Para detectar doenças mais cedo, vamos falar a língua secreta das bactérias
-
0:02 - 0:04Vocês não as conhecem.
-
0:04 - 0:05Vocês não as veem.
-
0:06 - 0:09Mas elas estão sempre por perto,
-
0:09 - 0:11sussurrando,
-
0:11 - 0:13fazendo planos secretos,
-
0:14 - 0:18criando exércitos com milhões de soldados.
-
0:19 - 0:21Quando decidem atacar,
-
0:21 - 0:24todas elas atacam todas ao mesmo tempo.
-
0:27 - 0:29Estou falando das bactérias.
-
0:29 - 0:30(Risos)
-
0:30 - 0:33De quem achavam que eu estava falando?
-
0:34 - 0:38As bactérias vivem em comunidades,
assim como os seres humanos. -
0:38 - 0:39Elas têm famílias,
-
0:39 - 0:40conversam,
-
0:40 - 0:42e planejam suas atividades.
-
0:42 - 0:43Assim como os seres humanos,
-
0:43 - 0:47elas enganam, iludem e algumas
até enganam umas às outras. -
0:48 - 0:52E se eu disser a vocês que podemos
escutar as conversas entre bactérias -
0:52 - 0:56e traduzir esses informações
confidenciais na língua humana? -
0:56 - 1:01E se eu disser a vocês que traduzir
essas conversas pode salvar vidas? -
1:03 - 1:04Tenho doutorado em nanofísica
-
1:04 - 1:06e tenho usado a nanotecnologia
-
1:06 - 1:09para desenvolver uma ferramenta
de tradução em tempo real -
1:09 - 1:11que pode espionar
as comunidades de bactérias -
1:11 - 1:14e nos fornecer registros
do que elas estão tramando. -
1:16 - 1:18As bactérias vivem em toda a parte.
-
1:18 - 1:21Estão no solo, nos móveis
e dentro de nosso corpo. -
1:22 - 1:27De fato, 90% de todas as células vivas
neste teatro são bacterianas. -
1:28 - 1:30Algumas bactérias nos fazem bem;
-
1:30 - 1:33nos ajudam a digerir os alimentos
ou produzem antibióticos. -
1:33 - 1:35E outras nos causam mal;
-
1:35 - 1:37provocam doenças e morte.
-
1:38 - 1:40Para coordenar todas
as funções das bactérias, -
1:40 - 1:42elas têm que saber se organizar
-
1:42 - 1:44e fazer isso assim como nós,
seres humanos, -
1:44 - 1:46por meio da comunicação.
-
1:47 - 1:48Mas, em vez de palavras,
-
1:48 - 1:51elas usam moléculas sinalizadoras
para se comunicarem entre si. -
1:52 - 1:54Quando as bactérias são poucas,
-
1:54 - 1:56as moléculas sinalizadoras se dispersam,
-
1:56 - 1:59como os gritos de um homem
sozinho no deserto. -
2:00 - 2:04Mas, quando há muitas bactérias,
as moléculas sinalizadoras se acumulam, -
2:04 - 2:07e as bactérias começam a sentir
que não estão sozinhas. -
2:07 - 2:09Elas escutam umas às outras.
-
2:09 - 2:12Desse modo, sabem quantas são
-
2:12 - 2:15e quando estão em número suficiente
para iniciar uma nova ação. -
2:17 - 2:20Quando as moléculas sinalizadoras
atingem um certo limite, -
2:20 - 2:25todas as bactérias sentem imediatamente
que precisam agir da mesma forma. -
2:26 - 2:30A conversa entre bactérias consiste
em uma iniciativa e uma reação, -
2:30 - 2:34a produção de uma molécula
e a reação a ela. -
2:35 - 2:39Em minha pesquisa, eu me concentrei
em espionar as comunidades de bactérias -
2:39 - 2:40dentro do corpo humano.
-
2:40 - 2:42Como isso funciona?
-
2:42 - 2:44Temos uma amostra de um paciente,
-
2:44 - 2:47que pode ser de sangue ou cuspe.
-
2:47 - 2:50Disparamos elétrons na amostra,
-
2:50 - 2:54que vão interagir com quaisquer
moléculas de comunicação presentes. -
2:54 - 2:58Essa interação vai nos dar informações
sobre a identidade das bactérias, -
2:58 - 3:00o tipo de comunicação
-
3:00 - 3:02e quanto as bactérias estão conversando.
