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Como ouvir com atenção.

  • 0:01 - 0:04
    Não tenho bem a certeza
    se me apetece ver
  • 0:04 - 0:07
    uma caixa às nove da manhã.
  • 0:07 - 0:08
    (Risos)
  • 0:08 - 0:12
    Apesar disso, é formidável
    ver a sala assim tão cheia,
  • 0:12 - 0:15
    Devo agradecer ao Herbie Hancock
  • 0:15 - 0:18
    e aos seus colegas
    por uma apresentação tão boa.
  • 0:18 - 0:20
    (Aplausos)
  • 0:20 - 0:23
    Uma das coisas interessantes
  • 0:23 - 0:28
    é a combinação da mão
    com o toque do instrumento
  • 0:28 - 0:35
    e a tecnologia e, claro, o que ele disse
    sobre ouvir os nossos jovens.
  • 0:35 - 0:40
    O meu trabalho tem tudo a ver com escutar.
  • 0:40 - 0:46
    O meu objetivo é ensinar
    o mundo a escutar.
  • 0:46 - 0:50
    É o meu único objetivo real na vida.
  • 0:50 - 0:57
    Parece simples, mas é um trabalho imenso.
  • 0:57 - 1:01
    Porque, quando olhamos
    para uma peça musical
  • 1:01 - 1:05
    — por exemplo, se eu abrir
    o meu saquinho de motociclista —
  • 1:07 - 1:12
    temos aqui uma partitura
  • 1:12 - 1:15
    cheia de pontinhos negros na página.
  • 1:20 - 1:24
    Abrimos isto e eu leio a música.
  • 1:25 - 1:29
    Tecnicamente, posso ler isto.
  • 1:29 - 1:33
    Sigo as instruções,
    as marcações do tempo, a dinâmica.
  • 1:34 - 1:37
    Vou fazer tal e qual o que a pauta manda.
  • 1:38 - 1:41
    Mas, como o tempo escasseia,
  • 1:41 - 1:45
    só vou tocar
  • 1:45 - 1:48
    uma ou talvez duas linhas.
  • 1:49 - 1:52
    É muito simples.
    Não há grande dificuldade nesta música.
  • 1:52 - 1:55
    Mas diz aqui que esta
    música é muito rápida.
  • 1:56 - 2:00
    Diz aqui em que parte da caixa devo tocar.
  • 2:00 - 2:03
    Diz qual a parte da baqueta que devo usar.
  • 2:04 - 2:07
    E está indicada a dinâmica.
  • 2:07 - 2:11
    Também diz que a caixa
    deve estar sem esteira.
  • 2:12 - 2:14
    Com esteira, sem esteira.
  • 2:14 - 2:20
    Se eu traduzir esta partitura,
  • 2:20 - 2:22
    temos esta ideia.
  • 2:24 - 2:27
    (Música)
  • 2:54 - 2:58
    E assim sucessivamente. Provavelmente,
    a minha carreira duraria cinco anos.
  • 3:00 - 3:07
    Contudo, o que devo fazer como músico
    é tudo o que não está na partitura.
  • 3:08 - 3:13
    Tudo o que não se tem tempo
    para aprender com um professor,
  • 3:13 - 3:16
    ou mesmo para falar com um professor.
  • 3:16 - 3:21
    Mas são as coisas que notamos,
    quando não estamos com o instrumento,
  • 3:21 - 3:26
    que se tornam muito interessantes,
    e que nos dão vontade de explorar
  • 3:26 - 3:30
    através desta fina superfície de um tambor.
  • 3:30 - 3:33
    Assim, já experimentámos a tradução.
  • 3:33 - 3:36
    Agora vamos experimentar a interpretação.
  • 3:38 - 3:42
    (Música)
  • 4:23 - 4:26
    (Aplausos)
  • 4:30 - 4:33
    Agora a minha carreira
    pode dura um pouco mais!
