risos) e ela é a vocalizadora copulatória mais famosa do mundo. Então pensei: "Tenho que falar sobre isso". Voltaremos a falar nisso depois. Vou começar por dizer que os seres humanos não descendem dos macacos, apesar do que vocês possam ter ouvido. Nós somos macacos. Somos mais próximos do chimpanzé e do bonobo do que o elefante africano é do elefante indiano, como Jared Diamond assinalou, num dos seus últimos livros. Temos mais afinidades com os chimpanzés e os bonobos do que os chimpanzés e os bonobos com qualquer outro primata, gorilas, orangotangos, quaisquer que sejam. Estamos extremamente próximos deles e, como vão perceber, em termos de comportamento também temos alguma relação. O que pergunto hoje, a pergunta que hoje quero explorar com vocês é: Que tipo de macaco somos, em termos de sexualidade? Desde os tempos de Darwin que vigora o que Cacilda e eu chamamos a narrativa padrão da evolução sexual humana. Vocês sabem o que é isso, mesmo que nunca tenham lido nada sobre o assunto. A ideia é que, fazendo parte da natureza humana, desde o início da era de nossa espécie, os homens têm como que alugado o potencial reprodutivo das mulheres, prestando-lhes certos bens e serviços. Genericamente, estamos a falar de carne, abrigo, posição social, proteção, coisas desse tipo. Em troca, as mulheres oferecem fidelidade ou, pelo menos, uma promessa de fidelidade. Isto coloca homens e mulheres numa relação de oposição. De acordo com esta visão, a guerra entre os sexos está no nosso ADN. Cacilda e eu afirmamos que não é assim. Essa relação económica, essa relação de oposição, é, na verdade, um produto da agricultura que só surgiu há 10 mil anos, no máximo. Anatomicamente, os seres humanos atuais existem só há cerca de 200 mil anos, portanto, estamos a falar de 5%, no máximo, da nossa época, enquanto espécie distinta moderna. Antes da agricultura, antes da revolução agrícola, é importante perceber que os seres humanos viviam em grupos de caça e colheita que se caracterizam, onde quer que se encontrem, por um igualitarismo feroz, como lhe chamam os antropólogos. Não só partilham as coisas, como exigem que as coisas sejam partilhadas: carne, abrigo, proteção, tudo isso que, supostamente, eram mercadorias que as mulheres trocavam pela sua fidelidade sexual. Acontece que tudo isso era partilhado amplamente nessas sociedades. Não estou a dizer que os nossos antepassados fossem bons selvagens, nem que os caçadores-recoletores modernos também sejam bons selvagens. O que estou a dizer é que essa é a forma mais simples de reduzir o risco num contexto de forrageio. Não há grande discussão sobre isto entre os antropólogos. Cacilda e eu alargámos essa atitude de partilha à sexualidade. Afirmamos que a sexualidade humana evoluiu, essencialmente, até à agricultura, como forma de estabelecer e manter as complexas cadeias flexíveis dos sistemas sociais em que os nossos antepassados eram muito bons. É por isso que a nossa espécie sobreviveu tão bem. Isso deixa as pessoas pouco à vontade. Portanto, é preciso fazer uma pausa nestas palestras para dizer: Oiçam bem. Digo que os nossos antepassados eram promíscuos, mas não digo que eles faziam sexo com estranhos. Não existiam estranhos. Num grupo caçador-recoletor, não há estranhos. As pessoas conhecem-se desde sempre. Digo que havia algumas relações sexuais que se sobrepunham, que os nossos antepassados provavelmente tinham várias relações sexuais diferentes em qualquer momento das suas vidas adultas. Mas não digo que eles faziam sexo com estranhos. Não digo que eles não amavam as pessoas com quem tinham sexo. Não estou a dizer que não havia afinidade entre o casal. Estou apenas a dizer que o sexo não era exclusivo. Aqueles de entre nós que escolheram ser monogâmicos... Os meus pais, por exemplo, foram casados durante 52 anos, sendo monógamos — e, se não foram