Return to Video

Tecnologia simples e eficaz para unir comunidades em crise

  • 0:01 - 0:04
    Sou uma imigrante da Venezuela
  • 0:04 - 0:08
    e vivo nos EUA há seis anos.
  • 0:08 - 0:11
    Se me questionarem sobre
    a minha vida como expatriada,
  • 0:11 - 0:13
    diria que tenho tido sorte.
  • 0:13 - 0:14
    Mas, não tem sido fácil.
  • 0:15 - 0:18
    Em criança, nunca pensei
    que iria deixar o meu país.
  • 0:19 - 0:23
    Participei pela primeira vez
    numa manifestação estudantil em 2007,
  • 0:23 - 0:27
    quando o Presidente fechou um dos canais
    de notícias mais importantes.
  • 0:27 - 0:30
    Estava a graduar-me em Comunicação
  • 0:30 - 0:35
    e, pela primeira vez, soube que
    a liberdade de expressão não é garantida.
  • 0:36 - 0:39
    Sabíamos que estava a ficar mal,
    mas não esperávamos o que aí vinha:
  • 0:40 - 0:43
    uma crise económica,
    o colapso das infraestruturas,
  • 0:43 - 0:45
    apagões de eletricidade em toda a cidade,
  • 0:45 - 0:49
    o declínio da saúde pública
    e a falta de medicamentos,
  • 0:49 - 0:52
    surtos de doenças e fome.
  • 0:52 - 0:56
    Mudei-me para o Canadá,
    com o meu marido, em 2013
  • 0:56 - 1:00
    e sempre pensámos que voltaríamos
    para casa quando a crise melhorasse.
  • 1:00 - 1:01
    Mas, nunca voltámos.
  • 1:02 - 1:04
    Quase todos os meus amigos de infância
    deixaram o país,
  • 1:04 - 1:07
    mas os meus pais ainda continuam lá.
  • 1:07 - 1:09
    Houve momentos em que
    telefonei à minha mãe
  • 1:09 - 1:13
    e ouvia pessoas aos gritos
    e a chorar, no fundo,
  • 1:14 - 1:17
    enquanto bombas de gás lacrimogéneo
    explodiam nas ruas.
  • 1:17 - 1:21
    A minha mãe, como se eu
    não conseguisse ouvir, dizia sempre:
  • 1:21 - 1:23
    (em espanhol)
    "Não te preocupes, Juanita.
  • 1:23 - 1:25
    "Estamos bem, não te preocupes."
  • 1:26 - 1:27
    Mas, claro que me preocupo.
  • 1:27 - 1:30
    São os meus pais
    e estou a 6500 km de distância.
  • 1:31 - 1:35
    Hoje, sou só mais uma
    dos quatro milhões de venezuelanos
  • 1:35 - 1:37
    que deixaram o seu país.
  • 1:38 - 1:40
    Muitos amigos meus
    são imigrantes venezuelanos,
  • 1:40 - 1:42
    e nos últimos anos,
  • 1:42 - 1:45
    começámos a falar sobre
    como podemos fazer a diferença
  • 1:45 - 1:47
    quando vivemos tão longe.
  • 1:47 - 1:52
    Foi assim que, em 2019,
    nasceu Code for Venezuela.
  • 1:52 - 1:56
    Começou com um "hackathon"
    porque somos especialistas em tecnologia
  • 1:56 - 1:58
    e pensámos que podíamos usar
    as nossas competências
  • 1:58 - 2:01
    para criar soluções
    para as pessoas no terreno.
  • 2:01 - 2:06
    Mas, primeiro, foi necessário encontrar
    especialistas que residissem na Venezuela
  • 2:06 - 2:07
    para nos guiarem.
  • 2:07 - 2:09
    Víamos tantos outros "hackathons"
  • 2:09 - 2:14
    que surgiam com astúcia, ambição
    e soluções tecnológicas incríveis
  • 2:14 - 2:17
    que, em teoria, pareciam ótimas,
    mas que, em última análise, falharam
  • 2:17 - 2:21
    nos países que era suposto ajudar.
  • 2:21 - 2:24
    Muitos de nós vivem no estrangeiro há anos
  • 2:24 - 2:27
    e estamos distanciados
    dos problemas do quotidiano
  • 2:27 - 2:29
    que os venezuelanos enfrentam.