  • 4:33 - 4:34
    (Risos)
  • 4:34 - 4:38
    De certa forma, é o mesmo
    que olhar para vocês
  • 4:38 - 4:42
    e ver uma linda rapariga,
    com uma blusa cor-de-rosa.
  • 4:42 - 4:45
    Ou vejo que vocês agarram
    num peluche, etc. etc.
  • 4:45 - 4:50
    Fico com uma ideia básica
    do que vocês são,
  • 4:50 - 4:55
    do que podem gostar,
    de qual será a vossa profissão, etc.
  • 4:55 - 5:01
    No entanto, isso é apenas a ideia inicial
    com que eu fico, com que todos ficamos
  • 5:01 - 5:04
    quando olhamos, de facto,
  • 5:04 - 5:07
    e tentamos interpretar
    mas é incrivelmente superficial.
  • 5:07 - 5:10
    Do mesmo modo, eu olho para a partitura,
    fico com uma ideia inicial,
  • 5:10 - 5:15
    pondero os pontos tecnicamente difíceis,
    ou o que quero fazer.
  • 5:15 - 5:16
    Apenas a sensação básica.
  • 5:16 - 5:19
    Contudo, isto só não chega.
  • 5:19 - 5:22
    Penso no que disse o Herbie:
    "Escutem, escutem por favor".
  • 5:23 - 5:26
    Temos que nos escutar a nós próprios,
    antes de mais nada.
  • 5:26 - 5:30
    Se eu toco, por exemplo,
    agarrando a baqueta
  • 5:30 - 5:34

    — literalmente, não a largo —
  • 5:36 - 5:40
    vocês aperceber-se-ão das sacudidelas
    a subir pelo meu braço acima.
  • 5:40 - 5:42
    Sente-se mesmo muito, podem crer,
  • 5:42 - 5:45
    desligado do instrumento e da baqueta,
  • 5:45 - 5:50
    apesar de eu estar
    a agarrar a baqueta firmemente.
  • 5:51 - 5:55
    Ao agarrá-la com força,
    sinto-me estranhamente mais desligada.
  • 5:55 - 5:57
    Se eu a agarrar ao de leve
  • 5:57 - 6:02
    e permitir que a mão, o braço
    sejam sobretudo um sistema de apoio,
  • 6:02 - 6:08
    de repente tenho mais dinâmica
    com menos esforço.
  • 6:09 - 6:10
    Muito mais.
  • 6:12 - 6:16
    E, por fim, eu sinto-me uma só
    com a baqueta e o tambor.
  • 6:16 - 6:18
    E estou a fazer muito menos.
  • 6:18 - 6:22
    Tal como preciso de tempo
    com este instrumento,
  • 6:22 - 6:27
    preciso de tempo com as pessoas
    para poder interpretá-las.
  • 6:27 - 6:30
    Não só traduzi-las, mas interpretá-las.
  • 6:30 - 6:36
    Se tocar só alguns compassos
    duma peça musical,
  • 6:37 - 6:43
    em que me considero um técnico
  • 6:43 - 6:47
    — ou seja, uma pessoa
    que é, sobretudo, um percussionista...
  • 6:47 - 6:50
    (Música)
  • 7:00 - 7:03
    Mas se eu pensar em mim como um músico...
  • 7:03 - 7:06
    (Música)
  • 7:25 - 7:28
    Há uma pequena diferença...
  • 7:28 - 7:30
    (Risos)
  • 7:30 - 7:32
    ... em que vale a pena pensar.
  • 7:32 - 7:34
    (Aplausos)
  • 7:34 - 7:38
    Lembro-me que, quando tinha 12 anos,
  • 7:38 - 7:43
    e comecei a tocar címbalos e percussão,
    o meu professor disse:
  • 7:43 - 7:49
    "Como é que nós vamos fazer isto?
    A música é uma questão de escutar."
