Boa noite, senhoras e senhores.
Quero começar com uma pergunta:
quem aqui se lembra do momento
que descobriu que ia morrer?
Eu me lembro.
Eu era menino,
e meu avô tinha acabado de morrer.
E me lembro de, alguns dias depois,
estar deitado na cama à noite,
tentando entender o que tinha acontecido.
O que significava ele estar morto?
Para onde ele tinha ido?
É como se ele tivesse sido engolido
por um buraco aberto na realidade.
E aí me ocorreu um pensamento
realmente chocante:
se ele morreu,
pode acontecer comigo também!
Será que aquele buraco na realidade
poderia me engolir também?
Será que ia se abrir debaixo da minha cama
para me engolir enquanto eu dormia?
Bem, em algum momento todas
as crianças tomam consciência da morte.
Acontece de muitas formas,
é claro, e costuma ser gradual.
A ideia da morte evolui
à medida que envelhecemos
e, se vasculharmos
os escaninhos da memória,
vamos nos lembrar de algo semelhante
ao que senti quando meu avô morreu
e quando percebi que poderia
acontecer comigo também.
Aquela sensação de que,
por trás disso tudo, o vazio nos espreita.
E essa percepção na infância reflete
a nossa percepção enquanto espécie,
assim como houve um momento
no seu desenvolvimento como criança
em que o sentimento do eu e do tempo
se tornou sofisticado o suficiente
para vocês perceberem que eram mortais.
Assim, em algum ponto da evolução
da nossa espécie,
algum senso humano remoto do eu e do
tempo se tornou sofisticado o bastante
para que estes fossem os primeiros
seres humanos a perceber: "vou morrer".
Trata-se, se preferirem, de uma maldição:
é o preço que pagamos por sermos
tremendamente inteligentes.
Temos de conviver com a consciência
de que a pior coisa que pode nos acontecer
certamente vai acontecer um dia.
O fim dos nossos projetos, esperanças,
sonhos, do nosso mundo individual.
Cada um de nós vive à sombra
de um apocalipse pessoal.
E é assustador! É pavoroso,
por isso, procuramos uma saída.
No meu caso, quando tinha uns cinco anos,
fui perguntar à minha mãe.
Bem, quando comecei a perguntar:
"O que acontece quando a gente morre?",
os adultos ao meu redor à época
responderam num típico misto inglês
de estranhamento e cristandade ambígua.
E a resposta que mais ouvi
foi que agora o vovô estava
"lá em cima olhando por nós".
E, se eu morresse também,
o que não aconteceria, é claro,
eu também iria lá para cima.
O que fazia a morte soar mais
como um elevador existencial.
(Risos)
O que não me parecia lá muito plausível.
Na época, eu costumava assistir
a um jornal para crianças,
e estávamos vivendo
a era da exploração espacial.
Sempre havia foguetes voando para o céu,
subindo ao espaço, indo "lá pra cima".
Mas nenhum dos astronautas, ao voltar,
jamais mencionou ter encontrado meu avô.
Ou qualquer outra pessoa morta.
Mas, como eu estava com medo,
a ideia de pegar o elevador existencial
para ver meu avô soava um pouco melhor
do que ser engolido pelo vazio
enquanto dormia.
E daí eu acreditei nisso,
mesmo não fazendo muito sentido.
E esse processo de pensamento
que tive quando criança,
e tenho tido muitas vezes
desde então, até mesmo como adulto,
é um produto do que os psicólogos
chamam de "distorção",
Distorção é a forma pela qual entendemos
algo errado sistematicamente,
calculamos mal, interpretamos errado,
distorcemos a realidade,
ou vemos o que queremos ver.
E a distorção sobre a qual
estou falando funciona assim:
confronte uma pessoa
com o fato de que ela vai morrer,
e ela vai acreditar em quase qualquer
coisa que lhe assegure que não é verdade
e que, invés disso, vai viver para sempre.
Mesmo que signifique pegar
o elevador existencial.
Bem, esta pode ser considerada
a maior distorção de todas.
Isso foi demonstrado
em cerca de 400 estudos empíricos.
Esses estudos são engenhosos,
mas simples, e funcionam assim:
pegamos dois grupos de pessoas
parecidas em todos os aspectos relevantes
e lembramos a um dos grupos
que eles vão morrer, e ao outro não,
e aí comparamos o comportamento deles.
Dessa forma, é possível observar
a influência no comportamento
quando as pessoas ficam
conscientes de sua mortalidade.
E sempre se chega ao mesmo resultado:
as pessoas lembradas de sua mortalidade
são mais propensas a crer em histórias
que dizem que elas podem escapar da morte
e viver para sempre.
Eis aqui um exemplo: um estudo recente
pegou dois grupos de agnósticos,
que são pessoas indecisas
quanto às suas crenças religiosas.
Daí, pediu-se a um dos grupos
para pensar sobre a morte,
e pediu-se ao outro grupo
para pensar sobre a solidão.
