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Title:
Para educar raparigas destemidas, incentivem a aventura
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Description:
As raparigas corajosas fazem skate, trepam às árvores, fazem escalada, caem, arranham os joelhos e levantam-se de seguida — e crescem para se tornarem mulheres destemidas. Aprendam como incentivar pequenas tomadas de risco produtivas e educar raparigas confiantes com histórias e conselhos da bombeira, praticante de parapente e aventureira todo-o-terreno Caroline Paul.
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Speaker:
Caroline Paul
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Quando era criança, era obcecada
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com o livro de recordes
mundiais do Guinness,
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e queria muito estabelecer
o meu próprio recorde mundial.
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Havia só um pequeno problema:
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Eu não tinha qualquer talento.
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Então decidi estabelecer
um recorde mundial em algo
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que não requeria qualquer talento.
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Decidi estabelecer
um recorde mundial
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em rastejar.
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O recorde na altura era de 20 km
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e por algum motivo
parecia-me alcançável.
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Recrutei a minha amiga Anne,
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e juntas decidimos que nem sequer
precisávamos de treinar.
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No dia da nossa tentativa,
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colocámos protetores por cima
das nossas calças da sorte
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e lá fomos nós.
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Começámos logo a ter problemas,
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porque a ganga roçava na nossa pele
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e começou a criar irritações.
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Depois, os joelhos
começaram a criar feridas.
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Horas depois,
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começou a chover.
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Depois, a Anne desistiu.
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Depois, ficou de noite.
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Naquela altura, os meus joelhos
sangravam através das calças,
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e eu estava a alucinar
devido ao frio.
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à dor e à monotonia.
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Para vos dar uma ideia
do que eu estava a passar,
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a primeira volta à volta
da escola demorou 10 minutos.
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A última quase 30.
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Depois de 12 horas a rastejar,
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parei.
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Tinha feito 13 km.
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Estava ainda um pouco longe do recorde.
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Durante muitos anos, pensei nesta história
como um fracasso miserável,
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mas hoje penso de forma diferente,
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porque quando estava
a tentar bater o recorde,
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estava a fazer três coisas.
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Estava a sair da minha zona de conforto,
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estava a apelar à minha resiliência,
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e estava a encontrar confiança em mim
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e nas minhas decisões.
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Não o sabia na altura,
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mas esses não são
os atributos de um fracasso
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São os atributos da coragem.
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tornei-me bombeira em São Francisco.
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Era a 15.º mulher
num quartel com 1500 homens.
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Como podem imaginar,
quando cheguei
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havia muitas dúvidas acerca
das minhas capacidades.
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Apesar de ser uma remadora
colegial com 1,78 m e 68 kg,
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e ser capaz de aguentar 12 horas
com os joelhos em brasa...
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... sabia que ainda tinha
de provar o meu valor.
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Então, um dia houve um incêndio.
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Claro, quando o meu grupo chegou,
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havia uma nuvem negra de fumo
a sair de um edifício num beco.
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E eu estava com
um grandalhão chamado Skip.
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Ele estava com a agulheta
e eu estava mesmo atrás.
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Era um incêndio típico.
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Fumarento, quente.
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De repente,
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houve uma explosão.
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O Skip e eu fomos projetados para trás,
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a minha máscara caiu para o lado,
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e houve um momento de confusão.
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Depois, levantei-me,
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agarrei na agulheta
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e fiz o que é suposto
um bombeiro fazer:
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Avancei,
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abri a água
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e ataquei o incêndio.
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A explosão fora causada
por um esquentador.
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Ninguém se magoou,
e acabou por não ser nada de grave.
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Mais tarde o Skip
veio ter comigo e disse-me:
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"Bom trabalho, Caroline,"
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num tom surpreendido.
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Fiquei confusa, porque
não tinha sido fisicamente difícil.
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Porque é que ele olhava
para mim com tal espanto?
