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Title:
As oportunidades escondidas da economia informal
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Description:
Niti Bhan estuda estratégia empresarial para os mercados informais africanos: as pequenas lojas e postos de venda, os talentosos artesãos e trabalhadores que são o motor invisível da economia do continente. É fácil classificar estes trabalhadores como fugindo ao fisco, e até mesmo como criminosos, mas Niti defende que este segmento da economia em expansão é legítimo e digno de investimento. Se apostarmos no setor, ela acredita que poderemos criar milhares de empregos. Segundo Bhan "Estas são as sementes férteis de empresas". "Podemos começar por reconhecer as capacidades e profissões destas pessoas?"
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Speaker:
Niti Bhan
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Os mercados informais de África
são considerados, segundo o estereótipo,
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caóticos e desorganizados.
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A desvantagem da palavra "informal"
é a associação automática que temos
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— que é muito negativa
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e que já teve consequências significativas
e perdas económicas —
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de acrescentar ou subtrair facilmente
40 a 60% à margem de lucro,
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nos mercados informais.
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Para traçar o percurso do ecossistema
do comércio informal,
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fizemos uma análise exaustiva
dos relatórios e estudos
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do comércio transfronteiriço
na África Oriental dos últimos 20 anos.
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Serviu para nos prepararmos
para o trabalho de campo
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para perceber os entraves
ao comércio informal neste setor informal.
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Descobrimos que, nos últimos 20 anos,
ninguém fez a distinção entre ilícito
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— ou seja, o tráfico ou o contrabando
no setor informal —
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e legal, mas não declarado,
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como é o caso do tomate,
das laranjas e de outros frutos.
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Esta criminalização,
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— a que em suaíli chamamos "biashara",
que é a venda ou o comércio,
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ao contrário de "magendo"
que é tráfico ou contrabando —
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esta criminalização do setor informal,
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— que, em inglês, não distingue
entre estes aspetos —
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pode custar à economia africana
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entre 60 a 80%
do crescimento anual do PIB,
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por causa da nossa incapacidade
de reconhecer o motor dessas economias.
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A criação de emprego no setor informal
é quatro vezes superior
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à da economia formal tradicional,
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ou economia "moderna",
como é conhecida.
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Oferece emprego e oportunidades
para gerar receitas
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aos "sem-qualificações"
para as profissões convencionais.
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Mas vocês conseguem fazer
uma fritadeira de um carro velho?
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É isto, senhoras e senhores,
que falta legitimar urgentemente.
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Enquanto continuarmos a achar
que isto é um crime,
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que é clandestino,
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que é ilegal,
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não haverá uma tentativa de integração
do ecossistema económico informal,
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nem no ecossistema formal nem no global.
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Vou-vos contar a história da Teresia,
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uma comerciante que contrariou
todas as nossas suposições
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e nos fez questionar todos os estereótipos
dos estudos dos últimos 20 anos.
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A Teresia vende roupas
debaixo de uma árvore,
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numa cidade chamada Malaba,
na fronteira do Uganda com o Quénia.
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Parece simples, não parece?
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Pendurar as roupas novas nos ramos,
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estender a lona, instalar-se,
esperar pelos clientes
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e é tudo.
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Ela era exatamente o que esperávamos
com base nos estudos e na investigação,
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incluindo viver do comércio
e criar os filhos sozinha.
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Então, o que é que contrariou
as nossas suposições?
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O que é que nos surpreendeu?
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Primeiro, a Teresia pagava uma renda
à autoridade local, todos os dias,
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pelo privilégio de ter a sua venda
debaixo da árvore.
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É assim há sete anos
e passam-lhe recibos.
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Ela tem registos.
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Não se trata de uma comerciante africana
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marginalizada, desfavorecida,
vulnerável, na berma da estrada.
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Trata-se de alguém que tem
registos de vendas há anos.
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Ela dispõe de um ecossistema
de comércio a retalho
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com origem no Uganda
para criar o seu "stock",
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uma pessoa que tem carrinhos de mão
para transportar a mercadoria,
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e um agente bancário que vem recolher
o dinheiro, ao fim do dia.
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Sabem quanto é que a Teresia
gasta, em média,
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por mês em compras,
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em stocks de roupas novas
que recebe de Nairobi?
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1500 dólares americanos.
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Isto é um investimento de cerca
de 20 000 dólares em bens e serviços
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todos os anos.
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É esta a Teresia,
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a mulher invisível,
a intermediária escondida.
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E ela faz parte apenas da primeira linha
de pequenos empresários,
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de microempresas que podemos
encontrar nestes mercados locais.
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Pelo menos,
na região fronteiriça de Malaba,
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ela encontra-se na primeira linha.
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As pessoas mais acima
na cadeia do comércio
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têm pelo menos
três linhas de negócio,
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investindo 2500 a 3000 dólares por mês.
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Então, afinal o problema
não era a criminalização.
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Não se pode criminalizar alguém
a quem passamos recibos.
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É a falta de reconhecimento
das suas ocupações.
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Os sistemas e a estrutura bancária
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não têm meios para os reconhecer
como microempresas,
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além de que as árvores
não têm endereço postal.
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Por isso, ela não tem saída.
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É ignorada pelas nossas suposições.
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Conhecem os micro-empréstimos
para ajudar comerciantes africanas?
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São empréstimos de 50 ou 100 dólares.
O que é que ela pode fazer com isso?
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Ela gasta 10 vezes isso por mês,
só em compras,
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sem contar com os serviços extra
ou o ecossistema de apoio.
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Estas pessoas não encaixam
nem no estereótipo político
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dos não qualificados
e dos marginalizados,
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nem nos trabalhadores
administrativos com salários
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ou nos funcionários públicos com reforma,
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que supostamente compõem
a classe média.
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Em vez disso, o que temos aqui
são as proto-PMEs,
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as sementes férteis
do comércio e das empresas
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que são o motor da economia
e que põem a comida na mesa.
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Mesmo aqui neste hotel,
as pessoas invisíveis
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— os talhantes, os padeiros
os fabricantes de castiçais —
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fazem as máquinas
que fritam as batatas,
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fazem as vossas camas.
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São estas as empresárias invisíveis
do comércio fronteiriço
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todas à berma da estrada
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e por isso invisíveis aos que fazem
a recolha de dados.
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Estão no meio da confusão
do vasto setor informal
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que não distingue entre os contrabandistas
e os que fogem ao fisco
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e os que fazem outro tipo
de comércio ilegal,
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e as senhoras que são comerciantes
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e que põem a comida na mesa
e mandam os filhos para a universidade.
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Este é o apelo que eu faço aqui.
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Isto é o que todos devemos fazer.
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Podemos começar pelo reconhecimento
de capacidades, de ocupações?
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Podemos transformar a economia informal
começando por esse reconhecimento
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e depois criar as medidas
específicas necessárias
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para a sua integração na economia formal,
global e em todo o sistema.
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Obrigada, senhoras e senhores.
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(Aplausos)