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Acarinhem a vossa língua | Patricia Ryan | TEDxDubai 2010

  • 0:11 - 0:13
    Estou sempre a ouvir isto no Dubai:
  • 0:14 - 0:17
    "Está aqui de férias, não é?"
  • 0:17 - 0:18
    (Risos)
  • 0:18 - 0:20
    "Veio visitar os seus filhos?"
  • 0:20 - 0:21
    (Risos)
  • 0:21 - 0:23
    "Por quanto tempo vai cá ficar?"
  • 0:23 - 0:26
    Espero ficar ainda mais algum tempo.
  • 0:26 - 0:31
    Vivo e ensino no Golfo
    há mais de 30 anos.
  • 0:32 - 0:34
    (Aplausos)
  • 0:35 - 0:39
    Durante esse tempo,
    tenho assistido a muitas mudanças.
  • 0:40 - 0:42
    Esta estatística é muito chocante.
  • 0:42 - 0:45
    [Línguas mundiais — Hoje = 6000
    Dentro de 90 anos = 600]
  • 0:45 - 0:47
    Quero falar-vos hoje
  • 0:47 - 0:50
    sobre o desaparecimento de línguas
    e a globalização do inglês.
  • 0:50 - 0:52
    Quero falar-vos da minha amiga,
  • 0:52 - 0:55
    que ensinava inglês a adultos em Abu Dhabi
  • 0:55 - 0:59
    e um belo dia decidiu levá-los ao jardim
  • 0:59 - 1:02
    e ensinar-lhes algum vocabulário natural.
  • 1:02 - 1:05
    Mas foi ela quem acabou por aprender
    todas as palavras árabes
  • 1:05 - 1:08
    para as plantas locais,
    assim como o uso delas:
  • 1:08 - 1:13
    usos medicinais, cosmética,
    cozinha, ervanária.
  • 1:13 - 1:16
    Como é que aqueles alunos
    tinham aquele conhecimento todo?
  • 1:16 - 1:19
    Claro, dos avós e até dos bisavós.
  • 1:20 - 1:23
    Não é necessário que vos diga
    como é importante
  • 1:23 - 1:27
    ser capaz de comunicar entre gerações.
  • 1:27 - 1:33
    Infelizmente, hoje em dia, as línguas
    estão a morrer a um ritmo sem precedentes.
  • 1:33 - 1:36
    Morre uma língua todos os 14 dias.
  • 1:36 - 1:39
    Não sei como é que se sabe isso,
    mas é o que dizem.
  • 1:40 - 1:44
    Simultaneamente, o inglês
    é, sem dúvida, a língua global.
  • 1:45 - 1:48
    Poderá haver uma relação? Não sei.
  • 1:48 - 1:50
    Só sei que vi muitas mudanças.
  • 1:51 - 1:54
    Quando fui ao Golfo
    pela primeira vez, fui para o Kuwait,
  • 1:54 - 1:57
    na época em que este ainda era
    um posto diplomático problemático.
  • 1:57 - 2:01
    Não foi assim há tanto tempo,
    esta foto é mais antiga.
  • 2:02 - 2:05
    Enfim, fui recrutada
    pelo Consulado Britânico,
  • 2:05 - 2:08
    juntamente com mais 25 professores.
  • 2:08 - 2:13
    Fomos os primeiros não muçulmanos
    a ensinar nas escolas públicas do Kuwait.
  • 2:14 - 2:16
    Levaram-nos para lá para ensinar inglês,
  • 2:16 - 2:19
    porque o governo queria modernizar o país
  • 2:19 - 2:22
    e promover os cidadãos
    através do ensino.
  • 2:23 - 2:27
    Claro que o Reino Unido beneficiava
    com aquela deliciosa riqueza petrolífera.
  • 2:27 - 2:29
    Ok.
  • 2:33 - 2:36
    A principal mudança que vi foi esta:
  • 2:36 - 2:40
    como ensinar inglês deixou de ser
  • 2:40 - 2:43
    uma prática mutuamente benéfica
  • 2:43 - 2:46
    para se tornar o grande negócio
    internacional que é hoje.
