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Title:
Não estamos sozinhos na nossa solidão
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Description:
Estar aberto e vulnerável na nossa solidão, tristeza e medo pode-nos ajudar a encontrar o nosso conforto e a sentirmo-nos menos sozinhos, diz o artista e escritor Jonny Sun. Numa conversa honesta, recheada com as suas típicas ilustrações, Sun fala-nos de como contar histórias sobre sentir-se um forasteiro o ajudaram a descobrir uma comunidade inesperada e a encontrar uma luz ao fim do túnel.
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Speaker:
Jonny Sun
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Olá!
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Gostava de vos apresentar a uma pessoa.
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Este é o Jomny.
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Igual a "Jonny" mas escrito
acidentalmente com um "m",
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caso se sintam curiosos,
porque não somos todos perfeitos.
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O Jomny é um extraterrestre
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que foi enviado à terra com a missão
de estudar os seres humanos.
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O Jomny sente-se perdido,
sozinho e longe de casa.
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Penso que já todos nos sentimos assim.
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Pelo menos eu já.
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Eu escrevi esta história
sobre este extraterrestre
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num momento da minha vida
em que me sentia como um deles.
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Tinha acabado de ir para Cambridge
e começado o meu doutoramento no MIT.
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Estava a sentir-me intimidado e isolado,
como se não pertencesse ali.
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Mas tinha uma espécie
de tábua de salvação.
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Eu escrevia piadas há anos e anos
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e partilhava-as nas redes sociais.
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Percebi que estava a começar
a fazê-lo cada vez mais.
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Para muitas pessoas, a Internet
pode ser um sítio solitário.
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Pode parecer isto,
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um enorme vazio, interminável e expansivo
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em que estamos sempre a chamar alguém
mas ninguém nos ouve.
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No entanto, encontrei algum conforto
ao falar para o vazio.
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Descobri que, ao partilhar
os meus sentimentos com o vazio,
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por fim, o vazio começou a responder.
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Afinal, o vazio não é de todo
uma vastidão interminável e solitária,
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mas está cheio de todo o tipo
de outras pessoas,
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que também o encaram
e querem ser ouvidas.
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É verdade que muitas coisas más
têm surgido das redes sociais.
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Não estou a tentar negar isso.
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Estar na Internet, a certa altura,
é sentir muita tristeza,
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fúria e violência.
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Pode parecer-nos o fim do mundo.
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Mas, ao mesmo tempo,
entro em conflito,
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porque não posso negar o facto de que
muitos dos meus amigos mais próximos
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são pessoas que eu conheci
inicialmente na Internet.
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Acho que, em parte, isso é
porque há uma natureza de confissão
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nas redes sociais.
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Pode parecer que estamos a escrever
um diário íntimo, pessoal,
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que é completamente privado,
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mas, ao mesmo tempo, queremos
que toda a gente no mundo o leia.
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Acho que, em parte, a alegria disso
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é que podemos vivenciar as coisas
na perspetiva de outras pessoas
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que são totalmente diferentes de nós
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e, por vezes, isso é uma coisa boa.
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Por exemplo, quando eu criei um "Twitter"
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percebi que muitas das pessoas
que eu seguia
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falavam de saúde mental e de fazer terapia
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de uma forma que não tinha
o estigma que normalmente há,
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quando falamos destes problemas
cara a cara.
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Através deles, a conversa que rodeava
a saúde mental era normalizada
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e ajudaram-me a perceber
que ir ao psicólogo
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era uma coisa que também me iria ajudar.
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parece ser uma ideia assustadora
falar sobre estes tópicos
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tão pública e abertamente na Internet.
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Sinto que muitas pessoas pensam
que é algo grande e assustador,
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estar na Internet se não estivermos
desde logo perfeitamente formados.
