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O amor — Estão a fazê-lo mal

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    O que é o amor?
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    É um termo que tem sido difícil de definir
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    pois tem tido múltiplas aplicações.
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    Posso amar correr.
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    Posso amar um livro, um filme.
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    Posso amar escalopes.
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    Posso amar a minha mulher.
  • 0:19 - 0:22
    (Risos)
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    Mas há uma grande diferença
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    entre um escalope e a minha mulher,
    por exemplo.
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    Isto é, se eu valorizar o escalope,
  • 0:35 - 0:41
    o escalope, por outro lado,
    não me valoriza de volta.
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    No entanto, a minha mulher chama-me
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    a estrela da vida dela.
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    (Risos)
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    Logo, apenas outra consciência desejosa
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    me pode considerar um ser desejável.
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    Eu sei isso, é por isso que
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    o amor pode ser definido de uma forma
    mais precisa
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    como o desejo de ser desejado.
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    Daí o eterno problema do amor:
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    Como se tornar e manter-se desejável?
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    Um indivíduo costumava encontrar
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    a resposta para este problema
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    submetendo a sua vida às regras da comunidade.
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    Tínhamos um papel específico a desempenhar
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    de acordo com o género, idade,
  • 1:24 - 1:26
    estatuto social,
  • 1:26 - 1:28
    e apenas tínhamos que desempenhar
    o nosso papel
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    para sermos valorizados e adorados
    por toda a comunidade.
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    Pensem na jovem mulher que tem de
    permanecer casta até ao casamento.
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    Pensem no filho mais novo que tem de
    obedecer ao filho mais velho,
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    que, por sua vez,
    tem de obedecer ao patriarca.
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    Mas começou um fenómeno
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    no século XIII,
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    principalmente com o Renascimento,
    no Ocidente,
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    que causou a maior crise de identidade
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    na História da Humanidade.
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    Este fenómeno é a Modernidade.
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    Podes resumi-lo num processo triplo.
  • 2:08 - 2:14
    Primeiro, um processo de racionalização
    da investigação científica,
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    que acelerou o avanço tecnológico.
  • 2:17 - 2:21
    De seguida, um processo de
    democratização política,
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    que fomentou os direitos individuais.
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    E finalmente,
    um processo de racionalização
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    da produção económica e
    liberalização do comércio.
  • 2:32 - 2:35
    Este três processos interligados
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    aniquilaram completamente
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    todos os pilares tradicionais
    das sociedades ocidentais,
  • 2:41 - 2:44
    com consequências radicais
    para o indivíduo.
  • 2:44 - 2:47
    Agora os indivíduos são livres
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    para valorizar ou desvalorizar
  • 2:50 - 2:54
    qualquer atitude, qualquer escolha,
    qualquer objecto.
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    Mas, como resultado,
    eles próprios são confrontados
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    com esta mesma liberdade
    que os outros têm
  • 3:02 - 3:07
    de os valorizar ou desvalorizar.
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    Por outras palavras,
    o meu valor era outrora assegurado
  • 3:12 - 3:16
    submetendo-me
    às autoridadades tradicionais.
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    Agora está cotado na Bolsa.
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    No mercado liberalizado
    dos desejos individuais,
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    eu negoceio o meu valor diariamente.
  • 3:30 - 3:33
    Daí provém a ansiedade
    do homem contemporâneo.
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    Ele é obcecado:
    "Sou desejável? Quão desejável?
  • 3:37 - 3:40
    "Quantas pessoas me vão amar?"
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    E como é que ele responde
    a esta ansiedade?
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    Bem, recolhendo, histericamente,
    símbolos de desejabilidade.
  • 3:52 - 3:55
    (Risos)
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    Eu acho a este acto de recolha,
  • 3:58 - 4:01
    juntamente com outros, capital de sedução.
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    De facto, a nossa sociedade de consumo
  • 4:03 - 4:09
    é largamente baseada no capital de sedução.
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    É dito acerca deste consumo,
    que a nossa era é materialista.
  • 4:13 - 4:17
    Mas isso não é verdade!