  • 2:47 - 2:51
    Deixou de ser uma língua estrangeira
    no currículo escolar,
  • 2:51 - 2:54
    deixou de ser o único domínio
    da mãe Inglaterra.
  • 2:54 - 2:56
    Tornou-se na claque de apoio
  • 2:56 - 2:59
    para todas as nações
    de língua inglesa na Terra.
  • 3:00 - 3:02
    E, afinal de contas, porque não?
  • 3:03 - 3:04
    O melhor ensino,
  • 3:04 - 3:08
    segundo as últimas avaliações
    universitárias mundiais,
  • 3:08 - 3:12
    encontra-se nas universidades
    do Reino Unido e dos EUA.
  • 3:14 - 3:17
    Portanto, claro que toda a gente
    quer ter uma educação inglesa.
  • 3:18 - 3:22
    Mas, se não for a nossa língua nativa,
    temos que passar num teste.
  • 3:22 - 3:26
    Ora bem, está certo
    que se rejeite um estudante
  • 3:26 - 3:28
    apenas pela sua capacidade linguista?
  • 3:28 - 3:32
    Pode haver um cientista de computadores
    que seja um génio.
  • 3:32 - 3:36
    Ele precisará da mesma linguagem
    que um advogado, por exemplo?
  • 3:37 - 3:38
    Penso que não.
  • 3:39 - 3:42
    Nós, professores de inglês,
    estamos sempre a rejeitá-los.
  • 3:43 - 3:47
    Colocamos um sinal de "stop"
    e obrigamo-los a parar.
  • 3:47 - 3:52
    Não podem continuar com o seu sonho
    e avançar enquanto não souberem inglês.
  • 3:53 - 3:55
    Vou explicar melhor.
  • 3:55 - 3:59
    Se eu encontrar um holandês
    que só fale a sua língua
  • 3:59 - 4:01
    e que tem a cura para o cancro,
  • 4:01 - 4:04
    vou impedi-lo de entrar
    na minha universidade britânica?
  • 4:04 - 4:06
    Acho que não.
  • 4:06 - 4:09
    Mas é exatamente o que fazemos.
  • 4:09 - 4:12
    Nós, professores de inglês,
    somos os guardiões
  • 4:12 - 4:16
    e é preciso que primeiro nos provem
  • 4:16 - 4:19
    que o vosso inglês
    é suficientemente bom.
  • 4:20 - 4:23
    Pode ser perigoso dar demasiado...
  • 4:23 - 4:25
    (Risos) (Aplausos)
  • 4:25 - 4:30
    ... dar demasiado poder
    a um pequeno segmento da sociedade,
  • 4:30 - 4:33
    a barreira poderá ser demasiado universal.
  • 4:35 - 4:37
    Estou a ouvir-vos dizer:
  • 4:38 - 4:41
    "E então a investigação?
    É feita toda em inglês".
  • 4:41 - 4:43
    Os livros são em inglês,
  • 4:43 - 4:46
    as revistas são em inglês.
  • 4:46 - 4:49
    Mas isso é uma profecia
    que se cumpre a si própria.
  • 4:49 - 4:52
    Alimenta a pretensão inglesa
    e, portanto, continua.
  • 4:52 - 4:56
    Pergunto-vos, o que aconteceu à tradução?
  • 4:56 - 4:59
    Se pensarmos na Idade de Ouro islâmica,
  • 5:00 - 5:03
    — nessa altura havia muitas traduções —
  • 5:03 - 5:05
    traduzia-se do latim e do grego
  • 5:05 - 5:08
    para árabe, para persa,
  • 5:08 - 5:12
    e daí traduzia-se
    para as línguas germânicas da Europa
  • 5:12 - 5:13
    e para as línguas românicas.
  • 5:14 - 5:17
    Foi assim que a luz brilhou
    na Idade das Trevas da Europa.