  • 7:49 - 7:53
    E eu: "Concordo com isso.
    Então qual é o problema?"
  • 7:54 - 7:58
    E ele: "Como é que vais ouvir isto?
    Como é que vais ouvir aquilo?"
  • 7:58 - 8:00
    E eu: "Como é que tu ouves?"
  • 8:00 - 8:04
    E ele: "Acho que é com os ouvidos."
  • 8:04 - 8:09
    E eu: "Eu também, mas eu
    também ouço através das mãos,
  • 8:09 - 8:16
    "através dos braços, das maçãs do rosto,
    do crânio, da barriga, do peito, das pernas."
  • 8:16 - 8:22
    Começávamos sempre as lições
    a afinar os tambores
  • 8:22 - 8:25
    — em especial os membranofones
    ou címbalos —
  • 8:25 - 8:31
    num intervalo aberto, qualquer coisa
    como isto...
  • 8:35 - 8:36
    ... esta diferença.
  • 8:36 - 8:38
    Depois gradualmente...
  • 8:39 - 8:40
    e gradualmente ...
  • 8:42 - 8:46
    E é incrível quando abrimos
    todo o nosso corpo,
  • 8:46 - 8:50
    abrimos a mão para deixar
    passar a vibração,
  • 8:50 - 8:54
    e podemos sentir
    essa diferença tão pequenina
  • 8:54 - 9:00
    com a parte mais pequena do dedo, aqui.
  • 9:00 - 9:05
    Assim, eu punha as mãos na parede
    da sala de música
  • 9:05 - 9:11
    e juntos "ouvíamos"
    os sons dos instrumentos,
  • 9:11 - 9:14
    e tentávamos ligar-nos a esses sons
  • 9:14 - 9:19
    de forma mais ampla
    do que dependendo só do ouvido.
  • 9:19 - 9:24
    Porque, claro, o ouvido está sujeito
    a todo tipo de coisas.
  • 9:24 - 9:28
    A sala onde estávamos, a amplificação,
    a qualidade do instrumento,
  • 9:28 - 9:30
    o tipo de baquetas, etc.
  • 9:38 - 9:40
    Tudo é diferente.
  • 9:46 - 9:51
    O mesmo peso, mas uma coloração
    sonora diferente.
  • 9:51 - 9:53
    Isso é basicamente o que somos.
  • 9:53 - 9:56
    Somos seres humanos,
    mas todos temos as nossas cores sonoras,
  • 9:56 - 10:00
    que fazem estas extraordinárias
    personalidades e caracteres
  • 10:00 - 10:03
    interesses e outras coisas.
  • 10:03 - 10:08
    Anos mais tarde, quando fui às audições
    para a Real Academia de Música de Londres,
  • 10:08 - 10:13
    disseram-me: "Não te aceitamos,
    porque não temos a mínima ideia,
  • 10:13 - 10:17
    "quanto ao futuro de uma música 'surda'."
  • 10:18 - 10:21
    Eu não podia aceitar aquilo.
  • 10:22 - 10:25
    Portanto, eu disse-lhes:
  • 10:26 - 10:31
    "Se vocês me rejeitarem por essas razões,
  • 10:31 - 10:34
    "em vez de ser pela capacidade
  • 10:34 - 10:40
    de interpretar, de compreender e de amar
  • 10:40 - 10:43
    "a arte de criar som,
  • 10:43 - 10:49
    "temos que pensar muito a sério
    sobre as pessoas que vocês aceitam."
  • 10:49 - 10:54
    E assim — depois de passar por cima
    desse pequeno obstáculo,
  • 10:54 - 10:58
    e de eu ter feito outra audição —
    eles aceitaram-me.
  • 10:59 - 11:03
    E não só, isso mudou totalmente o papel
  • 11:03 - 11:07
    das instituições de música
    em todo o Reino Unido.
