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A surpreendente conexão entre traumatismo cranioencefálico e crime

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    O traumatismo cranioencefálico, ou TCE,
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    é uma disfunção cerebral
    causada por uma força externa na cabeça.
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    E, quando ouvem essa definição,
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    vocês talvez pensem
    em esportes e atletas profissionais,
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    já que é o tipo de lesão que estamos
    acostumados a ver nos esportes.
  • 0:19 - 0:25
    E esta imagem realmente marcou
    o TCE no imaginário público.
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    Eu mesma faço pesquisas sobre o TCE
    em atletas aposentados e universitários.
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    Já estive num palco do TED em 2010
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    falando sobre concussões
    em crianças nos esportes.
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    Então, como alguém
    que pesquisa e trata essas lesões,
  • 0:40 - 0:45
    fiquei muito satisfeita de ver
    a crescente consciência sobre o TCE,
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    especialmente na questão dos riscos
    a curto e longo prazo para os atletas.
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    Hoje, porém, quero apresentá-los
    a um grupo maior e mais controverso
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    de pessoas impactadas
    pelo traumatismo cranioencefálico
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    que não costuma aparecer nas manchetes.
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    Descobrimos que pessoas presas
    e em liberdade condicional
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    estão, surpreendentemente,
    entre as mais vulneráveis da sociedade.
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    Nos últimos seis anos,
    meus colegas e eu temos feito pesquisas
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    que mudaram completamente a maneira
    de pensar o sistema da justiça penal,
  • 1:19 - 1:20
    e as pessoas ali dentro.
  • 1:20 - 1:23
    E talvez elas mudem também
    seu modo de pensar sobre isso.
  • 1:23 - 1:25
    Vou começar com uma estatística chocante:
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    50 a 80% das pessoas na justiça penal
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    sofreram traumatismo cranioencefálico.
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    Até 80%.
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    Na sociedade em geral,
    neste auditório por exemplo,
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    esse número é inferior a 5%.
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    E não estou falando apenas
    de bater a cabeça e "ver estrelas".
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    Trata-se de lesões
    que demandam hospitalização.
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    A maioria delas é produto
    de uma agressão física,
  • 1:56 - 1:59
    e, em alguns casos,
    essas agressões continuam na cadeia.
  • 1:59 - 2:04
    Todos esses números são ainda maiores
    entre as mulheres no sistema penal.
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    Quase todas as mulheres
    no sistema judicial penal
  • 2:09 - 2:13
    foram expostas a relacionamentos
    interpessoais violentos e abusivos.
  • 2:14 - 2:20
    Mais da metade delas foram expostas
    a repetidas lesões cerebrais.
  • 2:21 - 2:22
    Nesse aspecto,
  • 2:22 - 2:28
    o cérebro dessas mulheres se parece
    com o de jogadores aposentados da NFL,
  • 2:28 - 2:33
    e provavelmente enfrentam os mesmos riscos
    de demência à medida que envelhecem.
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    Os mesmos riscos.
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    O TCE, juntamente com doença mental
    e abuso de substâncias e traumas,
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    dificulta o raciocínio das pessoas.
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    Elas apresentam deficiências cognitivas,
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    tomam decisões ruins
    e não têm muito autocontrole,
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    problemas que fazem da justiça penal
    uma porta giratória.
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    As pessoas são presas
    e levadas para a cadeia
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    e, muitas vezes, se metem
    em confusão enquanto estão lá,
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    se metem em brigas, caem do beliche,
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    e então são soltas e fazem bobagem,
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    como se esquecer
    das apresentações obrigatórias,
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    e são presas novamente.
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    Estatisticamente falando,
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    elas têm uma chance maior de serem presas
    novamente, do que não serem.
  • 3:15 - 3:18
    Um colega chama isso de "cumprir
    uma sentença de prisão perpétua
  • 3:19 - 3:21
    30 dias por vez".
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    E, muitas vezes, essas pessoas não sabem
    por que isso é tão difícil para elas.
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    Elas se sentem
    descontroladas e frustradas.
