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Como transformar a insatisfação em ação

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    Por vezes,
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    temos um sentimento
    negativo sobre as coisas.
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    Não nos sentimos felizes
    com a forma como as coisas correm.
  • 0:10 - 0:14
    Sentimo-nos frustrados e insatisfeitos,
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    e, muitas vezes,
    escolhemos viver com isso.
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    É um sentimento negativo que dizemos
    para nós mesmos que temos de aguentar.
  • 0:22 - 0:25
    No entanto, eu acredito profundamente
  • 0:25 - 0:27
    que todos nós temos a capacidade
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    de transformar esse sentimento negativo
    num sentimento positivo,
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    permitindo que a nossa insatisfação
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    dê à luz uma mudança.
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    Em 6 de janeiro de 1999,
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    eu estava a trabalhar em Londres
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    quando os canais de notícias
    começaram a transmitir
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    a invasão de rebeldes
    na minha cidade natal,
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    Freetown, na Serra Leoa.
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    Milhares de pessoas perderam a vida,
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    e havia cadáveres espalhados
    pelas ruas de Freetown.
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    Uma tia idosa do meu marido
    foi queimada viva,
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    e eu pensei no meu filho de dois anos
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    ao ver imagens de criancinhas
    com membros amputados.
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    Os colegas disseram-me:
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    "Como podemos ajudar?"
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    Eu não sabia.
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    Comecei a ligar para os números
    de telefone que apareciam no ecrã
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    quando as agências internacionais
    humanitárias começaram a pedir ajuda
  • 1:23 - 1:26
    para angariar dinheiro
    para enfrentar a tragédia.
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    A imprecisão daquelas conversas
    de telefone desiludiram-me.
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    Senti que as pessoas
    que estavam a angariar dinheiro
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    pareciam muito distantes da crise
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    e isso era compreensível,
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    mas eu não estava satisfeita
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    e não estava convencida
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    de que as intervenções que elas
    viessem a implementar
  • 1:46 - 1:49
    teriam o impacto
    que tão claramente era necessário.
  • 1:50 - 1:53
    Senti o estômago apertado
    durante dias
  • 1:53 - 1:57
    enquanto continuava a assistir
    aos horrores que desfilavam na televisão.
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    Interrogava-me continuamente:
  • 1:59 - 2:01
    "O que é que eu podia fazer?
  • 2:01 - 2:03
    "O que é que eu devia fazer?"
  • 2:03 - 2:07
    O que eu queria fazer era ajudar
    as crianças afetadas pela guerra.
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    Foi isso que fizemos.
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    Eu, a minha irmã e alguns amigos
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    criámos o Sierra Leone
    War Trust For Children, SLWT.
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    Decidimos concentrar-nos
    nos milhares de pessoas deslocadas
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    que tinham fugido dos conflitos
  • 2:22 - 2:25
    e estavam a viver em condições
    muito más, muito difíceis
  • 2:25 - 2:28
    em acampamentos em Freetown.
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    O nosso trabalho começou
    no acampamento de Ross Road,
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    no lado leste da cidade.
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    Trabalhando com uma
    organização de saúde local,
  • 2:35 - 2:40
    identificámos cerca de 130
    das mães solteiras mais vulneráveis
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    com crianças com menos de 5 anos,
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    e ajudámo-las dando-lhes
    aptidões profissionais,
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    microcrédito,
  • 2:50 - 2:53
    tudo o que nos pediam.
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    Trabalhar naquelas condições difíceis,
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    somente com os direitos básicos,
    não foi fácil,
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    mas o nosso sentido coletivo
    de insatisfação
  • 3:02 - 3:05
    perante uma situação inaceitável
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    manteve-nos focados em conseguir
    que as coisas fossem feitas.
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    Algumas daquelas mulheres
    abriram pequenos negócios,
  • 3:12 - 3:14
    pagaram os seus empréstimos,
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    e permitiram que outras mães com filhos,
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    tivessem as mesmas
    oportunidades que elas.
  • 3:20 - 3:22
    E nós continuámos.
  • 3:23 - 3:27
    Em 2004, abrimos um centro
    de formação em agricultura
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    para antigos soldados-meninos.
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    Quando a guerra acabou,
  • 3:31 - 3:35
    iniciámos um programa de bolsas de estudo
    para raparigas carenciadas
  • 3:35 - 3:38
    que, de outro modo,
    não poderiam continuar na escola.