-
3:04 - 3:07Mas como as bactérias se comunicam?
-
3:08 - 3:12Antes de eu desenvolver
a ferramenta de tradução, -
3:12 - 3:15eu supunha inicialmente que as bactérias
tinham uma língua primitiva, -
3:15 - 3:19como os bebês, que ainda
não desenvolveram palavras e frases. -
3:19 - 3:22Quando riem, estão felizes;
quando choram, estão tristes. -
3:22 - 3:23Simples assim.
-
3:24 - 3:28Mas acontece que as bactérias
não são nada primitivas como eu pensava. -
3:29 - 3:31Uma molécula não é apenas uma molécula.
-
3:31 - 3:34Pode significar várias coisas,
dependendo do contexto, -
3:34 - 3:37assim como o choro dos bebês
pode significar coisas diferentes: -
3:37 - 3:39às vezes, o bebê está com fome,
-
3:39 - 3:40algumas vezes está molhado,
-
3:40 - 3:42outras vezes está machucado ou com medo.
-
3:42 - 3:45Os pais sabem interpretar esses choros.
-
3:46 - 3:48Para ser uma ferramenta de tradução real,
-
3:48 - 3:51tinha que saber interpretar
as moléculas sinalizadoras -
3:51 - 3:55e traduzi-las dependendo do contexto.
-
3:55 - 3:57E quem sabe?
-
3:57 - 3:59Talvez o Google Tradutor
adote isso em breve. -
3:59 - 4:00(Risos)
-
4:02 - 4:04Vou dar a vocês um exemplo.
-
4:04 - 4:06Trouxe alguns dados de bactérias,
-
4:06 - 4:09que podem ser difíceis de entender
se vocês forem leigos, -
4:09 - 4:11mas tentem observar.
-
4:11 - 4:13(Risos)
-
4:15 - 4:19Aqui está uma família bacteriana feliz
que infectou um paciente. -
4:20 - 4:23Vamos chamá-la de família Montéquio.
-
4:24 - 4:27Ela compartilha recursos,
se reproduz e cresce. -
4:28 - 4:30Um dia, ela ganha um vizinho novo:
-
4:33 - 4:35a família bacteriana Capuleto.
-
4:35 - 4:36(Risos)
-
4:36 - 4:39Tudo vai bem desde que trabalhem juntas.
-
4:40 - 4:44Mas, então, acontece algo inesperado.
-
4:44 - 4:49Romeu, dos Montéquios, se relaciona
com Julieta, dos Capuletos. -
4:49 - 4:50(Risos)
-
4:51 - 4:54E, sim, eles trocam material genético.
-
4:54 - 4:56(Risos)
-
4:59 - 5:01Essa transferência genética
pode ser perigosa aos Montéquios -
5:01 - 5:05que têm a ambição de ser a única família
no paciente que infectaram -
5:05 - 5:07e o compartilhamento de genes
-
5:07 - 5:10contribui para que os Capuletos
desenvolvam resistência a antibióticos. -
5:13 - 5:16Os Montéquios começam a conversar
para se livrarem dessa outra família, -
5:16 - 5:18por meio da liberação dessa molécula.
-
5:18 - 5:19(Risos)
-
5:21 - 5:22E com legendas:
-
5:22 - 5:24[Vamos coordenar um ataque.]
-
5:24 - 5:26(Risos)
-
5:26 - 5:28Vamos coordenar um ataque.
-
5:29 - 5:33Então, todos reagem imediatamente
-
5:33 - 5:37liberando um veneno
que vai matar a outra família. -
5:38 - 5:40[Eliminar!]
-
5:40 - 5:42(Risos)
-
5:43 - 5:48Os Capuletos reagem
ordenando um contra-ataque. -
5:48 - 5:49[Contra-atacar!]
-
5:49 - 5:51Eles travam uma batalha.
-
5:52 - 5:57Este é um vídeo sobre bactérias reais
duelando com organelas do tipo espada, -
5:57 - 5:58em que tentam matar umas às outras
-
5:58 - 6:01literalmente se apunhalando
e rompendo umas às outras. -
6:03 - 6:07A família que ganhar essa batalha
torna-se na bactéria dominante. -
6:08 - 6:12Consigo detectar conversas entre bactérias
-
6:12 - 6:14que levam a diferentes
comportamentos coletivos -
6:14 - 6:15como a luta que acabaram de ver.
