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Title:
O que acontece depois de desenvolvermos uma vacina contra a COVID-19?
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Description:
Uma vacina eficaz contra a COVID-19 é apenas o primeiro passo para acabar com a pandemia, diz Johanna Benesty, estrategista em saúde global. Nesta palestra esclarecedora, ela explora as várias barreiras ao "acesso justo" - garantir que o tratamento para a COVID-19 esteja disponível para todos - e compartilha uma abordagem criativa para pesquisa e desenvolvimento que podem assegurar que as vacinas sejam lançadas de forma justa, eficiente e em escala global.
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Speaker:
Johanna Benesty
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Meu filho nasceu em janeiro de 2020,
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pouco antes do isolamento total em Paris.
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Ele nunca teve medo
de pessoas com máscaras,
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porque é tudo o que ele conhece.
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Minha filha de três anos
sabe dizer "gel hydro-alcoolique",
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ou gel hidroalcoólico, em francês.
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Na verdade, a pronúncia dela
é melhor que a minha.
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Mas ninguém quer usar máscara
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ou lavar as mãos com higienizador
a cada 20 segundos.
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Estamos todos desesperados
para que pesquisadores achem uma solução:
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uma vacina.
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É interessante que, em nossa mente,
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continuamos pensando na descoberta
da vacina como se fosse o Santo Graal.
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Mas há alguns atalhos aqui
que eu gostaria de explicar.
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Não sou médica, sou apenas consultora.
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Meus clientes são da área da saúde,
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empresas biofarmacêuticas, fornecedores,
instituições globais de saúde,
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e eles me ensinaram.
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Precisamos encontrar as ferramentas
para combater a COVID
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e torná-las acessíveis a todos.
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Primeiro: uma única vacina
não nos livrará desta situação.
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Precisamos de um arsenal de ferramentas,
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vacinas, tratamentos, diagnósticos,
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para garantir que possamos impedir,
identificar e tratar casos de COVID
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em diversas populações.
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Segundo: não se trata apenas
de encontrar uma ferramenta.
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O que vai acontecer
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quando um desses ensaios clínicos
demonstrar que a ferramenta é eficaz?
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Você acha que podemos
correr para a farmácia,
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conseguir o produto, tirar a máscara
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e voltar a beijar?
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Não.
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A descoberta de uma ferramenta eficaz
é apenas um passo nesta luta importante,
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pois há uma diferença
entre a existência de um produto
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e o acesso a ele.
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Você deve estar pensando:
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"Ah, ela quer dizer
que outros países terão de esperar".
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Não, não penso dessa forma.
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Não só os outros podem ter de esperar,
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mas qualquer um de nós.
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O aspecto desagradável da COVID
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é que, devido à velocidade
e à magnitude da doença,
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ela expõe todos nós aos mesmos desafios
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e nos apresenta desafios
aos quais não estamos acostumados.
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Lembra-se de quando a China
entrou em isolamento total?
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Você imaginava que estaria
na mesma situação
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algumas semanas depois?
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Com certeza, eu não imaginava.
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Vamos para o momento teórico
em que temos uma vacina.
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Nesse caso, o próximo desafio
de acesso será o estoque.
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A estimativa atual da comunidade global
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é que, até o final de 2021,
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ou seja, mais de um ano
após a descoberta da vacina,
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teríamos doses suficientes
para cobrir de 1 a 2 bilhões
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dos 8 bilhões de habitantes do planeta.
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Então, quem terá de esperar?
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Como consideramos o acesso
quando o estoque é insuficiente?
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deixamos as forças do mercado agirem,
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e quem pode pagar o preço mais alto
ou ser o mais rápido em fazer acordos
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terá acesso ao produto primeiro.
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Não é nada justo,
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mas é um cenário muito provável.
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poderíamos concordar,
com base na lógica da saúde pública,
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em quem obtém o produto primeiro.
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Digamos que profissionais de saúde
recebam primeiro,
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depois os idosos
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e, em seguida, a população em geral.