  • 3:39 - 3:42
    Hoje, Stella, uma dessas raparigas,
  • 3:42 - 3:45
    está em vias de se formar como médica.
  • 3:45 - 3:49
    É incrível o que uma
    dose de insatisfação pode gerar.
  • 3:49 - 3:51
    (Aplausos)
  • 3:52 - 3:55
    Dez anos depois, em 2014,
  • 3:55 - 3:57
    a Serra Leoa foi atingida pelo Ébola.
  • 3:57 - 4:03
    Eu estava a trabalhar em Freetown
    no projeto de um hotel, em 25 de maio,
  • 4:03 - 4:05
    quando foram anunciados
    os primeiros casos
  • 4:06 - 4:09
    e tinha voltado a Londres,
    em 30 de julho,
  • 4:09 - 4:12
    quando foi anunciado
    o estado de emergência,
  • 4:12 - 4:15
    no mesmo dia em que
    várias companhias aéreas
  • 4:15 - 4:18
    suspenderam os voos para a Serra Leoa.
  • 4:18 - 4:22
    Lembro-me que chorei durante horas,
    perguntando a Deus:
  • 4:22 - 4:25
    "Porquê? Porquê nós?"
  • 4:26 - 4:28
    Mas, para além das lágrimas,
  • 4:28 - 4:30
    comecei a sentir novamente
  • 4:30 - 4:33
    aquele profundo
    sentimento de insatisfação.
  • 4:33 - 4:37
    Quando, seis meses depois
    da confirmação dos primeiros casos,
  • 4:37 - 4:41
    a doença ainda estava a espalhar-se
    rapidamente pela Serra Leoa,
  • 4:41 - 4:45
    e o número de pessoas infetadas
    e mortas continuava a crescer,
  • 4:46 - 4:48
    o meu nível de frustração e raiva
  • 4:48 - 4:52
    subiu tanto que eu percebi
    que não podia ficar parada
  • 4:52 - 4:55
    e assistir à crise, fora da Serra Leoa.
  • 4:55 - 4:58
    Em meados de novembro,
  • 4:58 - 5:04
    despedi-me dos meus muito amados
    e compreensíveis marido e filhos,
  • 5:04 - 5:08
    e embarquei num avião
    quase vazio para Freetown.
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    Freetown tinha-se tornado
    no epicentro da epidemia.
  • 5:11 - 5:14
    Havia centenas de novos casos
    todas as semanas.
  • 5:15 - 5:17
    Eu falava com diversos
    especialistas de medicina,
  • 5:17 - 5:19
    epidemiologistas
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    e outras pessoas todos os dias.
  • 5:21 - 5:24
    Estavam todos muito assustados.
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    "Não teremos êxito enquanto não falarmos
    diretamente com as pessoas",
  • 5:29 - 5:31
    disse o Dr. Yoti,
  • 5:31 - 5:35
    um médico do Uganda que trabalhara
    para a Organização Mundial da Saúde
  • 5:35 - 5:37
    e estivera envolvido praticamente
  • 5:37 - 5:40
    em todos os anteriores surtos
    de Ébola em África.
  • 5:40 - 5:41
    Ele estava certo,
  • 5:41 - 5:45
    e contudo, não havia
    nenhum plano para isso.
  • 5:45 - 5:48
    Então, durante um fim de semana
    no início de dezembro,
  • 5:48 - 5:53
    eu desenvolvi um plano conhecido
    por "plano da região oeste".
  • 5:53 - 5:56
    Nós precisávamos de falar
    "com" as pessoas,
  • 5:56 - 5:58
    e não "para" as pessoas.
  • 5:58 - 6:02
    Precisávamos de trabalhar com pessoas
    que tivessem influência na comunidade
  • 6:02 - 6:05
    para as pessoas acreditarem
    na nossa mensagem.
  • 6:05 - 6:07
    Precisávamos de conversar discretamente,
  • 6:07 - 6:09
    e não com megafones.
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    Precisávamos de mais camas.
  • 6:11 - 6:14
    O CNRE — o Centro Nacional
    de Resposta ao Ébola,
  • 6:14 - 6:16
    criou e implementou esse plano,
  • 6:17 - 6:19
    e por volta da terceira semana de janeiro,
  • 6:19 - 6:22
    o número de casos diminuiu drasticamente.