  • 11:07 - 11:14
    Nunca mais rejeitaram
    nenhum candidato
  • 11:14 - 11:18
    por não ter braços, ou não ter pernas
  • 11:18 - 11:21
    — talvez pudessem ainda
    tocar um instrumento de sopro,
  • 11:21 - 11:23
    se estivesse colocado num suporte.
  • 11:23 - 11:29
    Nunca mais usaram qualquer desculpa
    para recusar uma inscrição.
  • 11:29 - 11:35
    Todos os pedidos tinham
    que ser escutados, experimentados
  • 11:35 - 11:42
    e, com base na capacidade musical,
    essa pessoa podia entrar ou não.
  • 11:43 - 11:48
    Isto por sua vez significou
    que começaram a aparecer estudantes
  • 11:48 - 11:52
    extremamente interessantes
    nessas instituições de música.
  • 11:53 - 11:55
    Devo dizer, muitos deles estão agora
  • 11:55 - 11:59
    em orquestras profissionais
    por esse mundo fora.
  • 12:00 - 12:03
    (Aplausos)
  • 12:04 - 12:06
    Mas o mais interessante
  • 12:06 - 12:13
    é que as pessoas ligam-se ao som
  • 12:13 - 12:19
    — praticamente todos nós , e sabemos bem
    que a música é a nossa medicina diária.
  • 12:19 - 12:22
    Eu digo "música", mas realmente
    quero dizer "som".
  • 12:22 - 12:26
    Porque algumas das coisas
    extraordinárias que vivi como música,
  • 12:26 - 12:31
    quando temos um miúdo de 15 anos,
  • 12:31 - 12:36
    que tem problemas incríveis,
  • 12:36 - 12:38
    que talvez não seja capaz
    de controlar os movimentos,
  • 12:38 - 12:41
    que pode ser surdo, pode ser cego, etc.,
  • 12:41 - 12:48
    de repente, se esse miúdo
    se senta perto deste instrumento,
  • 12:48 - 12:50
    ou talvez se deite debaixo das marimbas,
  • 12:50 - 12:56
    e tocamos uma coisa que pareça órgão...
  • 12:56 - 13:01
    — não devo ter aqui as baquetas apropriadas.
    Mas qualquer coisa como isto:
  • 13:05 - 13:09
    (Música)
  • 13:53 - 13:55
    ... uma coisa assim
    incrivelmente simples,
  • 13:55 - 14:01
    ele teria uma experiência
    que eu não teria,
  • 14:01 - 14:02
    porque eu estou por cima do som.
  • 14:02 - 14:05
    O som chega-me deste lado.
  • 14:05 - 14:08
    Ele receberia o som a sair
    dos tubos ressoadores.
  • 14:08 - 14:12
    Se não tivéssemos
    ressoadores aqui, teríamos...
  • 14:18 - 14:23
    Assim, ele teria uma imensidão de som
    que vocês nas primeiras filas não teriam
  • 14:23 - 14:26
    e vocês nas últimas filas também não.
  • 14:27 - 14:30
    Cada um de nós, consoante
    o lugar onde estejamos sentados,
  • 14:30 - 14:33
    experimentará este som
    de forma muito diferente.
  • 14:34 - 14:36
    E claro, ser participante do som,
  • 14:36 - 14:42
    — partindo da ideia de qual o tipo de som
    que eu quero eu produzir —
  • 14:42 - 14:45
    por exemplo, este som.
  • 14:51 - 14:54
    Conseguem ouvir alguma coisa?
  • 14:54 - 14:57
    Exato. Porque eu nem sequer estou a tocar.
  • 14:57 - 14:58
    (Risos)
  • 14:58 - 15:03
    Mas ficamos com a sensação
    de que aconteceu alguma coisa.
  • 15:03 - 15:05
    Do mesmo modo que,
    quando vejo uma árvore a mexer,
  • 15:05 - 15:09
    imagino a árvore a fazer
    um som sussurrante.