-
6:16 - 6:19Meu trabalho era espionar
as comunidades de bactérias -
6:19 - 6:21dentro do corpo humano
-
6:21 - 6:22em pacientes de um hospital.
-
6:23 - 6:25Acompanhei 62 pacientes em um experimento,
-
6:25 - 6:29em que testei as amostras deles
para uma infecção específica, -
6:29 - 6:32sem saber os resultados
do teste de diagnóstico tradicional. -
6:33 - 6:37Em diagnósticos bacterianos,
-
6:37 - 6:39uma amostra esfregaço
é colocada numa placa. -
6:39 - 6:42Se as bactérias crescem
dentro de cinco dias, -
6:42 - 6:44o paciente é diagnóstico como infectado.
-
6:46 - 6:49Quando concluí o estudo
e comparei os resultados da ferramenta -
6:49 - 6:53com o teste de diagnóstico tradicional
e o teste de validação, fiquei chocada. -
6:53 - 6:57Era muito mais supreendente
do que eu havia previsto. -
6:58 - 7:00Mas, antes de dizer
o que a ferramenta revelou, -
7:00 - 7:03eu gostaria de falar de uma paciente
específica que acompanhei, -
7:03 - 7:04uma moça.
-
7:05 - 7:06Ela tinha fibrose cística,
-
7:06 - 7:10uma doença genética que torna os pulmões
suscetíveis a infecções bacterianas. -
7:11 - 7:13Essa moça não fazia parte
do ensaio clínico. -
7:13 - 7:16Eu a acompanhei porque sabia,
por seu prontuário médico, -
7:16 - 7:18que ela nunca tinha tido
uma infecção antes. -
7:19 - 7:22Uma vez por mês, essa moça ia ao hospital
-
7:22 - 7:25para coletar uma amostra de expectoração
que cuspia em um copo. -
7:25 - 7:28Essa amostra era transferida
para análise bacteriana -
7:28 - 7:30no laboratório central
-
7:30 - 7:34para que os médicos pudessem agir
rapidamente se descobrissem uma infecção. -
7:34 - 7:37Isso me permitiu testar meu aparelho
também nas amostras dela. -
7:37 - 7:41Nos dois primeiros meses em que medi
essas amostras, não havia nada, -
7:42 - 7:43mas, no terceiro mês,
-
7:43 - 7:46descobri uma conversa
entre bactérias na amostra dela. -
7:46 - 7:50As bactérias estavam se coordenando
para danificar o tecido dos pulmões. -
7:51 - 7:55Mas o diagnóstico tradicional mostrava
que não havia nenhuma bactéria. -
7:56 - 7:58Voltei a avaliar no mês seguinte.
-
7:58 - 8:02Pude ver que as conversas entre bactérias
se tornaram ainda mais agressivas. -
8:02 - 8:05No entanto, o diagnóstico tradicional
não mostrava nada. -
8:06 - 8:08Meu estudo terminou,
-
8:08 - 8:10mas, meio ano depois,
verifiquei o estado dela, -
8:10 - 8:13para ver se as bactérias
que só eu havia descoberto -
8:13 - 8:15haviam desaparecido
sem intervenção médica. -
8:16 - 8:17Não haviam.
-
8:18 - 8:21Mas a moça já havia sido diagnosticada
com uma infecção grave -
8:21 - 8:22por bactérias mortais.
-
8:23 - 8:26Eram as mesmas bactérias
-
8:26 - 8:28que minha ferramenta
havia descoberto antes. -
8:29 - 8:31Apesar do tratamento agressivo
com antibióticos, -
8:31 - 8:34foi impossível erradicar a infecção.
-
8:35 - 8:39Os médicos estimaram
que ela não passaria dos 20 anos. -
8:40 - 8:43Quando avaliei as amostras daquela moça,
-
8:43 - 8:45minha ferramenta
ainda estava na fase inicial. -
8:45 - 8:47Eu nem sequer sabia
se meu método funcionava mesmo. -
8:47 - 8:49Então, eu tinha um acordo com os médicos
-
8:50 - 8:52para não dizer o que
minha ferramenta revelava -
8:52 - 8:54a fim de não comprometer
o tratamento deles. -
8:54 - 8:57Quando vi os resultados
que nem mesmo estavam validados, -
8:57 - 8:58não ousei falar,
-
8:58 - 9:01porque o tratamento de um paciente
sem uma infecção real -
9:01 - 9:04também tem consequências
negativas para ele. -
9:05 - 9:07Mas agora sabemos mais a respeito,
-
9:07 - 9:11e há muitos rapazes e moças
que ainda podem ser salvos, -
9:11 - 9:15porque, infelizmente, esse cenário
ocorre com muita frequência. -
9:15 - 9:16Os pacientes são infectados,
-
9:16 - 9:19as bactérias não aparecem
nos testes de diagnóstico tradicionais -
9:20 - 9:24e, de repente, a infecção começa
no paciente com sintomas graves. -
9:24 - 9:26Nesse momento, já é tarde demais.