  • 6:22 - 6:24
    Pediram-me para trabalhar
  • 6:24 - 6:26
    como Diretora de Planeamento do CNRE,
  • 6:26 - 6:29
    o que me levou a percorrer o país,
  • 6:29 - 6:31
    tentando manter-me à frente da epidemia
  • 6:31 - 6:33
    mas também andando atrás dela,
  • 6:33 - 6:35
    até a aldeias remotas nas províncias
  • 6:35 - 6:38
    assim como em bairros de lata urbanos.
  • 6:39 - 6:42
    Numa ocasião, saí do meu carro
  • 6:42 - 6:45
    para pedir ajuda para um homem
    desmaiado na estrada.
  • 6:45 - 6:48
    Sem querer, pisei o líquido
  • 6:48 - 6:51
    que escorria pela estrada
    onde ele estava deitado.
  • 6:51 - 6:53
    Corri para casa dos meus pais,
  • 6:53 - 6:55
    lavei os pés com cloro.
  • 6:55 - 7:00
    Nunca esquecerei a espera
    do resultado dos testes àquele homem
  • 7:00 - 7:04
    sempre a medir a minha temperatura
    durante toda a epidemia.
  • 7:05 - 7:10
    A luta contra o Ébola
    foi a experiência mais difícil
  • 7:10 - 7:13
    e mais gratificante da minha vida.
  • 7:13 - 7:15
    Sinto-me realmente agradecida
  • 7:15 - 7:17
    por aquela insatisfação
  • 7:17 - 7:19
    ter-me aberto o espaço
  • 7:19 - 7:21
    para eu poder ajudar.
  • 7:21 - 7:25
    A insatisfação pode estar
    sempre em segundo plano,
  • 7:25 - 7:27
    ou pode ser repentina,
  • 7:27 - 7:29
    acionada pelos eventos.
  • 7:30 - 7:32
    Às vezes é as duas coisas.
  • 7:32 - 7:35
    Com a minha cidade natal, foi assim.
  • 7:36 - 7:40
    Ao longo dos anos, a nossa cidade mudou,
  • 7:40 - 7:43
    e causou-me muita tristeza.
  • 7:44 - 7:46
    Recordo uma infância
  • 7:46 - 7:49
    em que cresci a subir às árvores,
  • 7:49 - 7:52
    a colher mangas e ameixas
  • 7:52 - 7:55
    no campus da universidade
    onde o meu pai era professor.
  • 7:56 - 8:00
    Íamos pescar nos riachos
    dos jardins botânicos
  • 8:00 - 8:06
    As encostas em volta de Freetown estavam
    cobertas por uma vegetação exuberante
  • 8:07 - 8:09
    e as praias eram limpas e imaculadas.
  • 8:09 - 8:13
    A duplicação da população de Freetown
    nos anos que se seguiram à guerra civil,
  • 8:14 - 8:17
    e a falta de planeamento
    e de controlo na construção
  • 8:17 - 8:20
    resultaram num desflorestamento maciço.
  • 8:20 - 8:23
    As árvores, a beleza natural,
    foram destruídas
  • 8:23 - 8:26
    para arranjar espaço
    para novas comunidades,
  • 8:26 - 8:28
    formais ou informais,
  • 8:28 - 8:30
    e para o corte de lenha.
  • 8:30 - 8:34
    Sentia-me profundamente
    perturbada e insatisfeita.
  • 8:35 - 8:38
    Não foi apenas a destruição
    das árvores e das encostas
  • 8:38 - 8:39
    que me incomodou.
  • 8:39 - 8:42
    Foi também o impacto das pessoas,
  • 8:42 - 8:47
    como as infraestruturas falharam
    em acompanhar o crescimento populacional:
  • 8:47 - 8:50
    sem qualquer sistema sanitário,
  • 8:50 - 8:55
    uma cidade suja com tifo,
    malária e disenteria.
  • 8:55 - 8:58
    Eu não conhecia as estatísticas
    naquela época,
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    mas, em 2017,
  • 9:01 - 9:06
    só 6% de resíduos líquidos
    e 21% de resíduos sólidos
  • 9:06 - 9:08
    estavam a ser recolhidos.
  • 9:08 - 9:10
    O restante ficava connosco,
  • 9:10 - 9:13
    nos quintais, nos campos, nos rios
  • 9:13 - 9:16
    e depositados no mar.