monógamos... Pai e Mãe, nem quero saber. Não estou a criticar, não estou a dizer que isso é errado. O que digo é que afirmar que os nossos antepassados eram omnívoros sexuais não é uma crítica à monogamia, tal como afirmar que eles tinham uma dieta omnívora não é uma crítica ao vegetarianismo. Podemos optar por ser vegetarianos, mas não pensemos que, só porque tomámos essa decisão, o "bacon", de repente, deixa de cheirar bem. É aí que eu quero chegar. (Risos) Esta ideia levou um minuto a apanhar, não? Para além de ser um grande génio, um homem maravilhoso, um marido maravilhoso, um pai maravilhoso, Charles Darwin também era um tremendo puritano vitoriano. Ele ficou perplexo com os inchaços sexuais de certos primatas, incluindo chimpanzés e bonobos, porque esses inchaços sexuais tendem a provocar muitos machos a copular com as fêmeas. Ele não percebia por que diabo as fêmeas apresentavam essa coisa se tudo o que elas tinham que fazer era manter o vínculo. Darwin não sabia, mas as fêmeas dos chimpanzés e dos bonobos copulam uma a quatro vezes por hora com até doze machos por dia quando têm esses inchaços sexuais. O interessante é que os chimpanzés fêmeas têm inchaços sexuais durante cerca de 40% do ciclo menstrual, os bonobos fêmeas, 90%, e os seres humanos estão entre as poucas espécies do planeta em que as fêmeas estão disponíveis para sexo durante todo o ciclo menstrual, quer esteja menstruada, quer após a menopausa, ou mesmo se já estiver grávida. Isto é raríssimo entre mamíferos. É um aspeto muito interessante da sexualidade humana. Darwin ignorou o reflexo do inchaço sexual, na sua época... (Risos) ... como os cientistas tendem a fazer por vezes. Falamos de competição de esperma. O homem médio ejacula cerca de 300 milhões de espermatozoides. É um ambiente competitivo. Mas esse esperma está a competir com o esperma de outros homens ou com os seus iguais? Há muito que comentar neste gráfico. Para já, vou chamar a vossa atenção para a pequena nota musical por cima das fêmeas do chimpanzé, do bonobo e do homem. Ela indica a vocalização copulatória feminina. Reparem nos números. Um ser humano normal tem sexo cerca de mil vezes na vida. Se esse número parece alto para alguns, garanto que, para outros, parece baixo. Nós partilhamos esta proporção com os chimpanzés e os bonobos. Não a partilhamos com os outros três macacos, o gorila, o orangotango e o gibão que são o tipo de mamíferos mais comuns que têm sexo apenas cerca de 12 vezes na vida. Os seres humanos e os bonobos são os únicos animais que fazem sexo cara-a-cara enquanto ambos estão vivos. (Risos) Podemos ver que os seres humanos, os chimpanzés e os bonobos têm testículos externos o que, no nosso livro, comparamos a um frigorífico especial na garagem, apenas para a cerveja. Se vocês são o tipo de pessoas que têm cerveja no frigorífico da garagem, estão à espera de uma festa em qualquer altura e estão preparados. É isso que são os testículos externos. Mantêm frios os espermatozoides para poderem ter ejaculações frequentes. Desculpem, é a verdade. O ser humano — há quem fique contente por saber — tem o pénis maior e mais firme de qualquer primata Esta evidência vai muito para além da anatomia. Vai até à antropologia. Há registos históricos cheios de relatos de pessoas, em todo o mundo, que têm práticas sexuais que seriam impossíveis segundo o que assumimos sobre a evolução sexual humana. Estas mulheres são as mosuo do sudoeste da China. Na sociedade delas, todos, homens e mulheres, são totalmente autónomos sexualmente. Não há vergonha associada ao comportamento sexual. As mulheres têm centenas de parceiros. Não interessa. Ninguém liga. Ninguém comenta. Não é um problema. Quando a mulher engravida, a criança é criada por ela, pelas suas irmãs e irmãos. O pai biológico não é relevante. Do outro lado do planeta, na Amazónia, temos