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Como fui ridícula quando cheguei a África | Carmen Alonso | TEDxGijon

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    Boas tardes.
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    Nesta minha palestra
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    pretendo romper
    um pouco com os esquemas
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    ou, pelo menos, que vos apercebam
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    que, por vezes, os esquemas
    que temos não servem de muito.
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    Como já foi dito, vou falar
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    do tempo que passei em África.
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    Fui lá há uns anos
    para trabalhar num orfanato.
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    Antes de ir, como toda a gente,
    tinha umas ideias sobre África,
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    Pensem por instantes
    o que vos vem à cabeça
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    quando pensam em África.
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    Pode ser qualquer coisa como isto.
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    Talvez. É uma imagem rural, não é?
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    É uma coisa típica.
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    Mas, quando cheguei a África, a Angola,
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    o que encontrei foi isto.
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    Isto é Luanda, a Luanda de hoje,
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    Luanda é uma cidade enorme,
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    é uma das maiores do mundo
    e das mais caras do mundo.
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    Neste posto, compete com Tóquio,
    vão alternando,
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    É uma cidade que está
    a crescer muito.
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    Para começar a minha palestra,
    quero apresentar-vos Angola,
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    para sabermos de que país
    estamos a falar,
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    que classe de país é
    e mais algumas coisas.
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    Como veem neste mapa,
    Angola situa-se no sul de África.
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    É um país muito grande
    e é rico em recursos naturais.
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    Até 1975 foi uma colónia de Portugal,
    por isso, aqui fala-se português.
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    Nesse ano, começou uma guerra civil
    — quando se descolonizou —
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    que durou até 2002.
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    Fazendo as contas,
    foram 27 anos de guerra,
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    a maior guerra civil de África.
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    Esta guerra enfrentou
    várias fações locais
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    que lutaram pelo poder
    depois da descolonização.
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    Mas, além disso, foi mais um
    dos cenários da guerra fria,
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    onde estavam também envolvidas
    as grandes potências.
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    Em Angola, ainda podemos encontrar
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    muitos restos da herança cubana
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    dos soldados que lutaram
    muitos anos em Angola.
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    Ainda têm muitos laços culturais.
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    Em 2002, esta guerra acabou
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    e já há mais de 10 anos vivem em paz.
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    Estes 10 anos têm sido
    anos de crescimento
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    — fundamentalmente
    baseado no petróleo,
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    nos investimentos
    estrangeiros — e de desenvolvimento,
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    embora este desenvolvimento
    não tenha atingido o grosso da população
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    que ainda está a viver
    em condições de muita carência.
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    Fundamentalmente, talvez pela corrupção,
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    pela concentração do poder político,
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    essas coisas que se passam.
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    Mesmo assim, os angolanos
    veem o futuro de Angola
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    com muito otimismo.
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    De facto, quando lá estive,
    para mim foi um alívio
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    porque, em Espanha,
    já estávamos em plena crise
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    e foram uns meses
    em que não ouvi falar da crise.
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    Aquilo não tinha nada a ver
    com o que se passava em Angola.
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    Eles sentiam-se de outro modo,
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    viam o futuro com muito otimismo.
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    Voltando ao que ali vivi,
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    fui com umas ideias na cabeça
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    que ia encontrar muitas perguntas.
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    Muita gente me tinha dito:
    "Vai ser um grande choque
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    "ires para um sítio tão diferente,
    é quase o oposto.
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    "Aqui é a Europa e África
    está do outro lado".
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    Realmente, é um pouco assim.
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    Uma das ideias que eu levava
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    era esta, a do deserto, da seca.
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    Sabemos que, em África,
    há pouca água, é o que nos dizem.
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    E está certo, talvez esteja certo
    em muitas zonas de África.
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    Quando cheguei a Angola,
    ia muito convencida
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    de que em Angola havia pouca água
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    e, além disso, era preciso
    poupar a água,
  • 3:46 - 3:48
    não podíamos viver como aqui.
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    Assim, durante os primeiros dias,
    estive a poupar a água
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    até que me apercebi
    de que era a única pateta
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    que só tomava banho uma vez por dia
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    porque, claro, em Angola faz muito calor.
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    Não é em vão o que dizia
    Richard Kapuściński.
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    Richard Kapuściński é um jornalista polaco
    que viajou muito por África
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    e escreveu um livro, "Ébano",
    muito bonito.
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    "Ébano" começa por dizer
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    que o que mais chama
    a atenção dos ocidentais
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    quando chegamos a África,
    é a luz e o calor.
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    Outra ideia que eu tinha
    antes de chegar a África
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    era esta, a imagem da fome.
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    Esta imagem da criança de barriga inchada
    com as moscas à volta.
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    O que vi em Angola foi
    que, mais do que a fome,
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    havia muito má nutrição,
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    não porque não houvesse comida,
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    mas porque a comida era muito cara.
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    Por exemplo, nos mercados locais,
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    o tomate é mais caro
    do que custa na Europa.
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    O leite, um pacote de leite,