    Nós só acumulamos objectos
  • 4:17 - 4:20
    de forma a comunicar com outras mentes.
  • 4:20 - 4:25
    Nós fazêmo-lo para que elas nos amem,
    para as seduzir.
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    Nada poderia ser menos materialista,
    ou mais sentimental,
  • 4:29 - 4:33
    do que um adolescente
    comprar umas calças de ganga novas
  • 4:33 - 4:35
    e rasgá-las até ao joelhos,
  • 4:35 - 4:37
    porque ele quer agradar à Jennifer.
  • 4:37 - 4:40
    (Risos)
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    Consumismo não é materialismo.
  • 4:43 - 4:45
    É aquilo que é engolido
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    e sacrificado em nome do deus do amor,
  • 4:48 - 4:53
    ou em nome do capital de sedução.
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    À luz desta observação sobre
    o amor contemporâneo,
  • 4:58 - 5:01
    como poderemos pensar
    no amor nos anos vindouros?
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    Podemos imaginar duas hipóteses:
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    A primeira consiste em apostar
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    que este processo de capitalização
    narcisística vai-se intensificar.
  • 5:12 - 5:16
    É difícil dizer de que forma é que
    esta intensificação vai ocorrer,
  • 5:16 - 5:18
    porque depende maioritariamente
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    de inovações sociais e tecnológicas,
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    que são, por definição, difíceis de prever.
  • 5:26 - 5:28
    Mas podemos, por exemplo,
  • 5:28 - 5:31
    imagina um "website" de encontros
  • 5:31 - 5:36
    que, um pouco como aqueles programas
    de fidelização
  • 5:36 - 5:39
    através de atribuição de pontos,
    utiliza pontos de capital de sedução
  • 5:39 - 5:42
    que podem variam de acordo com
    a minha idade, o meu rácio altura/peso,
  • 5:42 - 5:45
    o meu grau académico, o meu salário,
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    ou o número de cliques no meu perfil.
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    Podemos também imaginar
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    um tratamento químico para as separações
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    que enfraquece os sentimentos de ligação.
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    Já agora, já existe um programa na MTV
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    em que os professores de sedução
  • 6:09 - 6:13
    tratam os corações partidos como uma doença.
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    Este professores intitulam-se
    "pick-up artists."
  • 6:16 - 6:19
    "Artist" tem uma tradução simples,
    significa "artista."
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    "Pick-up" significa
    pegar em alguém, engatar,
  • 6:22 - 6:24
    mas não um engate qualquer —
    é um engate de miúdas.
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    Então eles são artistas de engatar miúdas.
  • 6:29 - 6:30
    (Risos)
  • 6:30 - 6:35
    E eles chamam
    aos corações partidos "one-itis."
  • 6:35 - 6:39
    Em inglês, "itis" é um sufixo
    que designa infecção.
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    "One-itis" pode ser traduzido como
    "a infecção de um."
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    É um pouco repugnante.
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    De facto, para os artistas do engate,
    apaixonar-se por alguém
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    é uma perda de tempo,
  • 6:52 - 6:54
    é esbanjar o nosso capital de sedução,
  • 6:54 - 6:56
    por isso tem que ser eliminado
  • 6:56 - 7:00
    como uma doença, como uma infecção.
  • 7:00 - 7:04
    Também podemos imaginar
  • 7:04 - 7:07
    uma utilização romântica do genoma.
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    Toda a gente iria andar com ele
  • 7:10 - 7:13
    e apresentá-lo como um cartão de visita
  • 7:13 - 7:18
    de forma a verificar se a sedução
    pode progredir para reprodução.
  • 7:18 - 7:22
    (Risos)
  • 7:22 - 7:27
    É claro que esta corrida pela sedução,
  • 7:27 - 7:29
    tal como qualquer competição feroz,
  • 7:29 - 7:34
    criará enormes disparidades
    na satisfação narcisista
  • 7:34 - 7:38
    e, consequentemente,
    muita solidão e frustração também.
  • 7:38 - 7:41
    Por isso, podemos esperar que
    a própria modernidade,
  • 7:41 - 7:46
    que é a origem do capital de sedução,
    possa ser questionada.