  • 15:09 - 15:11
    Estão a ver o que eu quero dizer?
  • 15:11 - 15:15
    Em tudo o que os olhos veem,
    há sempre um som.
  • 15:15 - 15:21
    Assim, há sempre
    este enorme caleidoscópio
  • 15:21 - 15:24
    onde ir buscar coisas.
  • 15:24 - 15:30
    Todas as minhas atuações baseiam-se
    totalmente no que eu experimento,
  • 15:30 - 15:34
    não em aprender uma peça musical,
    ou usar a interpretação de outra pessoa,
  • 15:34 - 15:39
    comprar todos os CDs possíveis
    dessa peça em particular, etc.
  • 15:39 - 15:46
    Porque isso não me dá aquilo
    que, para mim, é cru e básico,
  • 15:46 - 15:51
    aquilo com que eu posso
    disfrutar da viagem.
  • 15:51 - 16:00
    Pode ser que, em certas salas,
    esta dinâmica funcione.
  • 16:00 - 16:03
    (Música)
  • 16:09 - 16:14
    Pode ser que, noutras salas,
    eles acabem por não sentir nada,
  • 16:14 - 16:17
    e, por isso, o meu nível de suavidade
  • 16:17 - 16:19
    talvez tenha que passar a ser...
  • 16:19 - 16:22
    (Música)
  • 16:43 - 16:45
    Estão a ver o que eu quero dizer?
  • 16:45 - 16:50
    Assim, por causa desta explosão
    de acesso ao som,
  • 16:50 - 16:52
    especialmente na comunidade dos surdos,
  • 16:52 - 16:57
    isto está a afetar a forma
    como as instituições de música,
  • 16:57 - 17:04
    as escolas para surdos tratam o som
    — não só como uma forma de terapia —
  • 17:04 - 17:06
    mas como sendo participantes da música,
  • 17:06 - 17:09
    que é o que se está a passar.
  • 17:09 - 17:14
    Os técnicos de acústica tiveram
    que pensar muito a sério
  • 17:14 - 17:18
    no tipo de salas que desenham.
  • 17:18 - 17:21
    Atrevo-me a dizer que há
    muito poucas salas no mundo
  • 17:21 - 17:27
    com uma acústica realmente boa.
  • 17:27 - 17:31
    Quero com isto dizer que podemos fazer
    tudo aquilo que imaginarmos.
  • 17:31 - 17:35
    Desde o mais pequeno,
    o mais suave dos sons,
  • 17:35 - 17:40
    a uma coisa abrangente, grande e incrível.
  • 17:39 - 17:41
    Mas há sempre coisas
  • 17:41 - 17:43
    — pode soar bem aqui,
    talvez não tão bem acolá.
  • 17:43 - 17:45
    Pode estar ótimo ali, terrível além.
  • 17:45 - 17:49
    Talvez terrível aqui,
    mas aceitável acolá, etc.
  • 17:50 - 17:54
    Assim, é incrível encontrar uma sala
  • 17:54 - 17:58
    onde possamos tocar exatamente
    aquilo que imaginamos,
  • 17:58 - 18:01
    sem a melhorar cosmeticamente.
  • 18:01 - 18:07
    Por isso, os técnicos de acústica
    estão atualmente em conversações
  • 18:07 - 18:14
    com pessoas com problemas auditivos,
    e que são participantes do som.
  • 18:15 - 18:16
    Isto é muito interessante.
  • 18:16 - 18:21
    Não posso dar-vos pormenores
  • 18:21 - 18:24
    do que está a acontecer com essas salas,
  • 18:24 - 18:28
    mas o facto de que eles estarem
    a ajudar um grupo de pessoas
  • 18:28 - 18:32
    de quem se disse durante tantos anos:
  • 18:32 - 18:36
    "Como diabo podem eles ouvir música?
    Eles são surdos!"
