Criando filhos no estilo holandês | Michele Hutchison | TEDxKazimierz

O estilo holandês de criação dos filhos tem vantagens para ambos: pais e filhos. Nesta palestra, Michele Hutchison conta a história de como ela e sua coautora Rina Acosta aprenderam que surpreendentemente pais podem fazer mais por seus filhos e a si mesmos fazendo menos.

Michele Hutchison é editora, tradutora e escritora. Nasceu e cresceu na Inglaterra e estudou nas universidades East Anglia, Cambridge e Lyon. Trabalhou em uma editora inglesa antes de mudar para Amsterdam, no final da gravidez, em 2004. Lá trabalhou como editora e se tornou uma proeminente tradutora da literatura holandesa. Vive em uma antiga casa com seus dois filhos holandeses.

Com sua coautora Rina Mae Acosta, Michele escreveu o best-seller “The Happiest Kids in the World: How Dutch Parents Help Their Kids (And Themselves) By Doing Less” (As crianças mais felizes do mundo: como os pais holandeses ajudam seus filhos (e a si mesmos) fazendo menos), lançado em 2007. Rina dividiria o palco com Michele mas, devido a complicações em sua gravidez, contribuiu com a palestra através de um vídeo gravado.

A tradução em polonês, "Najszczęśliwsze dzieci na świecie", foi lançada neste ano.

Esta palestra foi dada em um evento TEDx, que usa o formato de conferência TED, mas é organizado de forma independente por uma comunidade local. Para saber mais visite https://www.ted.com/tedx

Quantos de vocês são pais,

ou estão planejando se tornarem pais?

Muitos de vocês.

Imagine por um instante
que daqui a três ou seis meses

você terá seu primeiro filho.

Que tipo de pai ou mãe você deseja ser?

O que você quer para seu filho?

Talvez você queira que seu filho
seja inteligente, educado,

popular, talvez, ou atlético.

Mas acima de tudo, você provavelmente
quer que seu filho seja feliz.

A nossa cultura parental moderna

normalmente equipara
o filho ter sucesso a ser feliz.

E para que seu filho possa ser feliz,

você vai tentar dar a ele o melhor
no começo de sua vida

e ser o pai perfeito.

Há uma suposição de que as crianças
precisam e merecem

todo o tempo, dinheiro e atenção
que um pai pode humanamente prover

para poder dar a elas
uma vantagem competitiva.

Essa suposição está arraigada
em nossa cultura.

Ouvi falar da tradição polonesa
chamada “Matka Polka”

onde a mãe, e provavelmente
em famílias mais modernas o pai também,

sacrificam-se por
seus filhos e sua família.

Então acredito que o que falarei aqui
pode ser relevante para vocês.

A ideia que quero transmitir

com Rina Mae Acosta, minha coautora,

é que colocar toda a sua energia
e atenção buscando a perfeição

não é a melhor opção,

nem para você e nem para seu filho.

Essa não é uma ideia óbvia,

então queremos explicar o porquê

e contar como nossa experiência
comprova sua veracidade.

Ser um excelente pai

não tem a ver com ser o melhor

ou vencer a competição da vida.

E não é necessariamente uma coisa boa

pensar demais ou pesquisar demais
sobre a parentalidade.

Um jeito mais tranquilo, pode resultar
em uma parentalidade menos estressante,

foi o que descobrimos
quando mudamos de país.

Mas quem somos nós?

Por que estou aqui, no palco, te falando
para não ser o melhor pai que pode ser,

que menos é mais na parentalidade,

que pensar demais sobre isso
pode prejudicar você e seu filho,

que é perigoso tentar demais?

Eu sou Michele Hutchison,
editora e tradutora inglesa.

Me casei com um holandês

e me mudei para a Holanda em 2004.

Estava grávida de 37 semanas
de meu primeiro filho.

Agora ele é um sadio homenzinho
que logo completará 14 anos.

Minha segunda filha
é uma atlética menina de 11 anos.

Posso descrever a ambos
como crianças felizes.

Agora, vamos deixar que Rina
se apresente em vídeo.

(Vídeo) Olá! Sou Rina Mae Acosta,

sou de São Francisco
e me apaixonei por um holandês.

Decidimos nos casar e morarmos na Holanda

e hoje somos orgulhosos pais
de dois meninos de seis e quase três anos

e estamos esperando o terceiro
que chegará no próximo outono.

Michele e eu percebemos
de forma independente

que a Holanda tem o costume
de criar os filhos soltos,

o que é bem diferente

do que nossos amigos e família
no Reino Unido e EUA experimentam.

O comportamento holandês
na criação de filhos foi novidade.