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Então tornou-se claro:
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o Skip — que, já agora,
é um tipo impecável
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e um excelente bombeiro —
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não só pensava que
as mulheres não eram fortes,
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como pensava também
que não podiam ser corajosas.
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Mas não era o único.
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Amigos, conhecidos e estranhos,
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homens e mulheres
durante toda a minha carreira
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perguntam-me vezes sem conta:
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"Caroline, os incêndios, o perigo,
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"não tens medo?"
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Honestamente, nunca ouvi perguntar isso
a nenhum bombeiro.
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E fiquei curiosa.
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Porque é que não se espera
coragem das mulheres?
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A resposta começou a formar-se
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quando um amigo meu se lamentou
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que a sua filhinha
era um pouco medricas.
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Então, comecei a observá-la,
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e sim, ela era ansiosa
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mas. mais do que isso,
os pais era ansiosos.
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A maior parte das coisas
que lhe diziam começava com:
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"Tem cuidado",
"Olha por onde andas" ou "Não".
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Os meus amigos não era maus pais.
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Faziam apenas
o que maioria dos pais fazem,
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que é advertir as filhas muito mais
do que fazem com os filhos.
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Ironicamente, houve um estudo envolvendo,
um varão de bombeiros, num recreio.
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Os investigadores observaram
que as mães e os pais
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chamavam a atenção às filhas
para o perigo do varão,
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e, se elas quisessem
brincar na mesma no varão,
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um dos pais ia ajudá-la.
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E os rapazes?
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Eram encorajados a brincar
no varão de bombeiro
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apesar dos receios que pudessem ter.
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Muitas vezes os pais davam-lhes orientações
de como o podiam fazer sozinhos.
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Qual é a mensagem que passa tanto
para os rapazes como para as raparigas?
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Que as raparigas são frágeis
e precisam de ajuda,
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e que os rapazes podem e devem
dominar tarefas difíceis sozinhos.
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Que as raparigas devem ser receosas
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e o rapazes corajosos.
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A ironia é que, nestas idades,
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rapazes e raparigas são
muito parecidos fisicamente.
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Muitas vezes,
as raparigas são mais fortes,
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e mais maduras, até à puberdade,
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No entanto, nós adultos agimos
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como se as raparigas
fossem mais frágeis
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precisassem de ajuda
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e não consigam
lidar com as coisas.
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Esta é a mensagem que absorvemos
enquanto crianças,
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e é esta mensagem que fica
impregnada em nós enquanto crescemos.
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Nós mulheres acreditamos nela,
os homens acreditam nela,
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e sabem que mais?
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Quando nos tornamos pais
passamos isso aos nossos filhos,
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e por aí fora.
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Agora já tinha a minha resposta.
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É por isso que se espera
que as mulheres, mesmo as bombeiras,
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tenham medo.
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É por isso que as mulheres
muitas vezes têm medo.
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Eu sei que alguns de vocês
não acreditam quando digo isto,
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mas eu não sou contra o medo.
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Eu sei que é uma emoção importante
e que existe para nos manter seguros.
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Mas o problema é quando
o medo é a principal reação
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que ensinamos e incentivamos
nas raparigas
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sempre que enfrentam algo
fora da sua zona de conforto
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Eu fiz parapente
durante muitos anos.
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Um parapente é como
um paraquedas com asas,
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e voa bastante bem,
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mas percebo que, para muitas pessoas,
pareça apenas um lençol
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com cordéis agarrados.
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Passei muito tempo
em cumes de montanhas
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a insuflar este lençol,
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a correr e a voar.
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E sei o que estão a pensar.
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Tipo "Caroline, um pouco de medo
faz sentido nessa situação".
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E têm razão, faz mesmo.
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Asseguro-vos, eu tive medo.
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Mas no topo daquela montanha,
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à espera que o vento estivesse certo,
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sentia muitas outras coisas também:
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euforia, confiança.
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Eu sabia que era um bom piloto.
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Sabia que as condições
eram boas ou não estaria ali.