  • 2:29 - 2:33
    Assim, procurámos especialistas
    que vivessem dentro do país.
  • 2:34 - 2:36
    Por exemplo, Julio Castro,
  • 2:36 - 2:40
    um médico e um dos líderes
    dos Médicos por la Salud.
  • 2:41 - 2:46
    Quando o governo deixou de publicar
    dados oficiais sobre a saúde em 2015,
  • 2:46 - 2:50
    o Dr. Julio começou a recolher
    informações sozinho,
  • 2:50 - 2:53
    utilizando um sistema informal
    mas coordenado
  • 2:54 - 2:56
    de comunicações por telefone.
  • 2:56 - 3:00
    Localizam pessoal disponível,
    equipamento médico, dados de mortalidade,
  • 3:00 - 3:02
    surtos de doenças,
  • 3:02 - 3:04
    compilam os dados num relatório,
  • 3:04 - 3:05
    e partilham a informação no Twitter.
  • 3:05 - 3:10
    Ele tornou-se o nosso especialista
    de saúde a quem recorremos na Venezuela.
  • 3:10 - 3:11
    Luis Carlos Díaz,
  • 3:11 - 3:15
    um jornalista amplamente reconhecido
    que relata atos de censura
  • 3:15 - 3:20
    e violações dos direitos humanos
    sofridas pelos venezuelanos,
  • 3:20 - 3:23
    ajuda-nos a perceber
    o que está a acontecer lá,
  • 3:23 - 3:26
    já que as notícias
    são controladas pelo governo.
  • 3:27 - 3:29
    Apelidamos estas pessoas
    de nossos heróis no terreno.
  • 3:30 - 3:33
    Com o seu conselho especializado,
    elaboramos uma série de desafios
  • 3:33 - 3:35
    para os participantes do "hackathon".
  • 3:35 - 3:38
    No primeiro "hackathon"
    tivemos 300 participantes
  • 3:38 - 3:40
    de sete países
  • 3:40 - 3:43
    que apresentaram
    16 projetos diferentes.
  • 3:44 - 3:46
    Selecionámos os projetos
    com maior potencial
  • 3:46 - 3:49
    e continuámos a trabalhar
    neles depois do evento.
  • 3:49 - 3:53
    Hoje, vou partilhar dois
    dos nossos projetos mais bem sucedidos
  • 3:53 - 3:56
    para mostrar-vos o impacto
    que temos tido até agora.
  • 3:57 - 4:00
    São o MediTweet
    e o Blackout Tracker.
  • 4:00 - 4:03
    O MediTweet é um robô inteligente
    no Twitter
  • 4:03 - 4:06
    que ajuda os venezuelanos
    a encontrar o medicamento que precisam.
  • 4:06 - 4:08
    Neste momento na Venezuela
  • 4:08 - 4:10
    quem adoecer e recorrer a um hospital,
  • 4:10 - 4:15
    tem grande possibilidade de não
    obter o medicamento para se tratar.
  • 4:16 - 4:17
    A situação é tão má
  • 4:17 - 4:21
    que os doentes, muitas vezes,
    recebem uma "lista de compras" do médico
  • 4:21 - 4:24
    em vez de uma receita.
  • 4:24 - 4:26
    Eu presenciei esta necessidade
    em primeira mão.
  • 4:27 - 4:31
    A minha mãe foi diagnosticada
    com cancro em 2015.
  • 4:31 - 4:33
    Necessitava de uma punção lombar
  • 4:33 - 4:37
    para receber um diagnóstico final
    e um plano de tratamento.
  • 4:37 - 4:40
    Mas, não havia agulhas
    para esse procedimento.
  • 4:40 - 4:43
    Eu estava na Venezuela, naquela época
  • 4:43 - 4:46
    e presenciava o estado de saúde
    da minha mãe a piorar todos os dias.
  • 4:48 - 4:51
    Depois de procurar em todo o lado
    encontrámos a agulha num "site"
  • 4:51 - 4:54
    semelhante ao eBay na América Latina.
  • 4:54 - 4:56
    Encontrei-me com o vendedor numa padaria,
  • 4:56 - 4:59
    foi como fazer compras no mercado negro.
  • 4:59 - 5:02
    A minha mãe levou a agulha ao médico
    e ele fez o procedimento.
  • 5:02 - 5:06
    Sem aquilo, ela podia ter morrido.