Na Holanda, parece haver
bem menos ansiedade

e um ambiente mais tranquilo.

Os pais ao nosso redor pareciam felizes

e segundo o ditado:
“Pais felizes, filhos felizes”.

Mas não fique com a ideia errada.

Não é parentalidade do tipo
“qualquer coisa serve”,

é na verdade uma forma mais pragmática,
compreensiva e razoável

de ensinar e amar seus filhos.

O equilíbrio exato entre
estar por perto e manter distância.

Estudos feitos pela Unicef em 2007 e 2013

classificaram as crianças holandesas
como as mais felizes do mundo.

Elas ficaram à frente
em bem-estar infantil

comparadas com 29 dos países
industrializados mais ricos do mundo.

Quando falamos sobre as crianças
mais felizes do mundo,

falamos de crianças que são
autoconscientes, responsáveis, confiantes,

têm relacionamentos saudáveis
com suas famílias, amigos e colegas,

e conseguem encontrar seu lugar no mundo.

Quando essas crianças classificaram
seu próprio nível de felicidade,

mais de 95% delas se consideraram felizes
em uma escala de satisfação com a vida.

Então decidi escrever
sobre isso em meu blog:

em “Os 8 segredos das crianças holandesas,
as crianças mais felizes do mundo”.

Eu não fazia ideia de que as pessoas
iriam mesmo ler meu artigo,

até porque, eu era apenas
mais uma mãe blogueira.

Mas de alguma forma, meu artigo repercutiu
entre muitas pessoas pelo mundo.

O blog atraiu a atenção de uma editora,

a mesma que Michele deixou
para criar seus filhos em Amsterdam

e, quando vimos, estávamos escrevendo
o livro “The Happiest Kids in the World”.

Ele foi lançado ano passado
e logo atraiu a atenção da mídia.

Os direitos foram vendidos
a mais de 12 países,

incluindo a Polônia, onde foi lançado
alguns meses atrás.

A regra na Holanda é a simplicidade.

Para a família holandesa
de orientação pragmática,

faz todo o sentido assegurar
que seus filhos cresçam felizes.

Eles mantêm uma atitude saudável,

vendo seus filhos como indivíduos
e não uma extensão de si mesmos.

Os holandeses se agarraram à infância
que a maioria de nós teve

e estão recriando essa infância
para seus próprios filhos.

Comparados ao resto do mundo,
onde pais superprotetores é o comum,

as crianças holandesas possuem
uma liberdade relativamente ilimitada,

indo à escola de bicicleta,
brincando na rua,

visitando seus amigos depois da escola,

tudo sem a supervisão de seus pais.

(Aplausos)

MH: Essa liberdade que Rina descreveu

soa familiar para vocês, não é?

E sim, muitos de nós
crescemos desse jeito.

Porque não recriamos
essa infância para nossos filhos?

E essa não é uma ideia
exclusivamente holandesa.

Muitos de nós adorariam praticá-las

se não estivéssemos tão preocupados
com o que os outros pais iriam pensar.

Vou falar dos cinco pontos principais
da vida familiar do estilo holandês.

Um: as crianças holandesas
brincam ao ar livre sem supervisão.

Brincar fora de casa sem supervisão.

Bem, por que não?

Medo.

O medo é tão dominante
em nossa sociedade atual

que muitos pais não ousam
deixar seus filhos sem supervisão.

Eles ficam por perto o tempo todo,
socorrendo toda vez que eles caem.

É claro que é natural e assustador

imaginar seu filho
sendo atacado, sequestrado

ou pior.

Acredite, qualquer pai normal
tem esses medos.

Os pais holandeses me ensinaram
que ter medo é muito normal.

A dica é ignorar os medos irracionais.

É muito interessante
para a criança brincar sozinha.

Meus filhos brincavam no parque
em frente de casa desde muito novos.

Eu ficava espiando eles da janela

e fui soltando as rédeas
conforme eles foram crescendo.

De acordo com a UNICEF,
as crianças na Holanda

não estão menos seguras do que as crianças
de qualquer outro lugar da Europa.

Não há maior risco em serem sequestradas
porque brincam sem supervisão.

As crianças não pagam o preço
pela liberdade que seus pais lhes dão.

Dois: crianças holandesas
andam de bicicleta na chuva.

Bem, pedalar na chuva não é bom, é?

Mas na Holanda é tão comum
que ninguém nem pensa antes de sair.

Quando me mudei para Amsterdam,
a bicicleta foi uma das primeiras compras.

Bicicletas são quase obrigatórias
em nosso relevo plano,

onde há mais bicicletas que pessoas.

