Boa noite.
Eu venho falar da única coisa
que interessa a todos os portugueses,
que é escrever e publicar um livro.
(Risos)
Os mágicos — eu vou falar de magia —
nunca revelam os seus segredos.
Mas eu não vou revelar os meus segredos,
vou revelar os segredos
dos mágicos e dos génios.
Portanto, estou safo!
E começo por este princípio:
tudo o que eu vou dizer,
posso prová-lo cientificamente.
Geralmente, faço algum dinheiro
quando dou estas palestras.
(Risos)
Faço apostas com o público.
Aqui, não dá para fazer
porque temos pouco tempo
e porque o TED não permite.
(Risos)
Mas faz de conta que fazemos as apostas.
Façam uma aposta mental comigo.
A primeira é esta:
eu estou farto de ouvir
— há mais de vinte de tal anos...
Dava uns cursos quando não estava
na moda — agora raramente dou —
e vi muita gente a perguntar:
"Mas, então, pode-se ensinar talento?"
E era muito engraçado,
porque essas pessoas
que estavam contra,
estes negacionistas de uma ciência
que, à partida, desconheciam,
hoje em dia
estão quase todos convertidos a ela,
quase todos a dar cursos de escrita.
Aliás, já não publicam livros:
publicam livros sobre escrita.
Há uns tempos, fui a Nova Iorque,
entrei numa livraria,
uma "Barnes & Noble",
e, na montra, obviamente
estavam só livros:
"Como escrever um 'best-seller' ",
"250 técnicas de escrever melhor",
200 e 356...
Fica sempre com um ar mais científico
— para fazer uma ponte
com uma das comunicações anteriores —
fica sempre mais científico
quando usamos números.
É a lógica do Gaspar,
vamos dizer assim.
(Risos)
346, 548... Fica sempre bem!
3, 12... Há números mágicos.
7, 8, 9... Ia dar sempre por aí.
Então, a primeira coisa é:
todos os grandes escritores
frequentaram um curso de escrita criativa.
Todos!
E dou 50 euros...
Pensando bem... dou 20 euros
a quem conseguir provar o contrário.
Está lançada a aposta.
O segundo é uma questão pessoal.
Já agora, para não falar
só dos outros, dos génios...
Eu estou aqui à vossa frente,
eu meço um metro e oitenta e quatro,
peso 103 quilos,
(Risos)
e sou segundo ano de karaté.
Fui presidente de um clube de karaté
no Casal Ventoso
(Risos)
Andei muitas vezes à porrada.
Tenho aqui uma cicatriz,
que podem ver.
Tenho aqui outras acumuladas.
Andei muito à porrada.
O meu nariz já foi partido várias vezes.
E eu consigo vencer em duelo
qualquer homem à face da terra.
Venha o Mike Tyson,
venha o campeão português de judo,
eu consigo vencer
qualquer homem em duelo.
Aliás, consigo vencer qualquer um aqui.
Não sou tão corajoso ao ponto de dizer
que consigo vencer qualquer mulher,
mas consigo vencer em duelo
qualquer homem.
Portanto, fica isto.
E fica aqui o desafio.
Ou então, lá fora.
Uma pausa, dez minutos, e lá fora.
A segunda coisa é que eu sou incrível.
A sério, apreciem!
(Risos)
Uma categoria, a sério.
Isto são 103 quilos -
não é 103 quilos de gordura:
103 quilos de massa cinzenta!
(Risos)
E eu consigo
— eu sou um atleta poderoso —
eu consigo saltar daqui
para aquela bolinha vermelha que ali está.
Consigo, num só salto
num só salto, que é o que fazem
os génios da literatura.
num só salto,
consigo fazer uma lobantunada.
(Risos)
Consigo, dali saltar para aqui.
Esta é uma coisa que também aposto.
Não sei se isto são dez metros,
mas é os limites do TED!
Mas pronto.
(Risos)
A escrita criativa consiste, sobretudo,
de exercícios de músculos.
São exercícios de ginástica simples.
São aquecimento,
e trabalhamos os músculos
com que trabalhamos.
Aliás, penso sempre
no António Pinho Vargas.