  • 18:36 - 18:40
    Nós fazemos isto, e imaginamos
    que a surdez é isto.
  • 18:40 - 18:42
    Ou fazemos isto, e imaginamos
    que a cegueira é assim.
  • 18:42 - 18:46
    Se vimos alguém numa cadeira de rodas,
    assumimos que não pode andar.
  • 18:46 - 18:50
    Pode ser que ele possa
    dar três, quatro, cinco passos.
  • 18:50 - 18:53
    Para ele, isso significa que pode andar.
  • 18:54 - 18:57
    Dentro de um ano, pode conseguir
    dar mais dois passos.
  • 18:57 - 19:00
    Mais outro ano, mais outros três passos.
  • 19:00 - 19:05
    Temos que pensar
    nestes aspetos muito importantes.
  • 19:05 - 19:09
    Quando nos escutarmos uns aos outros,
  • 19:09 - 19:14
    é extremamente importante
  • 19:14 - 19:17
    testar a nossa capacidade auditiva,
  • 19:17 - 19:22
    usar o corpo como uma caixa
    de ressonância, deixar de julgar.
  • 19:22 - 19:28
    Para mim, como músico que lida
    com 99% de música nova, é fácil dizer:
  • 19:28 - 19:32
    "Oh sim, gosto desta peça.
    "Oh não, não gosto desta peça." Etc.
  • 19:32 - 19:37
    Eu acho que tenho que dar
    tempo a essas músicas.
  • 19:37 - 19:42
    Talvez a química não esteja lá muito certa
    entre mim e uma determinada música,
  • 19:42 - 19:47
    mas isso não significa que tenho
    o direito de dizer que é má música.
  • 19:47 - 19:52
    Uma das ótimas coisas de ser músico,
  • 19:52 - 19:56
    é que é um fluido incrível.
  • 19:56 - 19:59
    Não há regras, nem certo ou errado.
  • 19:59 - 20:04
    Se eu vos pedir para baterem palmas
  • 20:04 - 20:06
    — talvez possa fazê-lo — se eu disser:
  • 20:06 - 20:11
    "Batam palmas e criem o som de um trovão".
  • 20:12 - 20:15
    Parto do princípio que já todos
    conhecem o trovão.
  • 20:15 - 20:17
    Não me refiro apenas ao som.
  • 20:17 - 20:22
    Refiro-me a escutar esse trovão
    dentro de nós mesmos.
  • 20:22 - 20:26
    Por favor, tentem criar isso com palmas.
    Tentem, por favor.
  • 20:26 - 20:30
    (Palmas)
  • 20:33 - 20:35
    Muito bem!
  • 20:35 - 20:39
    Neve.
  • 20:40 - 20:43
    (Palmas)
  • 20:42 - 20:44
    Já ouviram a neve?
  • 20:44 - 20:45
    Audiência: Não.
  • 20:45 - 20:47
    Bom, então deixem de bater palmas.
  • 20:47 - 20:49
    (Risos)
  • 20:49 - 20:52
    Voltem a tentar. Neve.
  • 20:56 - 20:58
    Veem? Vocês estão acordados.
  • 20:59 - 21:00
    Chuva.
  • 21:04 - 21:06
    Nada mal. Nada mal.
  • 21:07 - 21:11
    Mas aqui o interessante é que
    fiz a mesma pergunta
  • 21:11 - 21:16
    a um grupo de miúdos,
    há pouco tempo.
  • 21:18 - 21:19
    Ótima imaginação, muito obrigado.
  • 21:19 - 21:23
    Mas nenhum de vocês
    saiu do vosso lugar para pensar.
  • 21:23 - 21:25
    Como posso bater palmas? Ok, talvez...
  • 21:25 - 21:28
    (Palmas)
  • 21:28 - 21:30
    Talvez possa usar as minhas joias
    para criar sons extra.
  • 21:31 - 21:34
    Talvez possa usar outras partes do corpo
    para criar sons extra.