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    Então, sabendo que o TCE
    está na raiz de tantos desses desafios,
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    a missão do nosso grupo, no Colorado,
    tem sido interromper esse ciclo,
  • 3:42 - 3:44
    a fim de parar essa porta giratória.
  • 3:44 - 3:47
    Com o governo estadual e parceiros locais,
  • 3:47 - 3:51
    criamos um plano para atender
    as necessidades de todos:
  • 3:51 - 3:53
    do sistema, daqueles presos
    e na condicional,
  • 3:53 - 3:55
    e de meus alunos da pós-graduação.
  • 3:55 - 4:00
    Nesse programa, avaliamos
    como funciona o cérebro de cada pessoa
  • 4:00 - 4:02
    para que possamos recomendar
    modificações básicas
  • 4:02 - 4:05
    para tornar o sistema mais eficaz
  • 4:05 - 4:06
    e mais seguro.
  • 4:07 - 4:11
    E, quando digo "mais seguro",
    quero dizer não só para os presos,
  • 4:11 - 4:13
    (Risos)
  • 4:13 - 4:16
    mas mais seguro também
    para os agentes penitenciários.
  • 4:16 - 4:20
    Essa é uma abordagem muito simples
    sob vários aspectos.
  • 4:20 - 4:23
    Não estamos tratando a lesão cerebral,
  • 4:23 - 4:28
    e sim o problema subjacente que leva
    as pessoas a todos esses problemas
  • 4:28 - 4:29
    primeiramente.
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    Fazemos testes neuropsicológicos rápidos
  • 4:33 - 4:37
    para identificar pontos fortes e fracos
    na forma de pensar de um condenado.
  • 4:37 - 4:41
    Usando essa informação,
    fazemos dois relatórios:
  • 4:41 - 4:43
    um para o sistema,
  • 4:43 - 4:47
    com recomendações específicas
    sobre como lidar com aquele preso.
  • 4:48 - 4:51
    O outro é para o preso,
  • 4:51 - 4:55
    com sugestões específicas
    sobre como se conduzir.
  • 4:55 - 4:57
    Por exemplo,
  • 4:57 - 5:00
    se o resultado do teste sugerir
    que o condenado tem dificuldade
  • 5:00 - 5:02
    de se lembrar daquilo que ouve,
  • 5:02 - 5:05
    isso seria um déficit de memória auditiva.
  • 5:05 - 5:08
    Nesse caso, nossa carta
    para o fórum pode sugerir
  • 5:08 - 5:12
    que se dê àquele condenado na condicional
    informações importantes por escrito.
  • 5:12 - 5:16
    E a nossa carta para esse condenado
    diria, entre outras coisas,
  • 5:16 - 5:20
    que ele deveria carregar um caderno
    para guardar essas informações.
  • 5:21 - 5:24
    Agora, acima de qualquer coisa,
  • 5:24 - 5:28
    pauso aqui para ser
    bem clara sobre um ponto.
  • 5:28 - 5:31
    Esse programa não
    minimiza a responsabilidade
  • 5:32 - 5:35
    nem dá justificativas
    para o comportamento de ninguém.
  • 5:35 - 5:39
    O programa tem a ver com mudar
    percepções negativas arraigadas
  • 5:39 - 5:42
    e construir autodefesa.
  • 5:42 - 5:45
    Na verdade, tem a ver
    com assumir responsabilidade.
  • 5:45 - 5:49
    Os presos passam de "Sou
    um completo idiota, um fracassado"
  • 5:49 - 5:52
    para "Isso é o que eu não faço bem,
  • 5:52 - 5:56
    e isso é o que tenho de fazer a respeito".
  • 5:56 - 5:59
    (Aplausos)
  • 6:04 - 6:08
    E o sistema começa a ver
    o comportamento problemático de um preso
  • 6:08 - 6:11
    como algo que ele não consegue fazer
  • 6:11 - 6:13
    em vez de algo que ele não quer fazer.
  • 6:13 - 6:15
    E essa mudança
  • 6:15 - 6:19
    de ver o comportamento como um déficit
    em vez de uma clara infração
  • 6:19 - 6:22
    é tudo nessa situação.