  • 5:06 - 5:08
    Mas não são só os suprimentos médicos,
  • 5:08 - 5:09
    também são os medicamentos.
  • 5:09 - 5:11
    Quando foi diagnosticada
    pela primeira vez,
  • 5:11 - 5:14
    comprámos o medicamento
    numa farmácia estatal,
  • 5:14 - 5:16
    e foi praticamente gratuito.
  • 5:16 - 5:18
    Mas a farmácia estatal
    esgotou o medicamento
  • 5:18 - 5:22
    e ainda faltavam seis meses
    para o tratamento terminar.
  • 5:23 - 5:25
    Seis meses para terminar o tratamento.
  • 5:26 - 5:30
    Comprámos alguns medicamentos "online"
    e o resto no México.
  • 5:30 - 5:32
    Neste momento,
    está no terceiro ano de regressão
  • 5:32 - 5:35
    e sempre que lhe telefono, ela diz-me:
  • 5:35 - 5:37
    "Estou bem, não te preocupes."
  • 5:38 - 5:40
    Mas nem todos podem
    dar-se ao luxo de deixar o país
  • 5:40 - 5:43
    e muitos não têm saúde para viajar.
  • 5:43 - 5:46
    É por isso que as pessoas
    recorrem ao Twitter,
  • 5:46 - 5:50
    para comprar e vender medicamentos
    usando o "hashtag" #ServicioPublico,
  • 5:50 - 5:52
    que quer dizer "serviço público".
  • 5:52 - 5:57
    O nosso "Twitter bot" percorre o Twitter
    à procura do "hashtag" #ServicioPublico
  • 5:57 - 6:01
    e associa os utilizadores
    que procuram medicamentos específicos
  • 6:01 - 6:04
    aos utilizadores que estão a vender
    os excedentes pessoais.
  • 6:04 - 6:08
    Também reunimos dados de localização
    desses utilizadores do Twitter
  • 6:08 - 6:10
    e utilizamo-los numa ferramenta
    de visualização.
  • 6:10 - 6:14
    Fornece às organizações locais,
    como a Médicos por la Salud
  • 6:14 - 6:17
    uma ideia onde estão em falta.
  • 6:17 - 6:20
    Também podemos aplicar
    algoritmos de aprendizagem de máquina
  • 6:20 - 6:23
    para identificar nichos de doenças.
  • 6:23 - 6:25
    Se receberam ajuda humanitária
  • 6:25 - 6:28
    isto pode ajudá-los
    a tomarem decisões melhores
  • 6:28 - 6:30
    sobre a distribuição dos materiais.
  • 6:31 - 6:35
    O nosso segundo projeto,
    é o Blackout Tracker.
  • 6:35 - 6:39
    A Venezuela está atualmente a passar
    por uma crise de eletricidade.
  • 6:39 - 6:43
    No ano passado, a Venezuela sofreu
    o que alguns consideram,
  • 6:43 - 6:47
    os piores cortes de energia
    na história da Venezuela.
  • 6:47 - 6:51
    Fiquei dois longos dias sem poder
    comunicar com os meus pais.
  • 6:51 - 6:54
    Algumas cidades sofrem
    apagões todos os dias.
  • 6:54 - 6:57
    Mas só sabemos disto
    pelas redes sociais.
  • 6:58 - 7:01
    O governo não reporta
    os apagões nas notícias.
  • 7:01 - 7:03
    Quando a energia falha,
  • 7:03 - 7:09
    muitos venezuelanos partilham rapidamente
    a localização com o "hashtag" #SinLuz,
  • 7:09 - 7:11
    que significa "sem eletricidade",
  • 7:11 - 7:14
    antes de os seus telefones
    ficarem sem bateria.
  • 7:14 - 7:17
    Assim, as pessoas no país
    sabem o que está a acontecer.
  • 7:17 - 7:19
    Tal como o MediTweet,
  • 7:19 - 7:23
    o Blackout Tracker percorre o Twitter
    à procura do "hashtag" #SinLuz
  • 7:23 - 7:27
    e cria um mapa recorrendo
    à localização desses utilizadores.
  • 7:27 - 7:29
    Rapidamente, podemos ver
  • 7:29 - 7:31
    onde estão a decorrer apagões hoje
  • 7:31 - 7:35
    e quantos apagões
    decorreram ao longo do tempo.