-
9:27 - 9:31O resultado surpreendente
dos 62 pacientes que acompanhei -
9:31 - 9:33foi que meu aparelho captou
as conversas entre bactérias -
9:33 - 9:36em mais da metade
das amostras dos pacientes -
9:36 - 9:39que foram diagnosticados como negativos
pelos métodos tradicionais. -
9:40 - 9:43Em outras palavras, mais da metade
desses pacientes iam para casa -
9:43 - 9:45achando que estavam livres da infecção,
-
9:45 - 9:48embora, na verdade, fossem
portadores de bactérias perigosas. -
9:49 - 9:52Dentro desses pacientes
diagnosticados incorretamente, -
9:52 - 9:55as bactérias estavam coordenando
um ataque sincronizado. -
9:56 - 9:57Sussuravam entre si.
-
9:58 - 10:00Chamo de "bactérias sussurrantes"
-
10:00 - 10:03aquelas que os métodos tradicionais
não conseguem diagnosticar. -
10:03 - 10:06Até o momento, é apenas
a ferramenta de tradução -
10:06 - 10:08que consegue captar esses sussurros.
-
10:08 - 10:12Creio que o período em que as bactérias
ainda estão sussurrando -
10:12 - 10:15é uma janela de oportunidades
para um tratamento direcionado. -
10:16 - 10:19Se a moça tivesse sido tratada
durante essa janela, -
10:19 - 10:21teria sido possível matar as bactérias
-
10:21 - 10:25na fase inicial, antes de a infecção
ficar fora de controle. -
10:27 - 10:31Minha experiência com essa moça
me fez decidir fazer tudo o que posso -
10:31 - 10:33para introduzir
essa tecnologia no hospital. -
10:34 - 10:38Estou trabalhando com os médicos
na implementação da ferramenta em clínicas -
10:38 - 10:41para diagnosticar infecções precoces.
-
10:41 - 10:45Embora ainda não se saiba
como os médicos devem tratar os pacientes -
10:45 - 10:46durante a fase dos sussurros,
-
10:46 - 10:50essa ferramenta pode ajudar os médicos
a observar de perto os pacientes em risco. -
10:51 - 10:54Pode ajudá-los a confirmar
se um tratamento funcionou ou não, -
10:54 - 10:57e pode ajudar a responder
a perguntas simples: -
10:57 - 10:59"O paciente está infectado?
-
10:59 - 11:01O que as bactérias estão tramando?"
-
11:01 - 11:03As bactérias conversam,
-
11:03 - 11:05fazem planos secretos
-
11:05 - 11:08e trocam informações
confidenciais entre si. -
11:08 - 11:11Mas não só conseguimos
pegá-las sussurrando, -
11:11 - 11:14como também podemos aprender
a língua secreta delas -
11:14 - 11:17e nos tornarmos sussurradores bacterianos.
-
11:17 - 11:19E, como as bactérias diriam:
-
11:20 - 11:23"3-oxo-C12-anilina".
-
11:24 - 11:25(Risos)
-
11:25 - 11:26(Aplausos)
-
11:26 - 11:28Obrigada.
- Title:
- Para detectar doenças mais cedo, vamos falar a língua secreta das bactérias
- Speaker:
- Fatima AlZahra’a Alatraktchi
- Description:
-
As bactérias "conversam" umas com as outras, enviando informações químicas para coordenar ataques. E se pudéssemos escutar o que elas dizem? A nanofísica Fatima AlZahra'a Alatraktchi inventou uma ferramenta para espionar a conversa entre bactérias e traduzir sua comunicação secreta para a língua humana. O trabalho dela pode abrir caminho para o diagnóstico precoce da doença, antes mesmo de ficarmos doentes.
- Video Language:
- English
- Team:
- closed TED
- Project:
- TEDTalks
- Duration:
- 11:41