  • 6:24 - 6:27
    Recebemos cartas
    de prisioneiros de todo o país,
  • 6:27 - 6:31
    e sua maior preocupação
    é saber como se ajudar.
  • 6:31 - 6:35
    Este é um trecho de uma carta
    de Troy, da Virgínia,
  • 6:35 - 6:38
    um trecho de uma carta de 50 páginas.
  • 6:38 - 6:40
    E ele diz:
  • 6:40 - 6:44
    "Vocês podem me dizer o que acham
    de todos os traumas que tenho na cabeça?
  • 6:44 - 6:48
    O que posso fazer? Vocês podem me ajudar?"
  • 6:48 - 6:51
    Perto daqui, temos
    milhares de histórias como essa,
  • 6:51 - 6:56
    e histórias positivas, histórias
    que deram um ótimo resultado.
  • 6:56 - 6:58
    Este é o Vinny.
  • 6:58 - 7:01
    Vinny foi atropelado
    por um carro aos 15 anos
  • 7:01 - 7:06
    e, dali em diante, passou mais tempo
    na cadeia do que na escola.
  • 7:06 - 7:10
    Com mudanças básicas,
    depois de nossa avaliação revelar
  • 7:10 - 7:13
    que ele tinha algumas deficiências
    significativas na memória,
  • 7:13 - 7:17
    Vinny aprendeu a usar o alarme
    e a função lembrete de seu iPhone
  • 7:17 - 7:20
    para lembrá-lo
    de compromissos importantes,
  • 7:20 - 7:23
    e ele mantém uma lista
    em que divide tarefas maiores
  • 7:23 - 7:26
    em menores e gerenciáveis.
  • 7:26 - 7:28
    E, com ferramentas básicas,
  • 7:28 - 7:31
    Vinny está fora da prisão há dois anos,
  • 7:31 - 7:32
    está limpo há nove meses,
  • 7:32 - 7:34
    e recentemente voltou ao trabalho.
  • 7:35 - 7:38
    (Aplausos)
  • 7:42 - 7:44
    O mais impressionante sobre Vinny
  • 7:44 - 7:48
    é que esta é a sua primeira vez
    fora da supervisão do fórum
  • 7:48 - 7:51
    desde sua lesão há mais de 15 anos.
  • 7:52 - 7:55
    Ele escapou da porta giratória.
  • 7:56 - 7:58
    (Aplausos)
  • 8:01 - 8:05
    Agora ele fala:
    "Posso fazer qualquer coisa.
  • 8:06 - 8:09
    Só tenho de me esforçar mais".
  • 8:09 - 8:10
    (Risos)
  • 8:10 - 8:12
    Este é o Thomas.
  • 8:12 - 8:16
    Thomas adquiriu problemas de atenção
    e comportamento bem significativos
  • 8:16 - 8:20
    depois que uma lesão o deixou
    em coma por mais de um mês.
  • 8:21 - 8:24
    Depois de reaprender a andar,
    sua primeira parada?
  • 8:24 - 8:26
    O fórum.
  • 8:26 - 8:29
    Ele não conseguia imaginar um futuro
    onde não estivesse encrencado.
  • 8:29 - 8:32
    Agora ele carrega um calendário
    para evitar cometer infrações
  • 8:32 - 8:34
    por esquecer de ir ao fórum,
  • 8:34 - 8:37
    e ele agenda um intervalo
    em sua rotina diária
  • 8:37 - 8:40
    para recarregar, antes que fique agitado.
  • 8:42 - 8:44
    E ninguém conhece a porta giratória
  • 8:44 - 8:47
    melhor do que a figura central
    da sala de audiências do fórum.
  • 8:47 - 8:50
    Este é o juiz Brian Bowen,
    um velho amigo e colega.
  • 8:50 - 8:55
    O juiz Bowen já estava empenhado
    em fazer o sistema funcionar para todos
  • 8:55 - 8:59
    e, quando ouviu falar desse programa,
    ele achou que se encaixava perfeitamente.