  • 21:35 - 21:40
    Nenhum de vocês pensou em bater as palmas
    de modo ligeiramente diferente
  • 21:40 - 21:43
    para além de estarem aí sentados
    e usarem as duas mãos.
  • 21:43 - 21:46
    Do mesmo modo, quando escutamos música,
  • 21:46 - 21:49
    partimos do princípio de que tudo
    é alimentado por aqui,
  • 21:49 - 21:53
    que é assim que sentimos a música.
    Claro que não.
  • 21:54 - 21:57
    Sentimos o trovão — trovão.
    Pensem, pensem.
  • 21:57 - 22:00
    Escutem, escutem, escutem.
  • 22:02 - 22:04
    O que é que podemos
    fazer com o trovão?
  • 22:04 - 22:10
    Recordo-me do meu professor,
    quando comecei a minha primeira lição,
  • 22:10 - 22:13
    eu estava preparada com as baquetas,
    pronta pra começar.
  • 22:13 - 22:17
    Ele, em vez de dizer: "Evelyn,
    pés ligeiramente afastados,
  • 22:18 - 22:23
    "braços a cerca de 90 graus,
    baquetas em forma de V,
  • 22:24 - 22:27
    "mantém este espaço aqui, etc.
  • 22:27 - 22:30
    "Endireita as costas, etc., etc."
  • 22:30 - 22:34
    altura em que eu, provavelmente,
    já estaria totalmente rígida e congelada,
  • 22:34 - 22:35
    e não conseguiria bater no tambor,
  • 22:35 - 22:38
    porque estava a pensar
    em muitas outras coisas, ele disse:
  • 22:38 - 22:42
    "Evelyn, põe esse tambor de lado
    durante sete dias e até para a semana".
  • 22:43 - 22:47
    Céus! Que havia eu de fazer?
    Já não precisava das baquetas,
  • 22:47 - 22:50
    não me permitiam usar as baquetas.
  • 22:50 - 22:53
    Tinha que olhar
    para aquele tambor em especial,
  • 22:53 - 22:58
    ver de que era feito, as linguetas
    que tinha, o que faziam as esteiras.
  • 22:58 - 23:01
    Virá-lo de pernas para o ar,
    experimentar com a caixa,
  • 23:03 - 23:04
    Experimentar com a membrana,
  • 23:06 - 23:07
    experimentar com o corpo,
  • 23:09 - 23:11
    experimentar com as joias.
  • 23:11 - 23:14
    experimentar com todo o tipo de coisas.
  • 23:24 - 23:28
    Claro que acabei com todo o tipo
    de nódoas negras e coisas dessas...
  • 23:27 - 23:29
    (Risos)
  • 23:29 - 23:31
    ... mas foi uma experiência incrível,
  • 23:31 - 23:35
    porque, onde diabos podemos experimentar
    essas coisas numa música?
  • 23:36 - 23:40
    Onde diabos podemos experimentar
    essas coisas numa cabina de som?
  • 23:40 - 23:43
    Nós nunca, mas nunca,
    lidámos com manuais de estudo.
  • 23:44 - 23:46
    Por exemplo, uma das coisas que aprendemos
  • 23:46 - 23:51
    quando queremos ser um músico de percussão,
    em oposição a um músico,
  • 23:51 - 23:55
    é uma sequência de golpes simples
    e precisos
  • 24:00 - 24:05
    Assim. Depois vamos um pouco mais depressa,
    cada vez mais depressa. Etc. etc.
  • 24:08 - 24:10
    O que é que esta música exige?
  • 24:14 - 24:18
    Porque é que eu não posso fazer isso
    enquanto aprendo uma música?
  • 24:18 - 24:20
    Foi exatamente o que ele fez.
  • 24:21 - 24:25
    Interessantemente, enquanto crescia,
    quando passei a estudante a tempo inteiro,
  • 24:25 - 24:31
    na chamada "instituição de música",
    tudo isso voou pela janela.