Penso sempre nas pessoas
que tocam piano
e, de facto, eles têm uma inferioridade
em relação a nós, escritores.
É que nós, escritores,
somos inspirados por Deus.
(Risos)
E até desaprendíamos se fôssemos treinar.
Em contrapartida, um pianista...
Eu fico assim:
como é que ele
tem que estar ali a trabalhar,
tem que fazer aqueles arpejos,
e estudar durante anos...
Eu não compreendo!
Eu queria, como um pianista genial
chegasse ali ao pé do piano:
"Olha, eu nunca vi este objeto!"
(Risos)
a ter um ataque genial!
O mesmo para a Rosa Mota!
A Rosa Mota tornou-se campeã
— uma das poucas
medalhas portuguesas —
neste momento, já está penhorada...
(Risos)
Eu pensava:
"A mulher é espantosa,
consegue correr 42 quilómetros!"
E, um dia, passei ali
pelo mercado do Bolhão,
e vi-a a fazer exercícios,
a fazer [ininteligível]
Assim também eu!
(Risos)
Trabalhando, também eu!
Quer dizer... isto é uma batota!
Ora bem, eu vou apenas dar
alguns exercícios simples.
Um exemplo dos exercícios
que eu faço em aula,
e que se fazem nas aulas
de escrita criativa.
E isto fica bem:
são apenas amostras médicas.
Por exemplo, vou começar pelo fim.
Sabem porquê?
Há bocado, estava a falar com a Beatriz
— conheci-a há pouco,
é doutoranda em Sociologia —
e ela disse-me:
"Estou com muitas dificuldades
em escrever a minha tese."
E expliquei-lhe o segredo
que explico aos meus alunos,
que é um segredo científico:
"Escreve a conclusão e a introdução."
(Risos)
E, depois, o resto há de vir!
(Risos)
Começa por escrever a introdução:
este trabalho é sobre isto;
no 1.º capítulo vou fazer isto;
no 2.º e no 3.º vou fazer aquilo...
e vou usar estas metodologias.
E, no fim, diz:
"Chegámos à conclusão,
"após estes adorados 5 anos
de trabalho, de que..."
Fica logo a vida mais fácil.
Porque isto aprende-se com as crianças!
A primeira definição,
a primeira regra de contar uma história
é marcar as balizas do jogo.
No trabalho científico,
é introdução e conclusão.
Numa história, é o princípio e o fim.
Uma ponte é atravessada
de um lado para o outro,
pelos leitores passadores,
mas começa a ser construída
dos dois lados.
E o centro — o tal centro —
só é construído no fim.
Não há princípio nem fim.
Neste caso, o que há, é uma construção
de algo que se vai aproximando.
E isso, as crianças sabem!
Quando jogam na praia, os miúdos dizem:
"Olha, vamos reinar?"
E eles vão reinar,
põem uma mochila, uma pedra,
num cantinho, e um boné
e depois dizem:
"É pá, não, está muita grande,
somos só dois"
e então começam a aproximar.
Depois dizem:
"Está muito grande, está muito pequena."
Vão estreitando ou alargando a baliza,
vão afastando as balizas
em função de uma coisa
que é intuir a forma.
Depois aparecem outros miúdos
— um bastante gorducho,
mas isso agora não interessa nada —
e dizem:
"Também podemos reinar?"
E eles dizem: "Entrem",
mas então o campo tem de ser maior.
E vão alargando,
consoante é conto, novela ou romance.
É assim que se escreve e está aprendido.
Começar pelo fim,
escrever um conto sem uma vogal.
Por exemplo, retirar uma vogal,
que é fundamental e escrevê-lo.
Um senhor chamado Georges Perec,
fez um livro inteiro
chamado "La Disparition" sem a vogal "e".
Fazer uma quadra à moda do Aleixo.
O Aleixo era analfabeto.
Conheci o professor que passou a escrito
o que o Aleixo fazia.
Mas o Aleixo,
como tantos contadores orais,
tinha a métrica dentro da cabeça dele.
Não há, uma única vez, um verso errado.
E há, por exemplo,
um poema magnífico, que é este,
que eu acho
que é o mais delirante de todos
e que é um dos poemas mais sábios:
"Uma mosca sem valor
"Pousa com a mesma alegria
"Na careca de um doutor
"Como em qualquer porcaria."