  • 8:59 - 9:02
    Na verdade, ele se senta com os promotores
  • 9:02 - 9:07
    para ajudá-los a ver que há basicamente
    duas categorias de réus no fórum:
  • 9:08 - 9:12
    aqueles de quem temos medo,
    com razão, muitas vezes,
  • 9:12 - 9:14
    e aqueles de quem temos raiva.
  • 9:15 - 9:18
    Estes últimos são os que faltam
    às audiências agendadas
  • 9:18 - 9:21
    e estragam os melhores
    planos de liberdade condicional.
  • 9:21 - 9:23
    E o juiz Bowen acredita que,
    com um pouco mais de apoio,
  • 9:23 - 9:26
    poderíamos passar as pessoas
    dessa última categoria,
  • 9:26 - 9:28
    a que enlouquece todo mundo,
  • 9:28 - 9:31
    pelo sistema e, finalmente, pra fora dele.
  • 9:32 - 9:36
    Ele provou isso com Mike,
    um veterano da Marinha.
  • 9:36 - 9:42
    O juiz Bowen viu a correlação entre
    uma queda que Mike teve, de 20 metros,
  • 9:42 - 9:47
    e seu padrão de dificuldade
    de se apresentar no dia certo
  • 9:47 - 9:49
    para as audiências no fórum,
  • 9:49 - 9:52
    e de cumprir os requisitos obrigatórios
    terapêuticos, por exemplo.
  • 9:53 - 9:57
    E, em vez de sentenciá-lo
    a mais tempo de prisão,
  • 9:57 - 10:02
    o juiz Bowen mandou-o para casa
    com mapas, listas e folhetos,
  • 10:02 - 10:06
    recomendando, em vez disso,
    reabilitação vocacional
  • 10:06 - 10:09
    e agendamento flexível
    para essas terapias.
  • 10:09 - 10:13
    E, com esses apoios,
    Mike voltou ao trabalho
  • 10:13 - 10:17
    pela primeira vez desde a lesão
    enquanto ele estava se recuperando.
  • 10:17 - 10:20
    Ele está reatando
    os laços com a sua família
  • 10:20 - 10:22
    e, mês passado,
  • 10:22 - 10:25
    ele foi liberado do fórum
    de veteranos do juiz Bowen.
  • 10:25 - 10:28
    (Aplausos)
  • 10:33 - 10:38
    Este programa nos mostra
    a predominância esmagadora
  • 10:38 - 10:41
    de traumatismo cranioencefálico,
    déficits cognitivos
  • 10:41 - 10:45
    e o acúmulo de disfunções
    no sistema da justiça penal.
  • 10:46 - 10:52
    E destaca o extraordinário poder
    da resiliência e da responsabilidade.
  • 10:53 - 10:56
    Nas histórias de Mike, Thomas
    e Vinny, e até do juiz Bowen,
  • 10:56 - 11:01
    vimos a transformação sendo possível
    por uma mudança na percepção
  • 11:01 - 11:04
    e com alguns ajustes simples.
  • 11:05 - 11:07
    No final, nesse programa,
  • 11:07 - 11:13
    pessoas encarceradas e na condicional
    conseguem se ver de forma diferente.
  • 11:14 - 11:16
    O sistema os vê de forma diferente
  • 11:17 - 11:20
    e, quando vocês os encontrarem
    na sua comunidade,
  • 11:20 - 11:22
    espero que os vejam
    de um jeito diferente também.
  • 11:23 - 11:25
    Obrigada, pessoal!
  • 11:25 - 11:27
    (Aplausos) (Vivas)
Title:
A surpreendente conexão entre traumatismo cranioencefálico e crime
Speaker:
Kim Gorgens
Description:

Eis uma estatística chocante: de 50 a 80% das pessoas na justiça penal dos Estados Unidos sofreram traumatismo cranioencefálico. Na sociedade, em geral, esse número é inferior a 5%. A neuropsicóloga Kim Gorgens fala da sua pesquisa sobre a relação entre trauma cerebral e comportamentos que mantêm as pessoas na porta giratória da justiça penal — e mostra algumas maneiras de tornar o sistema mais eficaz e seguro para todos.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
11:42

Portuguese, Brazilian subtitles

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