  • 5:19 - 5:21
    Ora bem, não me interpretem mal,
  • 5:21 - 5:25
    — não sou contra o ensino do inglês,
    professores de inglês que aí estão —
  • 5:25 - 5:28
    acho muito bem, gosto
    que haja uma língua global,
  • 5:28 - 5:31
    precisamos de uma, hoje mais do que nunca.
  • 5:31 - 5:35
    Mas sou contra usá-la como uma barreira.
  • 5:35 - 5:38
    Queremos mesmo ficar
    apenas com 600 línguas
  • 5:38 - 5:41
    e que as principais
    sejam o inglês... ou o chinês?
  • 5:41 - 5:43
    Precisamos de mais do que isso.
  • 5:43 - 5:45
    Onde é que traçamos a linha?
  • 5:45 - 5:48
    O sistema compara a inteligência
  • 5:49 - 5:52
    com o conhecimento do inglês?
  • 5:53 - 5:54
    (Risos)
  • 5:54 - 5:57
    Isso é completamente arbitrário.
  • 5:57 - 5:59
    (Aplausos)
  • 6:02 - 6:04
    Quero lembrar-vos
  • 6:04 - 6:09
    que os gigantes sobre cujos ombros
    repousa hoje a inteligência,
  • 6:09 - 6:12
    não tinham que saber inglês,
  • 6:12 - 6:14
    — não tinham que passar
    num exame de inglês —
  • 6:14 - 6:17
    como, por exemplo, Einstein.
  • 6:17 - 6:21
    A propósito, ele era considerado
    medíocre na escola
  • 6:21 - 6:23
    porque, com efeito, era disléxico.
  • 6:23 - 6:27
    Mas, felizmente para o mundo,
    não teve que passar num exame de inglês
  • 6:27 - 6:31
    porque estes só começaram em 1964
  • 6:31 - 6:34
    com o TOEFL, o teste americano de inglês.
  • 6:34 - 6:37
    Agora, é uma explosão.
  • 6:37 - 6:39
    Há montes e montes de testes de inglês,
  • 6:39 - 6:41
    e milhões de estudantes
    fazem esses testes todos os anos.
  • 6:41 - 6:43
    [Custos: $150 — 170]
  • 6:43 - 6:45
    Podemos pensar, vocês e eu,
  • 6:45 - 6:48
    que os custos não são maus, são ok,
  • 6:48 - 6:52
    mas são proibitivos
    para muitos milhões de gente pobre.
  • 6:52 - 6:54
    Portanto, estamos a rejeitá-los
    liminarmente.
  • 6:54 - 6:56
    (Aplausos)
  • 6:57 - 7:01
    Faz-me lembrar um cabeçalho
    que vi há pouco tempo:
  • 7:01 - 7:04
    "Ensino: A Grande Divisão".
  • 7:04 - 7:08
    Eu percebo porque é que as pessoas
    se querem concentrar no inglês.
  • 7:09 - 7:12
    Querem dar aos seus filhos
    a melhor oportunidade na vida
  • 7:12 - 7:15
    e, para isso, precisam
    duma educação ocidental,
  • 7:15 - 7:17
    porque, claro, os melhores empregos
  • 7:17 - 7:20
    vão para as pessoas
    das universidades ocidentais,
  • 7:20 - 7:22
    de que eu falei há bocado.
  • 7:22 - 7:24
    É um círculo vicioso.
  • 7:26 - 7:30
    Vou contar-vos uma história sobre
    dois cientistas, dois cientistas ingleses.
  • 7:30 - 7:34
    Estavam a fazer uma experiência
    relacionada com genética,
  • 7:34 - 7:37
    sobre os membros anteriores
    e posteriores de animais.
  • 7:37 - 7:40
    Mas não obtinham
    os resultados que queriam.
  • 7:40 - 7:42
    Não sabiam o que haviam de fazer,
  • 7:42 - 7:45
    até que apareceu
    um cientista alemão que percebeu
  • 7:45 - 7:48
    que eles estavam a usar duas palavras
  • 7:48 - 7:50
    para "membro anterior"
    e "membro posterior",
  • 7:50 - 7:55
    quando a genética não os diferencia,
    tal como o alemão.