vários tribos que praticam o que os antropólogos chamam "paternidade partilhada". Essas pessoas acreditam — e não há contato entre eles, nenhuma linguagem em comum, portanto não é um ideia que se espalha, é uma ideia que surgiu pelo mundo — eles acreditam que um feto é, literalmente, feito de sémen acumulado. Assim, a mulher que quiser ter um filho inteligente, engraçado e forte, fará por ter muito sexo com um tipo inteligente, um tipo engraçado e um tipo forte, para ter a essência de cada um desses homens no bebé. Quando a criança nasce, esses homens hão de aparecer e reconhecer a paternidade da criança. Assim, a paternidade é uma espécie de obrigação da equipa, na sociedade. Há vários exemplos como este que descrevemos no livro. Porque é que isso é importante? Edward Wilson diz que nós precisamos de entender que a sexualidade humana é, primeiro que tudo, um dispositivo de ligação e só depois, de procriação. Penso que é verdade. Isso é importante porque a nossa sexualidade evoluída está em conflito direto com vários aspetos do mundo moderno. As contradições entre o que nos dizem que devemos sentir e o que realmente sentimos geram um grande sofrimento desnecessário. A minha esperança é que uma compreensão mais exata e atualizada da sexualidade humana nos levará a termos mais tolerância para com nós mesmos e para com os outros, e termos maior respeito por configurações de relações não convencionais como o casamento entre pessoas do mesmo sexo ou as uniões poliamorosas, e que, finalmente, acabemos com a ideia de que os homens têm um direito inato e instintivo de vigiar e controlar o comportamento sexual das mulheres. (Aplausos) Obrigado. Veremos que não são só os "gays" que têm que assumir a sua homossexualidade. Todos temos coisas para reconhecer. Quando assumirmos essas coisas, reconheceremos que a nossa luta não é entre nós mesmos, a nossa luta é contra a ultrapassada perceção vitoriana da sexualidade humana que mistura o desejo com o direito de propriedade, gera a vergonha e a confusão em vez do entendimento e da empatia. É altura de abandonarmos "Marte e Vénus" porque, na verdade, os homens são de África e as mulheres são de África. Obrigado. (Aplausos) Chris Anderson: Obrigado. Christopher Ryan: Obrigado. CA: Tenho uma pergunta, É tão atordoante tentar usar esses argumentos sobre a História da Evolução para transformar isso no que devemos fazer hoje. Alguém podia fazer uma palestra e dizer: "Olhem para nós, temos estes dentes afiados "e músculos e um cérebro muito bom para arremessar armas". Se olharmos para muitas sociedades em todo o mundo, veremos níveis muito altos de violência. A não-violência é uma escolha como o vegetarianismo, mas não é quem nós somos. Como é que isso pode ser diferente da palestra que você fez? CR: Primeiro que tudo, as evidências para os altos níveis de violência na Pré-História são muito discutíveis. Mas esse é apenas um exemplo. Claro, há muitas pessoas que me dizem: "Lá porque vivemos de certa forma no passado, não significa que devemos viver assim hoje em dia" e eu concordo. Todos temos que responder ao mundo moderno. Mas o corpo tem a sua herança... trajetórias evolutivas. Podemos viver de McDonald's e batidos de leite mas o nosso corpo vai revoltar-se contra isso. Nós temos apetites. Acho que foi Schopenhauer quem disse: "Uma pessoa pode fazer o que quiser "mas não pode querer o que quer". Aquilo que repudio é a vergonha associada aos desejos. É a ideia de que, se amarmos o marido ou a esposa, e nos sentirmos atraídos por outras pessoas, há qualquer coisa de errado connosco, com o casamento ou com o nosso parceiro. Penso que há muitas famílias desfeitas por expectativas irrealistas que são baseadas na falsa visão da sexualidade humana. É aí que quero chegar. CA: Obrigado, transmitiu-nos isso muito bem. Obrigado. CR: Obrigado, Chris. (Aplausos)