Crianças aprendem bem novas
a andar de bicicleta,

por volta de 4 anos,
quando começam a ir à escola

os pais as ensinam
a andar de bicicleta em segurança

e não se preocupam com eles
andando de bicicleta sozinhos

aos 9 anos de idade mais ou menos.

Há um bom sistema de ciclovias

semelhante ao que estão
construindo aqui na Polônia.

E uma capa de chuva é suficiente
para lidar com o tempo ruim,

e chove muito na Holanda.

Quanto a fazer com que teus filhos saiam

é verdade que é preciso incentivá-los
no começo, quando são novos.

Qualquer criança preferiria um motorista,
mas elas se acostumam a usar bicicleta,

e logo param de pedir e saem sozinhas.

Pesquisas mostram que pedalar
em qualquer condição climática

faz com que a criança seja mais resiliente

e pessoas mais resilientes

são mais felizes.

Acabei de voltar das férias
em Londres com minha filha

e ela sentiu muito a falta
da comodidade da bicicleta.

Elas são muito boas
para crianças impacientes

porque você só precisa ir.

Três: famílias holandesas
passam mais tempo juntas.

Não é impossível manter um equilíbrio
entre trabalho e vida particular.

Os holandeses lutaram por isso
e conquistaram esse equilíbrio

em um nível que muitos pais
sentiriam inveja.

De acordo com as últimas estatísticas,

os holandeses trabalham
em média 32 horas por semana,

que é a menor jornada do mundo,
atrás apenas de Ruanda.

Porém, são produtivos: estão em 7° lugar
em produtividade per capita.

Não estamos falando
de um país pobre mas feliz.

No entanto, há menos necessidade de status

e atribuímos a felicidade

ao baixo consumismo
das famílias holandesas.

A Holanda é um país de alta produtividade
que incentiva a criatividade.

É só olhar na Wikipedia,
a lista de inventores holandeses

é mais longa que seu braço.

Invenções recentes incluem
o Blu-ray e o Wi-Fi

E as mais antigas incluem
a bolsa de valores,

as cenouras alaranjadas,
o para-lamas de plástico das bicicletas.

A única parte da bicicleta
inventada por holandeses

foi inventada por uma mulher:
Willemine van der Woerd,

que também inventou
muitos outros acessórios.

Já que trabalham menos, muitos pais
dedicam um dia da semana ou mais

só para passar tempo com seus filhos

e reservam tempo para eles mesmos também.

Quando comecei a trabalhar
em um escritório,

descobri que na Holanda é muito comum

sair do trabalho às 17h
para ver seus filhos.

Passar tempo junto é mais valioso
do que espremer experiências importantes

no chamado “tempo de qualidade”.

Outro ponto a ser lembrado
é que pais felizes têm filhos felizes.

Como Rina nos disse,
os pais cuidam de si mesmos

e esses pais são bons modelos
para seus filhos no futuro.

Quatro: crianças até 10 anos

têm pouco ou nenhum dever de casa
e mais tempo livre.

Meus filhos holandeses, esses da foto,

não tiveram dever de casa
durante a escola primária.

Não estar sob pressão para estudar
ou fazer o dever de casa

deu a eles muito tempo para esportes,
hobbies e brincar ao ar livre,

o que é um excelente truque holandês
para tirá-los da frente do iPad.

Na Holanda, aproveitar o tempo de escola
é mais importante do que se destacar.

Pais e professores acreditam ser bom
deixá-los se desenvolver no próprio ritmo.

Há menos pressão para se sobressair

ou competir com outras crianças
para ser o melhor da classe.

Depois da escola primária,
em vez de ter dever de casa,

as crianças brincam
em clubes depois da aula,

organizam encontros para brincar,
andar de bicicleta, praticar esportes.

Cinco: pais holandeses
são honestos e abertos

ao conversar com seus filhos sobre sexo.

Estamos falando de educação sexual
que evita a criação de tabus.

Os pais holandeses
adoram conversas abertas,

eles falam sobre sexo quando seus filhos
começam a fazer perguntas

explicando de forma que eles entendam.

Ensinando seus filhos sobre intimidade,
sexo e limites desde cedo,

eles criam pessoas
que perderão a virgindade mais tarde

do que em países sexualmente
mais conservadores

e também se protegerão de doenças
sexualmente transmissíveis

como clamídia e gonorréia.

Então essa conversa aberta
é um meio de proteger as crianças.

Aqui temos Rina grávida
abraçando seu filho.

Quantos aqui estariam
completamente a vontade

se seu filho perguntasse
de onde vem os bebês?

Na Holanda não é constrangedor
responder uma pergunta dessas.

Fazemos isso tranquilamente.

E conhecer sobre reprodução,
sexualidade e intimidade

capacita a criança a estipular
seus próprios limites mais tarde.