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Agora, vou ser um pouco mais provocativa.
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Terceiro cenário:
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os países que demonstraram
que conseguem administrar bem a pandemia
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teriam acesso ao produto primeiro.
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Pode ultrapassar os limites do bom senso,
mas não é totalmente ficção científica.
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Anos atrás,
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quando o estoque de medicamentos
para tuberculose era escasso,
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foi estabelecido um comitê especial
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para determinar quais países tinham
sistemas de saúde sólidos o bastante
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para garantir que os produtos
fossem distribuídos de forma adequada
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e que os pacientes seguissem
o tratamento corretamente.
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Os países selecionados
tiveram acesso primeiro.
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decidiríamos por uma regra aleatória,
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por exemplo, que as pessoas
fossem vacinadas no aniversário delas.
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Agora, vou fazer uma pergunta:
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como seria pensar num futuro
em que a vacina existisse,
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mas você ainda tivesse de usar máscara,
manter seus filhos fora da escola
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e não pudesse trabalhar do modo desejado
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por não ter acesso a esse produto?
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Cada dia que passasse
pareceria inaceitável, não é mesmo?
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Mas veja só!
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Temos tratamentos e até curas
para muitas doenças,
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mas, mesmo assim, as pessoas continuam
sendo infectadas e morrendo todos os anos.
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10 milhões de pessoas infectadas todo ano,
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1,5 milhão de mortes,
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embora tenhamos a cura há anos.
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Isso só ocorre porque ainda
não descobrimos completamente
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alguns dos principais problemas de acesso.
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Acesso justo é a coisa certa a se fazer,
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mas, além desse argumento humanitário,
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ao qual espero estarmos mais sensíveis
agora que sentimos o problema na pele,
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há um argumento econômico e de saúde
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para o acesso justo.
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O argumento de saúde é
que, enquanto o vírus permanecer ativo,
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todos nós corremos o risco
de ter casos reimportados.
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O argumento econômico
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é que, devido ao fato de as economias
serem dependentes entre si,
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a economia de nenhuma nação
pode recomeçar totalmente
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se as demais também
não estiverem melhorando.
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Pense nos setores
que dependem da mobilidade global,
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como o aeroespacial, de viagens e turismo;
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nas cadeias de abastecimento
que se espalham pelo mundo,
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como têxteis ou automotivas;
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na parcela do crescimento econômico
proveniente dos mercados emergentes.
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A realidade é que precisamos
que todos os países
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consigam acabar
com a pandemia em sincronia.
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Portanto, o acesso justo
não é apenas a coisa certa a se fazer,
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mas também a mais inteligente.
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Mas como nós fazemos isso?
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Vamos garantir que estamos alinhados
com o significado de "acesso".
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Na verdade, significaria
que o produto existe,
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funciona suficientemente bem,
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foi aprovado pelas autoridades locais,
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é acessível,
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mas também que há evidências
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de que funciona em todas as populações
que necessitam dele,
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inclusive gestantes,
imunodeprimidos ou crianças;
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que pode ser distribuído
em diversos ambientes,
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como hospitais ou clínicas rurais,
de clima quente ou frio;
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e que podemos produzi-lo na escala certa.
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Sei que é uma lista
muito longa de verificação
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e, em uma situação sem crise,
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talvez resolvêssemos esses problemas
um após o outro, de forma sequencial,
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o que levaria muito tempo.
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Então, o que fazemos?
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O acesso está longe de ser um desafio novo
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e, no caso da COVID,
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tenho de dizer que estamos vendo
uma colaboração extraordinária
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de organizações internacionais,
sociedade civil, indústria e outros
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para acelerar o acesso:
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execução de coisas em paralelo,
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aceleração de processos regulatórios,
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planejamento para o fornecimento,
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garantia de obtenção,
mobilização de recursos, etc.