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Mas eu acho que a Internet pode ser
um ótimo lugar para não se saber
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e acho que podemos ver isso
com entusiasmo,
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porque, para mim, há algo importante
na partilha das nossas imperfeições,
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das nossas inseguranças
e das nossas vulnerabilidades
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com outras pessoas.
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Quando alguém partilha
que se sente triste ou com medo
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ou sozinho, por exemplo,
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faz-me sentir menos sozinho,
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não por me livrar
de qualquer solidão minha
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mas por me mostrar que não só eu
que me sinto sozinho.
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Enquanto escritor e artista,
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é muito importante para mim
ter este conforto de ser vulnerável,
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algo comum que podemos partilhar
uns com os outros.
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Entusiasma-me exteriorizar o interior,
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pegar nos sentimentos invisíveis
pessoais que não sei pôr em palavras,
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expô-los a uma outra luz,
associar-lhes palavras
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e depois partilhá-los com outras pessoas,
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na esperança de poder ajudá-las
a encontrar palavras para o que sentem.
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Eu sei que isto parece ser
uma coisa importante,
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mas, no fundo, estou interessado
em pôr tudo isto
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em caixas, pequenas e acessíveis,
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porque podemos escondê-lo
nestas peças mais pequenas.
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Acho que são mais fáceis de aceder,
são mais divertidas,
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podem ajudar-nos mais facilmente
a ver a nossa humanidade comum
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Às vezes é através de uma pequena história
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outras vezes, é um livro
com ilustrações giras, por exemplo.
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E, às vezes, vem sob a forma
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de uma piada parva que coloco na Internet.
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Por exemplo, há uns meses,
publiquei uma ideia de uma aplicação
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para um serviço de passear o cão
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em que um cão aparece à nossa porta
e temos de sair de casa
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e dar um passeio.
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Se há por aqui programadores
de aplicações no público,
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por favor venham ter comigo no final.
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Também gosto de partilhar sempre que
me sinto ansioso ao mandar um "email"
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Quando o assino "o melhor",
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é como quem diz
"estou a fazer o meu melhor"
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um resumo para "Por favor não me odeie,
prometo que estou a fazer o meu melhor!"
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Ou a minha resposta
ao clássico quebra-gelo,
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se pudesse jantar com alguém,
vivo ou morto, eu jantava...
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sinto-me muito sozinho.
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Chego à conclusão de que,
quando publico estas coisas "online",
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a reação é muito semelhante.
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As pessoas juntam-se
para partilhar uns risos,
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para partilhar esse sentimento
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e depois dispersam-se rapidamente.
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Sim, deixando-me sozinho de novo.
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Mas acho que estas pequenas reuniões
podem ser muito significativas.
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Por exemplo, quando me licenciei
em arquitetura
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e me mudei para Cambridge
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publiquei esta pergunta:
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"Com quantas pessoas na vossa vida
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"já tiveram a vossa última conversa?"
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Eu estava a pensar nos meus amigos
que se tinham mudado
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para cidades diferentes
e até para diferentes países
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e o quão difícil me seria
manter o contacto com eles.
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Mas outras pessoas começaram a responder
e a partilhar as suas experiências.
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Houve uma pessoa que falou
de um familiar com quem estava zangado.
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Outra pessoa falou sobre
um ente querido que morrera,
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rápida e inesperadamente.
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Outra pessoa falou
dos seus amigos da escola
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que também se tinham mudado.
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Mas depois algo de muito bom
começou a acontecer.
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Em vez de simplesmente me responderem,
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começaram a responder-se uns aos outros,
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e a falarem e partilharem
as suas experiências
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e a confortarem-se uns aos outros,
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a encorajarem-se uns aos outros
a contactar esse amigo
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com quem já não falavam
há algum tempo,
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ou aquele familiar
com quem se tinha zangado .
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Por fim, criámos esta pequena
microcomunidade.
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Foi como um grupo de apoio
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formado por todo o tipo
de pessoas que se juntaram.