  • 7:46 - 7:48
    Estou a pensar particularmente na reacção
  • 7:48 - 7:53
    dos neo-fascistas ou
    das comunidades religiosas.
  • 7:53 - 7:59
    Mas tal futuro não tem que ser.
  • 7:59 - 8:04
    Outro caminho para pensar
    sobre o amor pode ser possível.
  • 8:04 - 8:06
    Mas como?
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    Como renunciar à necessidade histérica
    de ser valorizado?
  • 8:11 - 8:15
    Bem, tornando-me consciente
    da minha inutilidade.
  • 8:15 - 8:17
    (Risos)
  • 8:17 - 8:18
    Sim,
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    Sou um inútil.
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    Mas fiquem descansados:
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    vocês também.
  • 8:23 - 8:26
    (Risos)
  • 8:26 - 8:30
    (Aplausos)
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    Somos todos inúteis.
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    Esta inutilidade é facilmente demonstrada,
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    porque, de forma a ser valorizado,
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    preciso que outro me deseje,
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    o que demonstra que não tenho
    qualquer valor só por mim próprio.
  • 8:45 - 8:48
    Não tenho qualquer valor inerente.
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    Todos fingimos ter um ídolo;
  • 8:53 - 8:56
    todos fingimos ser um ídolo para alguém,
    mas na realidade
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    todos somos impostores, um pouco como
    um homem que vai na rua
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    e aparenta ser fixe
    e totalmente indiferente,
  • 9:03 - 9:06
    quando, no entanto,
    antecipou e calculou que
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    toda a gente estaria a olhar para ele.
  • 9:09 - 9:11
    Acho que estar consciente desta
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    impostura generalizada
  • 9:13 - 9:15
    que nos diz respeito a todos
  • 9:15 - 9:16
    iria facilitar as nossas relações amorosas.
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    É por eu querer ser amado
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    da cabeça aos pés,
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    justificado em todas as minhas escolhas
  • 9:22 - 9:25
    que a histeria da sedução existe.
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    E daí eu quero parecer perfeito
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    de forma a outro alguém me amar.
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    Quero que esse outro alguém seja perfeito
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    de forma a poder estar seguro do meu valor.
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    Isto leva a casais
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    obcecados com o desempenho
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    que irá acabar, simplesmente,
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    à mínima desilusão.
  • 9:42 - 9:46
    Contrastando com esta atitude,
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    eu apelo à ternura — o amor como ternura.
  • 9:49 - 9:50
    O que é a ternura?
  • 9:50 - 9:54
    Ser terno é aceitar
    as fraquezas da pessoa amada.
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    Não é tornarem-se
    num casal de subservientes.
  • 9:58 - 9:59
    (Risos)
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    Isso seria muito mau.
  • 10:01 - 10:02
    Pelo contrário,
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    há muito charme e felicidade na ternura.
  • 10:05 - 10:09
    Refiro-me a um tipo de humor que,
    infelizmente, é utilizado poucas vezes.
  • 10:09 - 10:12
    É uma espécie de poesia
    deliberadamente esquisita.
  • 10:12 - 10:15
    Refiro-me à auto-ironia.
  • 10:15 - 10:18
    Para um casal que já não é mais baseado
  • 10:18 - 10:20
    nas restrições da tradição,
  • 10:20 - 10:21
    acredito que a auto-ironia
  • 10:21 - 10:26
    é uma das melhores formas de fazer
    com que o relacionamento perdure.
Title:
O amor — Estão a fazê-lo mal
Speaker:
Yann Dall'Aglio
Description:

Nesta encantadora palestra, o filósofo Yann Dall'Aglio explora a procura universal pela ternura e ligação num mundo que está cada vez mais focado no indivíduo. Pelos vistos, é mais fácil do que pensamos. Uma reflexão sábia e espirituosa sobre o estado do amor na era moderna. (Filmado no TEDxParis.)

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Video Language:
French
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
10:42
Isabel Vaz Belchior commented on Portuguese subtitles for L'amour -- vous le faites mal.
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David Moura edited Portuguese subtitles for L'amour -- vous le faites mal.
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