  • 7:56 - 7:59
    Portanto, bingo! Problema resolvido!
  • 7:59 - 8:02
    Se não conseguimos pensar um pensamento,
  • 8:02 - 8:04
    ficamos encalhados.
  • 8:04 - 8:07
    Mas se outra língua consegue
    pensar esse pensamento,
  • 8:07 - 8:11
    através da cooperação, podemos conseguir
    e aprender muito mais.
  • 8:13 - 8:18
    A minha filha saiu do Kuwait
    para Inglaterra.
  • 8:18 - 8:24
    Estudou ciências e matemática em árabe
    numa escola secundária árabe.
  • 8:24 - 8:27
    Teve que traduzir tudo para inglês
    na Escola de Gramática.
  • 8:27 - 8:31
    Foi a melhor da classe nesses temas,
  • 8:31 - 8:36
    o que nos diz que, quando chegam aqui
    estudantes do estrangeiro,
  • 8:36 - 8:39
    não estamos a dar crédito suficiente
    àquilo que eles sabem,
  • 8:39 - 8:42
    que eles sabem na sua própria língua.
  • 8:42 - 8:44
    Quando uma língua morre,
  • 8:44 - 8:48
    não sabemos
    o que perdemos com essa língua.
  • 8:50 - 8:51
    Isto é encantador.
  • 8:51 - 8:54
    Não sei se viram isto há pouco na CNN.
  • 8:54 - 8:57
    O Prémio dos Heróis foi dado
  • 8:57 - 9:00
    a um jovem pastor queniano
  • 9:01 - 9:06
    que não podia estudar à noite na aldeia
    — assim como todas as crianças da aldeia —
  • 9:06 - 9:09
    porque o candeeiro de petróleo fumegava
    e fazia-lhes mal aos olhos.
  • 9:09 - 9:12
    De resto, nunca havia petróleo suficiente
  • 9:12 - 9:14
    porque o que é que se compra
    com um dólar por dia?
  • 9:16 - 9:20
    Então, ele inventou
    um candeeiro solar, gratuito,
  • 9:20 - 9:24
    e agora, as crianças da aldeia
    têm as mesmas notas na escola
  • 9:24 - 9:27
    do que as crianças
    que têm eletricidade em casa.
  • 9:28 - 9:31
    (Aplausos)
  • 9:34 - 9:38
    Quando ele recebeu o prémio,
    disse estas palavras encantadoras:
  • 9:38 - 9:41
    "As crianças podem mudar África
    do que ela é hoje,
  • 9:41 - 9:45
    "de um continente escuro,
    para um continente iluminado".
  • 9:45 - 9:50
    Uma ideia simples, mas pode ter
    consequências de grande alcance.
  • 9:51 - 9:53
    Pessoas que não têm luz,
  • 9:53 - 9:56
    seja física seja metaforicamente,
  • 9:56 - 9:59
    não podem passar nos nossos exames.
  • 9:59 - 10:02
    Podemos nunca saber
    o que é que elas sabem.
  • 10:02 - 10:07
    Não deixemos que elas, e nós próprios,
    fiquemos na escuridão.
  • 10:07 - 10:10
    Festejemos a diversidade.
  • 10:11 - 10:13
    Acarinhem a vossa língua!
  • 10:13 - 10:17
    Usem-na para espalhar grandes ideias!
  • 10:17 - 10:19
    (Aplausos)
Title:
Acarinhem a vossa língua | Patricia Ryan | TEDxDubai 2010
Description:

O inglês é um grande negócio e as línguas estão a morrer como nunca aconteceu. Haverá uma relação? Será mais uma manifestação da McDonaldização — o rosto indesejável da globalização? Queremos perder a variedade de línguas e toda a rica cultura que lhes pertence?

Esta palestra foi feita num evento TEDx usando o formato de palestras TED, mas organizado independentemente por uma comunidade local. Saiba mais em http://ted.com/tedx

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDxTalks
Duration:
10:25

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