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Acho que, de cada vez
que publicamos "online",
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sempre que o fazemos,
há a hipótese de se formarem
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estas pequenas microcomunidades.
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Há a hipótese de todo o tipo
de estas criaturas diferentes
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se juntarem e se unirem.
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Por vezes, no meio
da confusão da Internet,
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conseguimos encontrar uma alma gémea.
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Às vezes é ao ler as respostas
e as secções dos comentários
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que encontramos uma resposta
que é particularmente gentil
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ou perspicaz ou engraçada.
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Por vezes, é ao seguir alguém
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e reparar que eles também já nos seguem.
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Ou às vezes é ao olhar para alguém
que já conhecemos na vida real.
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ver as coisas que escrevemos
e que eles escrevem
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e perceber que partilhamos
muitos dos seus interesses,
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e isso aproxima-os de nós.
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Às vezes, se tivermos sorte,
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temos a oportunidade
de conhecer outro extraterrestre.
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[Quando dois extraterrestres
se encontram
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[um sítio estranho torna-se um lar]
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Mas preocupa-me, porque a Internet
no geral, não se parece com isto.
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Todos sabemos que, na maior parte,
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a Internet parece um lugar
onde nos compreendemos mal,
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onde entramos em conflito
uns com os outros,
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[- Não roubes os meus ramos.
- São para minha casa.]
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onde há todo o tipo
de confusões, ee gritos e berros
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e parece que há demasiado de tudo.
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Parece um caos
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e não sei como substituir
as partes más pelas boas,
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porque todos nós sabemos e vimos,
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que as partes más podem-nos
magoar mesmo muito.
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Parece-me que as plataformas que usamos
para habitar estes espaços "online"
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foram construídas de forma ignorante
ou intencionalmente
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para permitir o assédio e o abuso,
para propagar a desinformação,
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para permitir o ódio e discurso de ódio
e a violência que isso gera.
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Parece que nenhuma das plataformas
que usamos atualmente
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faz o suficiente para abordar
ou resolver isso.
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Mas mesmo assim, e talvez infelizmente,
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continuo a ser atraído a estes espaços
"online", tal como muitos outros
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porque, por vezes, parece
que é aí que está toda a gente.
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Eu sinto-me idiota
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e estúpido, às vezes,
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por valorizar estes pequenos momentos
de conexão humana em tempos como estes.
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Mas sempre funcionei
de acordo com a ideia
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de que estes pequenos momentos
de humanidade não são supérfluos.
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Nunca são retiros do mundo,
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mas sim as razões pelas quais
vamos a estes espaços.
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São importantes e vitais,
afirmam e dão-nos vida.
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São santuários pequenos e temporários
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que nos mostram que não estamos
tão sozinhos como achamos.
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Então, apesar de a vida ser má
e de todos estarem tristes
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e um dia irmos todos morrer
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[É assim. a vida é má.
todos estão tristes.
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[Vamos todos morrer, mas eu
já comprei um castelo insuflável.
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[Portanto, tiras os sapatos ou não?]
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Acho que o castelo insuflável,
metafórico neste caso,
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é as nossas relações
e a conexão com outras pessoas.
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Então, numa noite
em que me estava a sentir
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particularmente triste
e desesperado neste mundo,
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gritei para o vazio,
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para a escuridão solitária.
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E disse: "Neste momento,
ir às redes sociais
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"é como dar a mão a alguém
durante o fim do mundo."
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Desta vez, em vez de o vazio responder,
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foram pessoas que apareceram,
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que começaram a responder-me
e a falar uns com os outros.
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Devagar, formou-se
esta pequena comunidade.
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Toda a gente se juntou para dar as mãos.
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E nestes tempos perigosos e de incerteza,
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no meio de tudo isso,
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acho que tudo o que temos
como apoio são as pessoas.
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Sei que é uma pequena coisa
feita de pequenos momentos,
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mas acho que é um feixe de luz,
pequeno e minúsculo
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em toda a escuridão.
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