  • 9:17 - 9:22
    Os passos para lidar com o profundo
    sentimento de raiva e frustração que senti
  • 9:22 - 9:25
    não se revelaram magicamente
    nem claramente.
  • 9:25 - 9:28
    Não é assim que funciona
    o poder da insatisfação.
  • 9:29 - 9:32
    Funciona quando sabemos que
    as coisas podem ser mais bem feitas
  • 9:32 - 9:37
    e funciona quando aceitamos
    os riscos que a mudança comporta.
  • 9:37 - 9:40
    Então, em 2017,
  • 9:41 - 9:43
    eu acabei por me candidatar a "mayor"
  • 9:43 - 9:45
    porque sabia que as coisas
    podiam ser melhores.
  • 9:45 - 9:48
    Parece que as pessoas
    concordaram comigo,
  • 9:48 - 9:49
    porque ganhei as eleições.
  • 9:50 - 9:52
    (Aplausos)
  • 9:52 - 9:57
    Hoje, estamos a implementar
    um plano ambicioso
  • 9:57 - 9:59
    para transformar a nossa cidade.
  • 10:00 - 10:03
    Quando falo em nós,
  • 10:03 - 10:05
    o que me deixa mesmo animada
  • 10:05 - 10:07
    é que falo de toda
    a comunidade de Freetown,
  • 10:08 - 10:14
    seja participando em competições,
    como premiando o bairro
  • 10:14 - 10:17
    que faz mais melhorias
    na limpeza geral,
  • 10:17 - 10:19
    seja nos nossos programas
  • 10:19 - 10:24
    que estão a liderar e a unir as pessoas
    e os serviços de recolha de resíduos,
  • 10:24 - 10:26
    através das nossas aplicações.
  • 10:27 - 10:29
    Hoje, Freetown
  • 10:29 - 10:32
    é uma cidade muito mais limpa,
  • 10:32 - 10:35
    e, na última estação chuvosa,
    plantámos 23 000 daquelas árvores
  • 10:35 - 10:39
    que nos tornaram tão conhecidos.
  • 10:39 - 10:40
    (Aplausos)
  • 10:40 - 10:42
    Em 2020,
  • 10:42 - 10:44
    planeamos plantar um milhão de árvores
  • 10:44 - 10:48
    na campanha
    "Freetown, Cidade das Árvores".
  • 10:48 - 10:51
    (Aplausos)
  • 10:51 - 10:56
    Às vezes temos um sentimento
    negativo sobre as coisas.
  • 10:57 - 11:00
    Não nos sentimos felizes com a forma
    como as coisas estão a ser feitas.
  • 11:00 - 11:04
    Sentimo-nos insatisfeitos e frustrados.
  • 11:05 - 11:08
    Podemos mudar esse sentimento negativo
    num sentimento positivo.
  • 11:10 - 11:14
    Se acreditarmos que as coisas
    podem melhorar,
  • 11:14 - 11:19
    temos a opção de fazer algo
    em vez de não fazer nada.
  • 11:20 - 11:24
    A dimensão e as circunstâncias
    das nossas situações serão diferentes,
  • 11:24 - 11:26
    mas para cada um de nós,
  • 11:27 - 11:30
    todos temos uma coisa em comum.
  • 11:31 - 11:34
    Podemos assumir riscos
    para fazer a diferença.
  • 11:34 - 11:36
    E vou terminar dizendo:
  • 11:36 - 11:38
    Deem um passo em frente,
  • 11:38 - 11:39
    assumam os riscos.
  • 11:39 - 11:42
    Se nos pudermos unir
    pelo poder da insatisfação,
  • 11:42 - 11:44
    o mundo será um lugar melhor.
  • 11:44 - 11:46
    Obrigada.
  • 11:46 - 11:48
    (Aplausos)
Title:
Como transformar a insatisfação em ação
Speaker:
Yvonne Aki-Sawyerr
Description:

Depois da devastadora invasão rebelde de Freetown em 1999 e da epidemia do Ébola em 2014, Yvonne Aki-Sawyerr, "mayor" da cidade, recusou-se a permanecer paralisada pela sua frustração com a situação. Em vez disso, ela usou a sua fúria como catalisadora para a ação. Nesta palestra inspiradora, ela conta como transformou a sua cidade correndo os riscos necessários para fazer uma mudança drástica e mostra como podemos encontrar poder na nossa insatisfação.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
12:01

Portuguese subtitles

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