    que é um produto básico aqui,
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    lá é um produto de luxo,
    e as pessoas consomem leite em pó.
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    Podia continuar a falar
    das muitas carências de África
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    ou dos problemas que há
    concretamente em Angola,
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    de habitação, de saúde,
    de doenças tropicais,
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    e de todas essas coisas que já sabemos.
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    Mas o que me chamou a atenção
    quando estive em Angola,
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    foi outra coisa muito diferente.
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    Não é porque seja uma coisa
    lógica, se pensarmos nisso,
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    nem porque tenha sentido,
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    mas porque eu nunca tinha pensado assim.
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    Quando cheguei a Angola,
    encontrei gente
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    que estava a fazer a sua vida
    com as circunstâncias que têm
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    mas sem drama.
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    Ou seja, não passavam a vida
    a pensar na fome
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    ou no mal que comiam,
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    ou como eram as suas casas
    em comparação com as nossas.
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    Tal como nós passamos a vida
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    a comparar-nos com milionários,
    por exemplo,
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    e lamentamo-nos por não viver como eles
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    ou por não fazer o que eles fazem.
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    Eles também não faziam isso.
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    Não pensavam como eram
    as cidades europeias.
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    De certo modo,
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    tal como nós vivemos a nossa vida
    com as nossas circunstâncias,
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    eles faziam o mesmo.
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    Para mim, foi muito reveladora
    nesse sentido,
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    uma historieta que me aconteceu
    ali, nos primeiros dias.
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    Pouco depois de chegar
    fui a uma missa local.
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    As missas em África são muito bonitas
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    porque têm muitos rituais locais,
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    são muito alegres, têm muita música.
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    Nessa missa, quando estive em Angola,
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    que ocorreu em 2011,
    coincidiu com o terramoto no Japão
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    que provocou o acidente nuclear
    da central de Fukushima.
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    Naquela missa, o peditório
    que se realizou
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    era destinado aos prejudicados
    pelo terramoto do Japão.
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    Eu fiquei impressionada,
    aquilo não fazia sentido.
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    No fim de contas, o Japão
    é um dos países mais ricos do mundo,
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    está entre os cinco ou seis países
    mais ricos do mundo,
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    enquanto Angola está em 80.º lugar.
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    Não fazia sentido.
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    Mas ali ninguém pensava nisso,
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    ou seja, tinha havido um desastre
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    e era preciso colaborar,
    era preciso contribuir.
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    Os angolanos não se sentiam
    os pobres do mundo
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    em relação aos que era preciso ajudar.
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    Estas raparigas são duas raparigas
    do orfanato onde eu estava.
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    Podíamos pensar que o orfanato
    era um sítio triste.
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    Mas, na realidade, parecia
    um pequeno acampamento de verão.
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    Era um montão de raparigas
    que viviam ali, brincavam,
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    viviam aquilo de uma forma normal.
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    Há duas semanas, estive em Itália,
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    fui lá ver quatro raparigas
    daquele orfanato
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    que tinham obtido uma bolsa
    para estudarem em Itália.
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    Estavam contentes, estudavam muito,
    aprendiam italiano e trabalhavam.
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    Mas tinham-lhes sucedido duas coisas
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    que as tinham chocado muito.
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    A primeira foi que, quando chegaram,
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    muitos homens viam as quatro raparigas,
    jovens, negras, africanas
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    e pensavam que elas eram prostitutas.
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    Seguiam-nas, às vezes, de automóvel
    e perguntavam-lhes quanto cobravam.
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    A segunda coisa que lhes aconteceu
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    foi que muitas mulheres
    daquele bairro onde viviam,
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    numa cidade pequena do sul de Itália,
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    nos primeiros dias,
    davam-lhes muita roupa velha
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    e coisas que tinham em casa
    e julgavam que elas podiam precisar.
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    Tanto uns como as outras,
    com melhores ou piores intenções,
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    eram incapazes de separar essas imagens
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    que tinham de mulheres negras, africanas,
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    dessas raparigas que eram estudantes,
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    mas não eram capazes de ver isso.
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    Isso fez com que eu me apercebesse
    de que, muitas vezes, esses preconceitos,
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    essas ideias que temos,
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    não só afetam realmente
    a forma como entendemos a realidade,
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    mas como interpretamos o contexto,
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    o ridículo que podemos ser,
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    e que afeta muito a forma
    como nos comportamos com os outros,
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    a forma como os tratamos;
    até sermos injustos com eles.
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    Romper um pouco
    com os nossos próprios esquemas
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    consiste em que,
    quando vemos outra pessoa,
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    nos apercebamos de que ela é uma pessoa
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    muito mais parecida connosco
    do que cremos.
  • 8:49 - 8:50
    Muito obrigada.
  • 8:50 - 8:53
    (Aplausos)
Title:
Como fui ridícula quando cheguei a África | Carmen Alonso | TEDxGijon
Description:

Carmen fala da necessidade de romper com os esquemas, os preconceitos, e de aprender que todos os que nos rodeiam são muito mais parecidos connosco, apesar da cor da pele ou do país de origem.

Esta palestra foi feita num evento TEDx usando o formato de palestras TED, mas organizado independentemente por uma comunidade local. Saiba mais em http://ted.com/tedx

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Video Language:
Spanish
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
09:10

Portuguese subtitles

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