-
Title:
O quarto de Mary: Uma experiência mental filosófica — Eleanor Nelsen
-
Description:
Vejam a lição completa: http://ed.ted.com/lessons/mary-s-room-a-philosophical-thought-experiment-eleanor-nelsen
Imaginem uma neurocientista chamada Mary que toda a vida só viu as coisas a preto e branco, mas é especialista em visão a cores e sabe tudo sobre a sua física e biologia. Se, um dia, ela vir uma cor, aprenderá alguma coisa de novo? Haverá alguma coisa na perceção da cor que ela não tivesse captado no seu conhecimento? Eleanor Nelsen explica o que esta experiência mental nos pode ensinar sobre a experiência.
Lição de Eleanor Nelsen, animação de Maxime Dupuy.
-
Imaginem uma brilhante
neurocientista chamada Mary.
-
Mary vive num quarto preto e branco,
-
só lê livros a preto e branco,
-
e os ecrãs que têm são só
a preto e branco.
-
Apesar de nunca ter visto cores,
Mary é uma especialista na visão a cores
-
e sabe tudo que já foi descoberto
sobre isso, na Física e na Biologia.
-
Sabe como as diferentes
ondas de comprimento da luz
-
estimulam três tipos
de células cónicas na retina
-
e sabe como os sinais elétricos
-
viajam pelo nervo ótico
até ao cérebro.
-
Aí, criam padrões
de atividade neural
-
que correspondem aos milhões de cores
-
que quase todos
os seres humanos distinguem.
-
Imaginem, agora, que um dia
-
o ecrã a preto e branco de Mary se avaria
-
e aparece uma maçã a cores.
-
Pela primeira vez,
-
ela tem a experiência de uma coisa
que conhece há anos.
-
Será que aprende uma coisa nova?
-
Há alguma coisa na perceção da cor
-
que não tenha sido captado
por todo o seu saber?
-
O filósofo Frank Jackson
propôs esta experiência mental,
-
chamada "o quarto de Mary",
em 1982.
-
Defendeu que, se Mary
já sabia todos os factos físicos
-
sobre a visão a cores,
-
e ter a experiência da cor
ainda lhe ensina qualquer coisa de novo,
-
então, os estados mentais,
tal como a perceção da cor,
-
não podem ser totalmente descritos
por factos físicos.
-
A experiência mental de "o quarto de Mary"
-
descreve aquilo a que os filósofos chamam
o "argumento do conhecimento",
-
em que há propriedades não físicas
e conhecimentos
-
que só podem ser descobertos
através duma experiência consciente.
-
O argumento do conhecimento
contradiz a teoria do fisicalismo
-
que diz que tudo,
incluindo os estados mentais,
-
tem uma explicação física.
-
A maioria das pessoas
que ouve a história de Mary
-
pensa intuitivamente
que é óbvio que ver as cores
-
será completamente diferente
de saber tudo sobre elas.
-
Portanto, deve haver
qualquer qualidade na visão a cores
-
que transcende a sua descrição física.
-
O argumento do conhecimento
não trata apenas da visão das cores.
-
"O quarto de Mary" usa a visão das cores
-
para representar
uma experiência consciente.
-
Se a Física não consegue
explicar totalmente a visão das cores.
-
então talvez também não consiga explicar
totalmente outras experiências conscientes.
-
Por exemplo, podemos conhecer
todos os pormenores físicos
-
da estrutura e função
do cérebro de uma pessoa,
-
mas, mesmo assim, não compreender
o que é ser essa pessoa.
-
Estas experiências indescritíveis
têm propriedades chamadas "qualia",
-
qualidades subjetivas que não podemos
descrever ou medir com rigor.
-
As "qualia" são únicas para a pessoa
que as experimenta,
-
como ter comichão,
-
estar apaixonado,
-
ou sentir-se aborrecido.
-
Os factos físicos não podem explicar
totalmente estados mentais como estes.
-
Os filósofos interessados
em inteligência artificial,
-
têm usado o argumento do conhecimento
-
para teorizar que a recriação
de um estado físico
-
não recriará necessariamente
um estado mental correspondente.
-
Por outras palavras,
-
construir um computador que imite
a função de cada um dos neurónios
-
do cérebro humano
-
não criará necessariamente
um cérebro artificial consciente.
-
Nem todos os filósofos concordam
-
que a experiência
de "o quarto de Mary" seja útil.
-
Uns defendem que o extenso conhecimento
que ela tem da visão a cores
-
ter-lhe-á permitido criar
o mesmo estado mental
-
produzido por uma real visão a cores.
-
O ecrã avariado não lhe terá
mostrado nada de novo.
-
Outros dizem que, para começar,
o conhecimento dela nunca foi completo
-
porque se baseava apenas
nos factos físicos
-
que podem ser transmitidos por palavras,
-
Anos depois desta sua proposta,
-
Jackson inverteu a sua posição
sobre esta experiência mental.
-
Concluiu que, mesmo a experiência
de Mary ao ver o vermelho
-
corresponde a um acontecimento
físico mensurável, no cérebro,
-
e não a "qualia" desconhecidas
para além de uma explicação física.
-
Mas continua a não haver
uma resposta definitiva
-
à pergunta de se Mary teria aprendido
alguma coisa de novo
-
quando viu a maçã.
-
Será que há limites fundamentais
para aquilo que conhecemos
-
sobre uma coisa que nunca experimentámos?
-
E isso significará que há
certos aspetos do universo
-
que ficarão permanentemente
para além da nossa compreensão?
-
Ou a ciência e a filosofia permitir-nos-ão
-
ultrapassar as limitações
do nosso espírito?