Perguntou-se a eles novamente
sobre suas crenças religiosas:
aqueles que pensaram sobre a morte
estavam duas vezes mais propensos
a expressar fé em Deus e em Jesus.
Duas vezes mais.
Mesmo sendo ambos
os grupos igualmente agnósticos.
Mas, coloque o medo da morte
neles, e eles correm para Jesus.
Bem, isso demonstra que lembrar a morte
às pessoas as deixa propensas a crer,
independentemente de evidência.
E isso não funciona só para a religião,
mas em qualquer tipo de sistema de crença
que prometa a imortalidade
sob qualquer forma:
seja ficando famoso, seja tendo filhos,
ou mesmo o nacionalismo
que promete que você pode viver
como parte de um grande todo.
Essa é uma distorção que moldou
o curso da história humana.
A teoria subjacente à distorção
nesses quase 400 estudos é chamada
de teoria do gerenciamento do terror.
E a ideia é simples assim:
desenvolvemos nossa visão de mundo,
que são as histórias que nos contamos
sobre o mundo e nosso lugar nele,
para nos ajudar a lidar
com o pavor da morte.
E essas histórias de imortalidade têm
milhares de diferentes manifestações.
Mas acredito que, por trás dessa
aparente diversidade, existam, na verdade,
apenas quatro formas básicas que essas
histórias de imortalidade podem tomar.
E percebemos que elas se repetem
ao longo da história
com apenas leves variações
para refletir a linguagem em voga.
Vou abordar rapidamente essas quatro
formas básicas de história de imortalidade
e tentar dar algum sentido
para a forma como elas são recontadas
por cada cultura ou geração
usando o vocabulário de cada época.
Bem, a primeira história é a mais simples:
queremos evitar a morte.
E o sonho de fazer isso neste corpo,
neste mundo, para sempre,
é o primeiro e mais simples tipo
de história de imortalidade.
E pode, à primeira vista,
parecer pouco plausível,
mas, na verdade, quase todas
as culturas da história humana
tiveram algum mito ou lenda
sobre o elixir da longa vida
ou da fonte da juventude
ou de algo que prometa
nos manter vivos para sempre.
No Egito antigo, havia tais mitos,
na Babilônia antiga, na antiga Índia,
na história europeia, nós os encontramos
no trabalho dos alquimistas
e, é claro, ainda hoje acreditamos neles.
A diferença é que contamos esta
história usando a linguagem da ciência.
Assim, centenas de anos atrás,
com os hormônios recém-descobertos,
esperava-se que os tratamentos hormonais
fossem curar a velhice e a doença.
Em vez disso, hoje nossa esperança está
nas células-tronco, na engenharia genética
e na nanotecnologia.
Mas a ideia de que a ciência
possa "curar" a morte
é apenas mais um capítulo
na história do elixir mágico,
uma história tão velha
quanto a civilização.
No entanto, apostar tudo na ideia
de encontrar o elixir
e viver para sempre
é uma estratégia arriscada.
Quando voltamos na história
procurando aqueles que buscaram
um elixir no passado,
descobrimos que a única coisa em comum
entre eles é que estão todos mortos.
(Risos).
Daí, precisamos de um plano reserva,
e é exatamente esse plano B
que o segundo tipo de história
de imortalidade oferece,
que é a ressurreição.
E se assenta na ideia
de que eu sou este corpo,
eu sou este organismo físico,
aceita a ideia de que vou ter de morrer,
mas sustenta que, apesar disso,
posso me levantar e viver novamente.
Em suma, posso fazer o que Jesus fez.
Jesus morreu, ficou três dias no sepulcro,
se levantou e viveu novamente.
E a ideia de podermos ressuscitar
e viver novamente é uma crença ortodoxa,
não apenas para os cristãos,
mas para os judeus e os muçulmanos.
Mas nossa vontade de acreditar nesta
história está tão profundamente arraigada
que a estamos reinventando
novamente na era científica,
por exemplo, com a ideia dos criônicos.
É a ideia de que, ao morrer,
você pode ser congelado,
e aí, eventualmente, quando a tecnologia
for avançada o suficiente,
você pode ser descongelado
e consertado, revivido e ressuscitado.
Assim, alguns acreditam
num Deus onipotente que os ressuscitará,
e outros acreditam que um cientista
onipotente assim o fará.
Mas, para outros,
a ideia toda da ressurreição,
de se levantar do sepulcro, é parecida
demais com um filme B sobre zumbis.
Consideram o corpo detonado demais, pouco
confiável para garantir a vida eterna.
Assim, eles jogam suas esperanças
na terceira história,
a mais espiritual de todas,
a ideia de que deixamos nosso corpo
para trás para viver como uma alma.
A maioria das pessoas do planeta
acreditam que têm uma alma,
uma ideia central em muitas religiões.
Mas, mesmo em sua forma atual
e em sua forma tradicional,
a ideia da alma ainda é altamente popular,
apesar de estarmos novamente
a reinventando na era digital,
por exemplo, com a ideia
de deixar o corpo para trás
e transferir sua mente, sua essência,
o seu verdadeiro eu para um computador,
e viver daí por diante
como um avatar no éter.
