Não é fascinante como o simples ato
de desenhar uma linha no mapa
pode transformar nossa maneira
de ver e sentir o mundo?
E como os espaços
entre linhas e fronteiras
transformam-se em lugares.
Tornam-se lugares onde a língua,
a comida, a música
e as pessoas de culturas diferentes
se misturam umas com as outras
de maneiras belas e, às vezes,
violentas e muito ridículas.
Essas linhas traçadas em um mapa
podem, na verdade,
criar cicatrizes na paisagem
e em nossa memória.
Meu interesse pelas fronteiras surgiu
quando eu estava pesquisando
uma arquitetura das regiões fronteiriças.
Eu estava trabalhando em vários projetos
ao longo da fronteira EUA-México,
projetando edifícios feitos de lama
retirada diretamente do solo.
Também trabalho em projetos que parecem
ter imigrado para essa paisagem.
"Prada Marfa", uma escultura de "land art"
que cruza a fronteira
entre a arte e a arquitetura
e que demonstrou para mim
que a arquitetura pode comunicar ideias
muito mais complexas
política e culturalmente,
que a arquitetura pode ser
satírica e séria ao mesmo tempo
e pode mostrar as desigualdades
entre riqueza e pobreza
e o que é local e o que é estrangeiro.
Em minha pesquisa de uma arquitetura
das regiões fronteiriças,
comecei a me perguntar:
"O muro é arquitetura?"
Comecei a documentar meus pensamentos
e minhas visitas ao muro
criando uma série de recordações
para nos lembrar da época
em que construímos um muro
e de que aquela era uma ideia maluca.
Criei jogos da fronteira,
(Risos)
postais,
globos de neve com pequenos
modelos arquiteturais dentro deles
e mapas que contavam a história
da resistência ao muro,
e busquei maneiras pelas quais o design
pudesse esclarecer os problemas
que o muro da fronteira estava criando.
Então, o muro é arquitetura?
Bem, é certamente uma estrutura de design
projetada numa instalação
de pesquisa chamada FenceLab,
em que veículos de quase
cinco toneladas eram carregados
e atirados contra o muro a 60 km/h
para testar a resistência dele.
Mas também havia
uma contrapesquisa do outro lado:
o projeto de pontes levadiças portáteis
que poderíamos levar até ao muro
e permitir que os veículos
passassem por cima.
(Risos)
Como em todos os projetos de pesquisa,
há sucessos e fracassos.
(Risos)
Mas essas reações medievais ao muro -
pontes levadiças, por exemplo -
existem porque o muro em si é uma forma
de arquitetura misteriosa e medieval.
É uma resposta simplista demais
a um conjunto complexo de assuntos.
E várias tecnologias medievais
surgiram ao longo do muro:
catapultas que lançam fardos
de marijuana por cima dele,
(Risos)
ou canhões que disparam pacotes
de cocaína e heroína por cima do muro.
Durante a época medieval,
corpos doentes, cadáveres,
eram, às vezes, catapultados
por cima das muralhas
como uma forma primitiva
de guerra biológica,
e especula-se que hoje
os seres humanos estão sendo
lançados por cima do muro
como uma forma de imigração.
Uma ideia ridícula.
Mas a única pessoa
conhecida e documentada
lançada por cima do muro
do México para os EUA
foi, de fato, um cidadão norte-americano
a quem autorizaram ser lançado como bala
de canhão humana por cima do muro,
a 60 metros,
contanto que levasse
o passaporte dele na mão.
(Risos)
Ele aterrissou com segurança
em uma rede do outro lado.
Meus pensamentos são inspirados
numa citação do arquiteto Hassan Fathy,
que disse:
"Os arquitetos não projetam muros,
mas os espaços entre eles".
Embora eu ache que os arquitetos
não devam projetar muros,
considero importante e urgente
que eles prestem atenção
aos espaços entre os muros.
Eles devem projetar,
para os locais e as pessoas,
as paisagens que o muro põe em perigo.
As pessoas já estão se levantando
para essa ocasião
e, embora o objetivo do muro
seja manter as pessoas afastadas e longe,
ele, na verdade, reúne as pessoas
de maneiras extraordinárias,
com eventos sociais como aulas de ioga
binacionais ao longo da fronteira,
para unir as pessoas
dos dois lados da divisória.
Chamo isso de "pose do monumento".
(Risos)
Já ouviram falar do "murobol"?
(Risos)
É uma versão fronteiriça do voleibol,
praticada desde 1979,
(Risos)
ao longo da fronteira EUA-México,
para comemorar o patrimônio binacional.
Isso levanta algumas
perguntas interessantes:
"Tal jogo é mesmo legal?
Será que bater uma bola
de um lado para o outro do muro
constitui um comércio ilegal?"
(Risos)
A beleza do voleibol
é que ele transforma o muro
em nada mais do que uma linha na areia
negociada pela mente, pelo corpo
e espírito de jogadores dos dois lados.
Acho que é exatamente desse tipo
de negociação bilateral
que precisamos para derrubar
os muros que dividem.
Arremessar a bola
por cima do muro é uma coisa,
mas atirar pedras por cima dele
tem causado danos aos veículos
da patrulha da fronteira
e ferido os agentes dela.