  • 7:36 - 7:38
    As pessoas querem saber
    o que está a acontecer,
  • 7:38 - 7:40
    e esta é a nossa resposta.
  • 7:40 - 7:43
    Mas é também uma forma
    de responsabilizar o governo.
  • 7:43 - 7:46
    É fácil negarem que os problemas existem
  • 7:46 - 7:48
    ou arranjarem desculpas,
  • 7:48 - 7:50
    porque não existem dados oficiais
    sobre o assunto.
  • 7:50 - 7:54
    O Blackout Tracker mostra quão mau
    o problema realmente é.
  • 7:56 - 7:59
    Algumas pessoas em Silicon Valley
    podem olhar para estes projetos
  • 7:59 - 8:02
    e dizer que não são
    tecnologicamente inovadores.
  • 8:02 - 8:04
    Mas o objetivo é esse.
  • 8:04 - 8:06
    Estes projetos não são
    extremamente avançados,
  • 8:06 - 8:09
    mas são o que as pessoas
    na Venezuela necessitam,
  • 8:09 - 8:11
    e podem ter um impacto enorme.
  • 8:11 - 8:16
    Para além destes projetos,
    a nossa conquista mais significativa
  • 8:16 - 8:18
    talvez tenha sido
    a criação de um movimento,
  • 8:18 - 8:22
    em que as pessoas de todo o mundo
    se juntam para utilizar
  • 8:22 - 8:26
    as suas competências profissionais
    para criar soluções para os venezuelanos.
  • 8:27 - 8:29
    E como fazemos parcerias
    com os nativos,
  • 8:29 - 8:32
    estamos a criar soluções
    que as pessoas querem e precisam.
  • 8:33 - 8:35
    O que é extraordinário nisto
  • 8:35 - 8:37
    é que utilizamos as nossas
    competências profissionais,
  • 8:37 - 8:40
    e assim, resulta fácil e natural.
  • 8:40 - 8:43
    Não nos é difícil marcar a diferença.
  • 8:43 - 8:45
    Se alguém em São Francisco
  • 8:45 - 8:48
    contratasse profissionais
    para criar soluções
  • 8:48 - 8:50
    como o MediTweet ou o Blackout Tracker,
  • 8:50 - 8:52
    isso iria custar uma pequena fortuna.
  • 8:52 - 8:54
    Doando os nossos serviços,
  • 8:54 - 8:58
    estamos a causar um impacto maior
    do que se doássemos apenas dinheiro.
  • 8:59 - 9:00
    E vocês podem fazer o mesmo,
  • 9:00 - 9:02
    não necessariamente na Venezuela,
  • 9:02 - 9:04
    mas, na vossa própria comunidade.
  • 9:04 - 9:07
    Num mundo que está
    mais interligado do que nunca,
  • 9:07 - 9:13
    ainda se veem comunidades especializadas
    a viver isoladas ou em silos.
  • 9:14 - 9:16
    Existem muito boas formas de ajudar,
  • 9:16 - 9:20
    mas acredito que vocês podem usar
    as vossas competências profissionais
  • 9:20 - 9:23
    para unir diversas comunidades
    e criar soluções eficazes
  • 9:23 - 9:25
    através dessas relações.
  • 9:26 - 9:30
    Qualquer pessoa com conhecimentos
    e competências profissionais
  • 9:30 - 9:34
    tem uma força poderosa
    para dar esperança a uma comunidade.
  • 9:34 - 9:37
    Para nós, no Code for Venezuela
  • 9:37 - 9:39
    isto é só o início.
  • 9:39 - 9:40
    Obrigada.
  • 9:40 - 9:43
    (Aplausos)
Title:
Tecnologia simples e eficaz para unir comunidades em crise
Speaker:
Johanna Figueira
Description:

O mundo está mais ligado do que nunca, mas algumas comunidades ainda não dispõem de recursos vitais, como eletricidade e cuidados de saúde. Nesta palestra orientada para a solução, a ativista tecnológica Johanna Figueira apresenta o seu trabalho em Code for Venezuela — uma plataforma que ajuda os venezuelanos a ter acesso a informações vitais e material médico — e partilha as suas ideias sobre como podem ser usadas para ajudar outras comunidades com necessidades.

more » « less
Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
09:56

Portuguese subtitles

Revisions