Mas, claro, há céticos que dizem que,
se olharmos para a evidência da ciência,
particularmente a neurociência, ela sugere
que a mente, sua essência, o eu real,
é bastante dependente
de uma parte particular do corpo,
que é o cérebro.
E tais céticos conseguem encontrar
alento no quarto tipo de história,
que é o legado.
A ideia de continuar a viver
por meio do eco deixado no mundo.
Como o grande lutador grego Aquiles,
que sacrificou sua vida lutando em Troia,
para ganhar fama imortal.
E a busca pela fama nunca
foi tão disseminada e popular
como hoje em dia.
E, em nossa era digital,
é até mais fácil de alcançar.
Não precisa ser um grande guerreiro
como Aquiles ou um grande rei ou herói,
basta ter uma conexão de internet
e um gato engraçado.
(Risos)
Algumas pessoas preferem deixar um legado
mais tangível, biológico, como filhos.
Ou elas meio que esperam viver
como parte de um todo maior
uma nação, ou família, ou tribo
ou seu patrimônio genético.
Mas, de novo, existem céticos que duvidam
se o legado é mesmo a imortalidade.
Woody Allen, por exemplo, disse:
"Não quero continuar vivo
nos corações dos meus compatriotas.
Prefiro continuar vivo
no meu apartamento".
(Risos)
E, para continuar vivo no apartamento,
precisará de um elixir, é claro.
Que foi nosso primeiro tipo
de história de imortalidade.
Assim, eis os quatro tipos básicos
de histórias de imortalidade
e eu simplesmente tentei explicar
como são recontadas por cada geração,
com apenas pequenas variações
para se ajustar à moda da época.
E o fato de serem recorrentes
de uma forma tão semelhante,
mas em sistemas tão diferentes
de crenças, sugerem, penso eu,
que devemos ser céticos
sobre a verdade de qualquer
versão particular dessas histórias.
O fato de alguns acreditarem
que um Deus onipotente
vai ressuscitá-los para viver novamente,
e outros acreditaram que um cientista
onipotente vai fazer isso,
sugere que nenhum deles está realmente
se baseando na força da evidência.
Na verdade, acreditamos nessas histórias
por sermos influenciados a fazê-lo,
e somos influenciados a acreditar nelas
porque temos muito medo da morte.
Assim, a pergunta é: estamos fadados
a viver a única vida que temos
de uma maneira forjada
pelo medo e pela negação?
Ou podemos superar esta distorção?
Bem, o filósofo grego Epicuro
achava que sim.
Ele sustenta que o medo da morte
é natural, mas não é racional.
A morte, ele disse, não é nada para nós,
pois, quando estamos aqui,
a morte não está,
e, quando a morte estiver aqui,
já teremos ido.
Isso sempre é citado, mas é difícil
de entender de verdade, internalizar,
exatamente por ser muito difícil
lidar com essa ideia de desaparecer.
Assim, dois mil anos depois,
outro filósofo, Ludovic Wittgenstein,
colocou desta forma:
a morte não é um evento da vida,
não vivemos para experimentar a morte.
E disse mais: neste sentido, a vida
não tem fim.
Assim, era natural para mim, como criança,
temer ser engolido pelo vazio,
mas não era racional,
pois ser engolido pelo vazio
não é algo que nenhum de nós
vai viver para experimentar.
Mas superar esta distorção não é fácil,
pois o medo da morte está
profundamente enraizado na gente.
Por isso, quando percebemos
que o próprio medo não é racional
e trazemos à luz
como isso pode inconscientemente
nos influenciar,
podemos, então, pelo menos,
começar a tentar
minimizar a influência
que tem em nossas vidas.
Acho que ajuda se enxergarmos
a vida como um livro.
Assim como um livro está limitado
por suas capas, pelo começo e pelo fim,
assim também nossas vidas estão
limitadas por nascimento e morte.
E, mesmo o livro estando limitado
pelo começo e pelo fim,
ele consegue abarcar paisagens distantes,
figuras exóticas, aventuras fantásticas.
E, mesmo o livro estando limitado
pelo começo e pelo fim,
seus personagens não conhecem horizontes.
Eles conhecem apenas os momentos
que constroem sua história,
mesmo quando o livro está fechado.
E, assim, os personagens do livro
não têm medo de chegar à última página.
Long John Silver não tem medo do leitor
chegar ao fim de "A Ilha do Tesouro".
E devia ser assim também com a gente.
Imaginem o livro da sua vida, a capa dele,
o início e o fim sendo, respectivamente,
o nascimento e a morte.
Vocês conhecem apenas
o que acontece no meio,
os momentos que constroem sua vida.
Não faz sentido ter medo
do que acontece fora dessas capas,
tanto antes do seu nascimento,
quanto depois da sua morte.
E não precisam se preocupar
com o tamanho do livro,
se é uma tirinha de quadrinhos
ou se é um épico.
O que realmente importa é
que vocês façam dele uma boa história.
Obrigado.
(Aplausos).