Por último mas não menos importante:

crianças holandesas comem chocolate
com pão no café da manhã.

Essa é a dica número seis, uma dica extra.

Não force uma refeição saudável
logo no café da manhã.

É mais importante
ir para a escola de barriga cheia.

E temos na Holanda um dos índices
de obesidade mais baixos da Europa.

Obviamente, não dá para todo mundo
mudar para a Holanda.

Mas muitos aspectos da vida holandesa
podem ser replicados.

Algumas coisas são mais difíceis

e precisariam de mudanças
a nível nacional.

Como menos horas de trabalho.

A não ser que você seja o chefe.

Nesse caso, mande todos
para casa às 17h amanhã.

Também é difícil reduzir
a quantidade de dever de casa

ou construir ciclovias.

Outras coisas precisam da comunidade:

como criar um local seguro onde
as crianças podem brincar sem supervisão

e qualquer pai cuida de todos
e não só dos seus filhos.

Esta é a rua da minha casa

e essa vida em comunidade
é comum na Holanda.

Mas há algumas atitudes que você

pode adotar hoje mesmo
ou no futuro, quando se tornar pai.

Os holandeses não são pais melhores
porque fazem mais por seus filhos.

Eles são menos ativos, por assim dizer.

Então, pare de fazer tudo
pelos seus filhos,

deixe-os brincar sozinhos ao ar livre.

A independência leva à autoconfiança

que desenvolve autoestima
e que se manifesta como felicidade.

Deixe que seus filhos errem
e aprendam com seus erros.

Só assim, eles desenvolverão resiliência,

a habilidade de enfrentar
e vencer obstáculos.

Os holandeses desprezam o que pensam
que seus filhos deveriam ser

e lhes dão a oportunidade
de se desenvolverem

de forma independente,
confiante e autossuficiente.

Liberte-se da sutil e limitante ansiedade
e da ilusão compartilhada

de que podemos curar e controlar
os mínimos detalhes da vida deles.

Não defendemos correr altos riscos.

As crianças na foto
têm equipamentos de segurança.

Apesar de ser uma metáfora,
um pai ansioso pode negar a seus filhos

o prazer, o entusiasmo e a valiosa
oportunidade de aprender sobre equilíbrio.

Aprenda com o termo
holandês “relativeren”,

que significa “colocar
as coisas em perspectiva”.

Em vez de se preocupar
com coisas horríveis que podem acontecer

ensine e prepare seus filhos
com habilidades importantes,

por exemplo: saber nadar,
seguir as regras de trânsito

e saber impor seus limites pessoais.

Vamos ouvir a Rina novamente.

(Video) Olá! Sou eu, Rina Mae de novo.

Realmente há outra forma mais amável
e pragmática de ser pai.

E deixaremos vocês com esta ideia:

sim, a parentalidade pode ser
alegre e divertida

se você se permitir relaxar um pouco mais

e permitir mais liberdade aos seus filhos.

Quanto menos você fizer por teus filhos,
mais eles farão por si mesmos

e mais capazes eles se tornarão.

Ensine-os desde cedo
a fazerem coisas por si

e lhes dê espaço para errar.

Isso os ensinará a lidar com seus erros
e a se tornarem mais resilientes.

O estilo de parentalidade holandesa

me ajudou a ser uma mãe
mais confiante e tranquila.

A parentalidade continua sendo
trabalhosa e muitas vezes ingrata,

mas se formos mais honestos e perdoadores

e nos permitirmos curtir a parentalidade

e enfrentarmos essa vida confusa
com um pouco de pragmatismo holandês,

nós e nossos filhos
seremos muito mais felizes.

MH: Essas ideias têm grande importância
para os pais, não só na Holanda,

não só para nós, ou na Polônia,
mas para todos os pais em todos os lugares

e para todos que estão
planejando se tornar pais no futuro.

Veja que o jeito holandês de criar filhos
torna essa tarefa menos assustadora.

Minhas palavras finais
para o TEDxKazimirez são:

faça menos, se estresse menos.

Dê a seus filhos o espaço
e a liberdade para aprender brincando.

Deixe-os aprender com seus erros,

caindo e se levantando sozinhos.

Não proteja seus filhos dos riscos

mas prepare-os para enfrentarem
o mundo como ele é.

E mantenha uma conversa aberta e sincera.

Aprenda com os holandenses assim como nós.

Construímos nossas vidas
na Polônia… na Holanda

de um jeito mais saudável e prático
para nós e nossos filhos.

Queremos que o máximo de pessoas

aprendam alguma coisa
com as famílias holandesas

para serem pais mais felizes
com filhos mais felizes

por todo o mundo.

Obrigada.

(Aplausos)