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Title:
Por que seu médico precisa da sua ajuda para combater o excesso de tratamento | Christer Mjåset | TEDxOslo
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Description:
A palestra de Christer Mjåset aborda um dos maiores problemas da medicina ocidental: o excesso de tratamento. Embora os médicos se baseiem em padrões e recomendações na medicina em todos os níveis, variações no uso de ferramentas diagnósticas e tratamentos é um fenômeno generalizado. O que você pode fazer enquanto paciente para combater o excesso de tratamento e como pode se beneficiar ao encarar o assunto com a devida seriedade?
Christer Mjåset é neurocirurgião e vice-presidente da Norwegian Medical Association (Associação Médica Norueguesa). É autor de cinco livros e conferencista experiente em diferentes temas da medicina.
Esta palestra foi dada em um evento TEDx, que usa o formato de conferência TED, mas é organizado de forma independente por uma comunidade local. Para saber mais, visite http://ted.com/tedx
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Sou neurocirurgião
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e estou aqui hoje para dizer que pessoas
como eu precisam de sua ajuda.
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E em alguns instantes, eu direi como.
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Mas primeiro, vou começar contando
sobre uma paciente minha.
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Ela era uma mulher na faixa dos 50 anos,
em boa forma, de maneira geral,
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mas tinha sido hospitalizada algumas vezes
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devido ao tratamento que a curou
do câncer de mama.
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Agora, ela apresentava uma hérnia de disco
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que causava dor intensa
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que irradiava para o braço direito.
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Examinando a ressonância magnética antes
da consulta, eu decidi sugerir cirurgia.
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Cirurgias no pescoço, como essa,
são padronizadas e rápidas,
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mas apresentam um certo risco.
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Você faz uma incisão bem aqui
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e afasta cuidadosamente
a traqueia, o esôfago,
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e tenta não cortar
a artéria carótida interna.
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Depois você pega o microscópio
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e cuidadosamente remove o disco
e o prolapso no canal do nervo
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sem danificar a medula e a raiz do nervo,
que estão apenas alguns milímetros abaixo.
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A pior das hipóteses é o dano à medula,
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que pode resultar em paralisia
do pescoço para baixo.
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Quando expliquei à paciente,
ela ficou em silêncio.
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E instantes depois,
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ela disse algumas poucas palavras
que foram decisivas para mim e para ela.
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"Doutor, isso é mesmo necessário?"
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E sabem o que percebi naquele momento?
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Que não era.
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Na verdade, quando atendo
pacientes como essa mulher,
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normalmente aconselho a não operar.
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Então o que me fez aconselhar
a cirurgia dessa vez?
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Bem, essa hérnia era tão delicada
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que eu quase podia me ver
tirando-a do canal do nervo
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antes da paciente entrar no consultório.
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Eu admito, eu queria operá-la.
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Eu adoraria operá-la.
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Afinal, cirurgias como essa são a parte
mais divertida do meu trabalho.
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Acho que vocês conseguem
se identificar com isso.
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Meu vizinho arquiteto diz
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que ama se sentar para desenhar
e projetar casas.
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Ele preferiria fazer isso o dia todo
do que conversar com o cliente
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que está pagando pela casa,
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o qual pode até impor
restrições sobre o que fazer.
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Mas assim como os arquitetos,
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todo cirurgião precisa olhar
o paciente nos olhos e juntos
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decidirem o que é melhor
para a pessoa a ser operada.
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E isso pode soar fácil,
mas vejamos algumas estatísticas.
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As amígdalas são dois caroços
na parte de trás da garganta;
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elas podem ser removidas cirurgicamente,
isso se chama tonsilectomia.
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Esse gráfico mostra a taxa
de tonsilectomias na Noruega,
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em diferentes regiões.
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O que chama atenção é que há duas
vezes mais chances de que seu filho,
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essa é uma cirurgia para crianças,
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sofra uma tonsilectomia
em Finnmark do que em Trondheim.
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A indicação para cirurgia é a mesma
em ambas as regiões.
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Não deveria haver diferença
nas taxas, mas há.
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Aqui temos um outro gráfico.
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O menisco ajuda a estabilizar o joelho
e pode ser lesionado ou rompido,
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geralmente durante a prática
de esportes, como futebol.
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Vemos aqui a taxa de operação
para essa lesão,
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e uma taxa de cirurgia em Møre og Romsdal
cinco vezes maior do que em Stavanger.
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Cinco vezes.
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Como isso é possível?
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Será que jogadores de futebol
em Møre og Romsdal jogam mais sujo
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do que em outras regiões do país?
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(Risos)
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Provavelmente não.
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Adicionei mais informação.
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Agora temos os procedimentos
realizados em hospitais públicos,
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em azul claro.
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Os feitos em hospitais particulares
estão em verde claro.
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Há muita atividade nas clínicas privadas
de Møre og Romsdal, não é mesmo?
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O que isso indica?
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Possivelmente, uma motivação
econômica para tratar os pacientes.
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E tem mais.
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Pesquisas recentes mostram que não há
diferença entre o resultado do tratamento
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com fisioterapia regular
e com cirurgia do joelho.
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Ou seja, a maioria dos procedimentos
realizados no gráfico que mostrei
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poderia ter sido evitada,
até mesmo em Stavanger.
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O que estou tentando dizer?
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Apesar da maioria
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das indicações para tratamentos
serem padronizadas ao redor do mundo,
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há muitas variações desnecessárias
nas decisões de tratamento,
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especialmente no Ocidente.
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Algumas pessoas não estão recebendo
o tratamento de que precisam,
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mas um número ainda maior
está recebendo tratamento excessivo.
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"Doutor, isso é mesmo necessário?"
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Eu só ouvi essa pergunta uma única vez
durante minha carreira.