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No entanto, é provável que enfrentemos
uma situação em que, por exemplo,
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a vacina precisasse ser
constantemente armazenada
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a, digamos, menos 80 ºC;
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ou em que o tratamento
tivesse de ser administrado
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por um profissional de saúde
altamente especializado;
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ou em que o diagnóstico
precisasse ser analisado
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por um laboratório sofisticado.
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Então, o que mais podemos fazer?
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Levando adiante a lógica
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que a comunidade global de saúde
vem defendendo há anos,
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consigo pensar em mais uma coisa
que pode ajudar.
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Há um conceito em desenvolvimento
e fabricação de produtos
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chamado "projeto para custo".
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A ideia básica é que a conversa
sobre gerenciamento de custos
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aconteça ao mesmo tempo
em que o produto é projetado,
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em vez de o produto ser projetado primeiro
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e depois retrabalhado
para reduzir o custo.
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É um método simples que ajuda a garantir
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que, ao ser identificado como um critério
de prioridade para um produto,
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o custo se torne uma meta
desde o primeiro dia.
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Agora, no contexto de saúde e acesso,
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acho que há um potencial inexplorado
em P&D para o acesso,
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da mesma forma que os fabricantes
projetam para o custo.
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Isso significaria que, em vez
de desenvolver um produto
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e, em seguida, trabalhar para adaptá-lo
para garantir acesso justo posteriormente,
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todos os itens da lista que mencionei
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seriam incorporados
ao processo de P&D desde o início,
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e isso, na verdade,
beneficiaria todos nós.
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Se desenvolvermos um produto
com acesso justo em mente,
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podemos otimizar o processo
de planejamento mais rapidamente.
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Em minha experiência,
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o foco dos desenvolvedores de medicamentos
é achar uma dose que funcione,
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e só depois a dosagem é otimizada
ou são feitos ajustes.
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Agora imagine que se trata
de um produto candidato
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para o qual o ingrediente ativo
seja um recurso escasso.
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E se, em vez disso, nos concentrássemos
em desenvolver um tratamento
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que use a menor quantidade possível
desse ingrediente ativo?
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Isso pode nos ajudar
a produzir mais doses.
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Se desenvolvermos um produto
com acesso justo em mente,
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podemos otimizar para distribuição
em massa mais rapidamente.
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Em países de alta renda,
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os sistemas de saúde
têm capacidade sólida.
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Podemos sempre distribuir
os produtos como quisermos.
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Achamos natural que eles sejam armazenados
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em ambientes com temperatura controlada
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ou requeiram um profissional de saúde
altamente qualificado para administrá-los.
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Obviamente, ambientes controlados
e profissionais altamente qualificados
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não estão disponíveis em toda parte.
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Se fôssemos abordar P&D
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com as restrições de sistemas de saúde
mais deficientes em mente,
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poderíamos ser criativos
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e desenvolver mais cedo, por exemplo,
produtos não afetados pela temperatura
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ou que pudessem ser ingeridos
tão facilmente como uma vitamina
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ou formulações de longa duração
em vez de doses repetidas.
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Se conseguíssemos produzir e desenvolver
tais ferramentas simplificadas,
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teríamos o benefício adicional
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de colocar menos pressão
sobre hospitais e sistemas de saúde
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tanto para países de alta
como de baixa renda.
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Dada a velocidade do vírus
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e a magnitude das consequências
que enfrentamos,
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acho que temos de continuar nos desafiando
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para achar o modo mais rápido
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de tornar produtos para combater a COVID
e futuras pandemias acessíveis a todos.
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a menos que o vírus desapareça,
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essa história termina de duas maneiras.
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Ou a balança se inclina para um lado,
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apenas alguns de nós
têm acesso ao produto,
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e a COVID permanece
uma ameaça para todos nós;
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ou equilibramos a balança,
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e todos nós temos acesso às armas certas
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e seguimos em frente juntos.
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Um P&D inovador não consegue
vencer a COVID sozinho,
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mas um gerenciamento inovador
de P&D pode ajudar.
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