  • 24:31 - 24:34
    Tínhamos que estudar por manuais.
  • 24:34 - 24:36
    E, constantemente, a pergunta:
  • 24:36 - 24:38
    "Porquê? Porquê?
    Com que é que isso está ligado?"
  • 24:38 - 24:42
    Preciso de aprender a tocar uma música.
    "Ok, isto vai melhorar o teu controlo".
  • 24:42 - 24:46
    "Como? Porque é que tenho de aprender isso?
    Preciso de o ligar a uma música".
  • 24:46 - 24:49
    Eu tinha que dizer qualquer coisa.
  • 24:49 - 24:52
    "Porque é que estou
    a praticar 'paradiddles'?
  • 24:55 - 25:00
    "É apenas para controlo das baquetas?
    Porque é que estou a fazer isto?
  • 25:01 - 25:03
    "Preciso de ter um motivo
  • 25:03 - 25:08
    "e o motivo tem que ser dizendo
    qualquer coisa através da música".
  • 25:08 - 25:13
    Dizendo qualquer coisa através da música,
    que é sobretudo som,
  • 25:13 - 25:18
    podemos chegar a todo o tipo de coisas,
    a todo o tipo de pessoas.
  • 25:17 - 25:22
    Mas não quero assumir a responsabilidade
    pela vossa bagagem emotiva.
  • 25:22 - 25:24
    Isso é convosco, quando entram numa sala.
  • 25:24 - 25:29
    Porque isso determina o quê e como
    vocês escutam certas coisas.
  • 25:29 - 25:34
    Posso estar triste, ou feliz,
    ou radiante, ou irritado,
  • 25:34 - 25:38
    quando toco certas músicas,
    mas não estou à espera
  • 25:38 - 25:41
    que vocês sintam
    exatamente a mesma coisa.
  • 25:41 - 25:44
    Por isso, da próxima vez
    que forem a um concerto,
  • 25:44 - 25:48
    deixem o vosso corpo abrir-se,
  • 25:48 - 25:51
    deixem que o vosso corpo
    seja uma caixa de ressonância.
  • 25:51 - 25:56
    Não se esqueçam de que não vão sentir
    o mesmo que o intérprete sente.
  • 25:56 - 26:00
    O intérprete está na pior posição
    possível para o som,
  • 26:00 - 26:04
    porque está a ouvir
    o contacto da baqueta no tambor,
  • 26:06 - 26:10
    ou o malho no pedaço de madeira,
    ou o arco na corda, etc.
  • 26:10 - 26:14
    ou a respiração que está a criar o som
    dos instrumentos de sopro e dos cobres.
  • 26:14 - 26:17
    Eles, ali, sentem essas coisas naturais.
  • 26:17 - 26:20
    Mas estão a sentir uma coisa
    incrivelmente pura,
  • 26:20 - 26:24
    que é antes de o som acontecer.
  • 26:24 - 26:31
    Reparem como se puxa pela vida do som
    depois do impacto ou do sopro iniciais.
  • 26:34 - 26:38
    Sintam todo o percurso desse som
  • 26:38 - 26:42
    da mesma forma que eu gostaria
    de ter sentido todo o percurso
  • 26:42 - 26:45
    desta conferência, em vez de ter chegado
    apenas a noite passada.
  • 26:46 - 26:50
    Espero que talvez possamos partilhar
    uma ou duas coisas durante o dia.
  • 26:51 - 26:54
    Muito obrigada por me receberem!
  • 26:54 - 26:57
    (Aplausos)
Title:
Como ouvir com atenção.
Speaker:
Evelyn Glennie
Description:

Nesta demonstração em crescendo, a percussionista surda Evelyn Glennie ilustra como ouvir música envolve muito mais que deixar as ondas sonoras incidir nos tímpanos.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
31:51
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