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Meus colegas dizem nunca terem ouvido
essas palavras de um paciente.
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E para mudar a perspectiva,
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com que frequência vocês acham
que ouvirão um "não" do médico
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se fizerem essa pergunta?
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Pesquisadores já investigaram isso
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e encontraram, aproximadamente,
a mesma taxa de negativas em toda parte,
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uma taxa de 30%.
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Ou seja, três em cada dez vezes,
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seu médico prescreve ou sugere algo
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que é completamente desnecessário.
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E sabem qual a razão alegada por eles?
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Pressão por parte do paciente.
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Em outras palavras, vocês.
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Vocês querem que algo seja feito.
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Uma vez, um amigo me pediu
aconselhamento médico.
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Ele pratica esportes,
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faz esqui cross-country no inverno,
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corrida no verão,
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mas estava sentindo dor nas costas
sempre que fazia jogging,
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uma dor tão forte
que ele teve de parar.
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Eu o examinei,
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questionei minuciosamente.
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Descobri que ele
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provavelmente tinha uma degeneração
de disco na parte inferior da coluna.
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O disco causava dor quando era comprimido.
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Ele já tinha trocado jogging por natação.
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Não havia muito a ser feito,
então eu disse:
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"Você precisa ser mais seletivo
no treinamento.
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Algumas atividades são boas para você,
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outras, não".
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Ele respondeu:
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"Quero uma ressonância da minha coluna".
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"Por que quer uma ressonância?"
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"Eu posso fazê-la de graça
pelo plano de saúde do trabalho."
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"Ora, por favor", disse eu;
afinal, era meu amigo.
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"Isso não é motivo."
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"Acho que seria bom ver como está
a situação nas minhas costas."
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"Quando você começou a fazer
diagnóstico de imagens?", perguntei.
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(Risos)
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"Confie em mim, você
não precisa de um exame."
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"Bom", ele disse, e depois completou:
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"Pode ser câncer".
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(Risos)
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Ele fez o exame, claro.
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E pelo plano de saúde do trabalho,
se consultou com outro colega meu,
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que falou sobre a degeneração de disco,
que não havia nada a ser feito,
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que ele deveria continuar
com a natação e parar o jogging.
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Depois, nos encontramos
de novo e ele disse:
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"Pelo menos, agora eu sei o que é".
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Mas vou fazer uma pergunta.
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E se todos vocês aqui com os mesmos
sintomas fizessem uma ressonância?
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E se todas as pessoas na Noruega
fizessem uma ressonância
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devido a dor esporádica nas costas?
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A lista de espera para ressonância
aumentaria quatro vezes ou mais.
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E vocês tomariam as vagas nessa lista
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de pessoas que realmente têm câncer.
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Um bom médico às vezes diz não,
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mas o paciente sensato também recusa,
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às vezes, uma oportunidade
de diagnóstico e tratamento.
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"Doutor, isso é mesmo necessário?"
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Sei que essa pode ser
uma pergunta difícil de se fazer.
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De fato, se voltarmos 50 anos,
isso seria até mesmo considerado rude.
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Se o médico tinha decidido o que fazer
com você, você simplesmente fazia.
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Uma colega minha,
que agora é clínica geral,
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foi enviada para um sanatório
para tuberculosos
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quando era pequena.
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Por seis meses.
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Foi um trauma terrível para ela.
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Mas tarde, já adulta, ela descobriu
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que seus exames de tuberculose
sempre deram negativo.
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O médico a mandou para o sanatório
baseado unicamente em uma falsa suspeita.
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Ninguém ousou ou sequer considerou
confrontá-lo a respeito.
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Nem mesmo os pais dela.
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Hoje, o ministro da Saúde da Noruega
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fala dos serviços de saúde para pacientes.
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O paciente deve receber aconselhamento
do médico sobre o que fazer.
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Isso é um grande progresso,
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mas também coloca mais
responsabilidade sobre vocês.
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Vocês precisam assumir o comando
junto com seu médico
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e decidir juntos qual caminho tomar.
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A próxima vez que estiverem
num consultório médico,
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quero que vocês perguntem:
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"Doutor, isso é mesmo necessário?"
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Percebam que, no caso de muitos pacientes,
a resposta seria "não".
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Mas também poderia haver
justificativa para cirurgia.
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Então, médicos, quais são os riscos
relacionados a essa operação?
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Entre 5% e 10% dos pacientes
apresentarão piora na dor.
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Entre 1% e 2% dos pacientes
apresentarão infecção na ferida
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ou hemorragia, que pode levar
a uma nova cirurgia.
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Desses pacientes, 0,5 % apresentará
rouquidão permanente,
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e alguns apresentarão redução da função
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do braço ou das pernas.
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"Doutor, há outras opções?"
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Sim, repouso e fisioterapia
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durante algum tempo podem
trazer recuperação plena.
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"E o que acontece se eu não fizer nada?"
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Isso não é recomendado, mas até
nesse caso há uma pequena chance
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de recuperação.
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Quatro perguntas simples.
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Considere isso a sua nova
caixa de ferramentas
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para nos ajudar.
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"Isso é realmente necessário?"
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"Quais são os riscos?"
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"Há outras opções?"
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"E o que acontece se eu não fizer nada?"
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Faça essas perguntas quando seu médico
pedir uma ressonância,
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prescrever antibióticos
ou sugerir uma cirurgia.
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As pequisas mostram
que um em cada cinco de vocês,
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20%,
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mudará de opinião quanto ao que fazer.
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E fazendo isso, vocês não apenas
tornarão sua vida mais fácil
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e provavelmente melhor,
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mas todo o setor de saúde
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será beneficiado com sua decisão.
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Obrigado.
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(Aplausos)