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Sabia que ia ser espetacular
estar a 300 metros no ar.
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Por isso sim, o medo estava lá,
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mas eu olhava bem para ele,
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pensava na sua relevância
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e depois colocava-o onde ele pertencia,
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o que era, muitas vezes,
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atrás da minha euforia,
da minha expetativa
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e da minha confiança.
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Por isso, eu não sou contra o medo.
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Sou apenas a favor da coragem.
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Não estou a dizer que as vossas filhas
têm de ser bombeiras
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ou que devem fazer parapente,
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só estou a dizer que as estamos a educar
para serem tímidas ou até indefesas,
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e isso começa quando
as advertimos para os riscos físicos.
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O medo que aprendemos
e as experiências que não vivemos
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ficam connosco quando
nos tornamos adultas
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e transforma-se em todas aquelas coisas
que enfrentamos e tentamos esconder:
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a nossa hesitação
em falar abertamente,
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a nossa deferência
para que gostem de nós
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a falta de confiança nas nossas decisões.
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Como nos tornamos destemidas?
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Aqui estão as boas notícias.
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Podemos aprender a coragem,
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e como qualquer
coisa que se aprende,
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só precisa de ser praticada.
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Primeiro,
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temos de respirar fundo
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e incentivar as nossas filhas
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a fazer skate, a trepar às árvores
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e a subir àquele varão
de bombeiro no recreio.
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Foi isso que a minha mãe fez.
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Ela não o sabia na altura,
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mas os investigadores
têm um nome para isso.
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Chamam-lhe brincadeira de risco,
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e os estudos mostram
que a brincadeira de risco
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é muito importante
para todas as crianças,
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porque ensina a avaliar o perigo,
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ensina o que é uma recompensa diferida,
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ensina resiliência,
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ensina confiança.
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Por outras palavras,
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quando as crianças vão
para a rua praticar a coragem,
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aprendem lições de vida
muito importantes.
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Segundo, temos de deixar de advertir
as raparigas por tudo e por nada.
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Tenham atenção
da próxima vez que disserem:
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"Cuidado, vais-te magoar,"
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ou "Não faças isso, é perigoso."
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Lembrem-se que, muitas vezes,
o que lhe estão a dizer
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é que ela não devia puxar por ela,
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que ela não é boa o suficiente,
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que deveria ter medo.
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Nós mulheres temos
de praticar coragem também.
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Não podemos ensinar as nossas filhas
se não aprendermos primeiro.
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E há outra coisa:
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o medo e a euforia
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são muito parecidos:
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as mãos a tremer,
o batimento cardíaco acelerado,
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a tensão nervosa.
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Aposto que muitos de vocês
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da última vez que pensaram
estar assustados,
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estavam sim a sentir euforia,
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e agora perderam
uma oportunidade.
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Então pratiquem.
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E se as raparigas deviam estar lá fora
a aprender a serem corajosas,
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percebo que os adultos não queiram andar
de skate voador ou trepar às árvores,
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por isso, todos devíamos praticar
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em casa, no escritório
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e mesmo aqui a ganhar coragem
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para falar com alguém que admiramos.
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Por fim, quando a vossa filha,
por exemplo,
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estiver na bicicleta, no topo da colina,
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e insistir que está demasiado
assustada para descer,
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ajudem-na a ganhar coragem.
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A colina pode até ser demasiado alta,
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mas ela vai chegar a essa conclusão
através da coragem e não do medo.
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Porque isto não é sobre
a colina à sua frente.
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É sobre a vida à sua frente,
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e que ela tenha as ferramentas
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para lidar e avaliar
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todos os perigos dos quais
não a podemos proteger,
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todos os desafios durante os quais
não a vamos poder guiar,
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tudo aquilo que
as nossas filhas aqui
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e em todo o mundo
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irão enfrentar no futuro.
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o recorde mundial
em rastejar está hoje...
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Gostaria muito de ver
uma rapariga a bater o recorde.
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