A reação do lado dos EUA foi drástica.
Os agentes da patrulha da fronteira
dispararam pelo muro
e mataram pessoas que atiraram
pedras do lado mexicano.
Outra reação dos agentes da patrulha
foi erguer proteções de basebol
para protegerem a si mesmos
e a seus veículos.
Essas proteções se tornaram
uma característica permanente
na construção de novos muros.
Comecei a pensar se, como o voleibol,
talvez o beisebol deveria ser
uma característica
permanente na fronteira,
e os muros poderiam começar a se abrir
permitindo que as comunidades
se encontrassem e jogassem.
e, se elas rebatessem a bola pra fora,
talvez um agente da patrulha
pegaria a bola
e a arremessaria de volta
para o outro lado.
Um agente da patrulha da fronteira
compra uma raspadinha gelada
de um vendedor, apenas a alguns metros.
Troca-se comida e dinheiro pelo muro,
um evento totamente normal torna-se ilegal
pela linha traçada em um mapa
e por alguns milímetros de aço.
Essa cena me fez lembrar de um ditado:
"Se você tem mais do que necessita,
deve fabricar mesas maiores
e não muros mais altos".
Então, criei este suvenir
para me lembrar do momento
em que pudemos compartilhar
comida e conversas por toda a divisória.
Um balanço permite que uma pessoa
entre e salte para o outro lado,
até que a gravidade a deporte
de volta ao próprio país.
A fronteira e o muro dela
são hoje considerados
uma espécie de teatro político.
Por isso, talvez devêssemos convidar
um público para esse teatro binacional,
onde as pessoas podem se reunir
com artistas, músicos.
Talvez o muro não passe
de um enorme instrumento,
o maior xilofone do mundo,
que poderíamos tocar ao longo do muro
com armas de percussão em massa.
(Risos)
Quando previ essa biblioteca binacional,
eu queria imaginar um espaço
em que fosse possível compartilhar
livros, informação e conhecimento
por toda a divisória,
e o muro não passasse
de uma estante de livros.
Talvez a melhor maneira de ilustrar
a relação mútua que temos
com o México e os EUA,
seja imaginando uma gangorra
em que as ações de um lado
têm consequência direta
no que acontece do outro,
porque a fronteira em si
é um ponto de apoio simbólico e literal
para as relações EUA-México
e construir muros entre vizinhos
rompe essas relações.
Talvez se lembrem desta citação:
"Boas cercas fazem bons vizinhos".
Ela é frequentemente considerada a moral
do poema de Robert Frost, "Mending Wall".
Mas o poema questiona
a necessidade de construir muros.
Trata-se de um poema sobre melhorar
as relações humanas.
Meu verso preferido é o primeiro:
"Algo existe que não adora um muro".
Porque uma coisa é clara para mim:
não há dois lados definidos por um muro.
Isso é uma paisagem dividida.
De um lado, pode ser assim:
um homem que corta a grama
enquanto o muro surge no quintal dele.
Do outro lado, pode ser assim:
o muro é a quarta parede
da casa de alguém.
Mas a realidade é que o muro
está separando a vida das pessoas.
Está separando nossa propriedade privada,
as terras públicas, nossas terras
norte-americanas nativas, nossas cidades,
uma universidade,
nossos bairros.
E não consigo deixar de pensar
no que seria se o muro dividisse uma casa.
Lembram-se das desigualdades
entre riqueza e pobreza?
À direita, está o tamanho médio
de uma casa em El Paso, Texas;
à esquerda, o tamanho médio
de uma casa em Juarez.
Aqui o muro passa diretamente
pela mesa da cozinha.
E aqui ele passa pela cama do quarto.
Porque eu queria comunicar que o muro
não está dividindo apenas os lugares,
mas também pessoas e famílias.
A política infeliz do muro está
separando hoje crianças de seus pais.
Vocês devem conhecer
esta famosa placa de trânsito.
Foi desenhado pelo
designer gráfico John Hood,
veterano de guerra norte-americano nativo,
que trabalha para o Departamento
de Transportes da Califórnia.
Foi encarregado de criar uma placa
para avisar os motoristas
sobre imigrantes abandonados
ao longo da rodovia
que podem tentar atravessar a estrada.
Hood relacionou a situação
deplorável dos imigrantes de hoje
com a dos navajos,
durante a Grande Caminhada.
Essa é realmente uma peça brilhante
de ativismo no design.
Ele foi muito cauteloso
ao pensar no uso de uma menininha
com tranças, por exemplo,
porque achou que os motoristas
poderiam se identificar mais com isso,
e usou a silhueta de Cesar Chavez,
líder dos direitos civis,
para criar a cabeça do pai.
Eu queria me basear
na genialidade dessa placa
para chamar a atenção para o problema
da separação das crianças na fronteira,
e fiz uma mudança muito simples:
virei a família para que pudessem se ver.
Nas últimas semanas,
tive a oportunidade de trazer
de volta essa placa para a rodovia
para contar uma história:
a história das relações
que deveríamos estar melhorando
e um lembrete de que deveríamos
estar projetando estados reunidos
e não estados divididos.
Obrigado.
(Aplausos)