(Risos)
O comboio coletivo é outro exercício.
É uma espécie de karaté esquisito,
só que, sabendo o que o outro fez antes,
o que significa que estamos constrangidos,
não pela ignorância
— pela liberdade da ignorância —
mas estamos constrangidos
por ter visto o que outro escreveu.
E, a partir daí, temos que afunilar.
Temos que passar do acaso,
da folha em branco,
para a necessidade do tentar
estar conforme com o que aconteceu antes.
Isto tem a ver, por exemplo,
com a verosimilhança.
Se eu for picado
por uma aranha radioativa,
é evidente que é lógico,
e qualquer cientista sabe
que, meia hora depois,
começo a escalar paredes.
(Risos)
Mas não posso começar a comer moscas
e se me cortam o braço,
ele não renasce.
Isso é se eu for picado por um lagarto.
(Risos)
Ou seja,
há uma lógica interna às histórias.
Outro exercício simples
e que, se o fizerem todos os dias,
melhoram bastante,
é pôr legendas em fotos.
A história do balão,
pôr dois políticos a falar
e ver o que é que eles estão a pensar.
Pôr um bigodinho nazi
na Merkel não vale, é batota.
(Risos)
Apagar os balões de uma página de BD
e criar uma nova história
em função daquelas ilustrações.
Fazer um livro infantil, com 22 páginas,
apenas 2 frases por página
e fazer os desenhos
— mesmo que não saibam desenhar.
Se não souberem desenhar, é melhor
porque fica mais original o vosso desenho.
Não escrever também é
um excelente exercício de escrita.
Eu aconselharia isto
ao José Rodrigues dos Santos.
Não escrever durante alguns anos...
para melhorar!
(Risos)
Mas "prontos"...
Contar a mesma história de dez maneiras,
reparem bem:
com pontos, vírgulas,
exclamações, reticências, etc.
Podem pegar numa só frase:
"Eu quero um copo de água"
e transformá-la em dez frases diferentes.
"Eu quero um copo de água."
"Eu QUERO um copo de água!"
"Eu quero UM copo de água!"
"Eu quero um copo de água?"
Isto é filosófico.
"Eu quero um... um copo de água...",
e assim por diante.
Podemos fazer várias frases,
várias histórias distintas,
sem mudar uma palavra,
mudando apenas vírgulas, pontos finais
e essas coisas que tais.
Brincar ao Rei Manda é o fundamental.
Eu aconselho toda a gente
que se sente insegura
e infeliz na sua vida,
ou que foi despedida,
a abrir um curso de escrita criativa,
porque a regra número um é:
"sinto-me sempre melhor
quando estou a chatear outros."
(Risos)
A sério... é psicologia portuguesa.
E o que acontece é que eu,
quando estou chateado,
quando eu estou infeliz,
a sentir-me pisado pelo mundo,
abro um curso de escrita.
E, durante uma semana,
brinco ao Rei Manda.
E quanto mais estapafúrdio, eu digo:
"Agora escrevam com a mão esquerda."
"Mas só os que não são canhotos!"
"Agora, enfiem uma lapiseira na narina
e vão escrevendo assim."
(Risos)
"Agora, vamos para a praia
fazer um soneto na areia molhada."
(Risos)
Isto, peçam aos alunos
para assinar antes um "disclaimer"
que é para aqueles que se afogam.
(Risos)
A regra fundamental dos cursos
é o Rei Manda.
O que pode acontecer
— isto é um segredo terrível —
é que vocês podem poupar dinheiro
arranjando cinco amigos,
e o Rei Manda um dia,
à segunda mando eu,
à segunda manda o outro.
E o que todos têm é
que seguir aquele constrangimento,
que é um princípio fundamental
da chamada escrita criativa.
O constrangimento ajuda
a libertar "la imagination".
O exercitar a compaixão é fundamental.
A compaixão é compreender
a paixão do outro.
Não é ter pena.
É compreender a paixão do outro.
Se eu quero escrever sobre um neonazi
— se quiserem que eu assine
um abaixo assinado contra, eu faço —
mas se eu quiser mesmo
fazer um romance sobre ele,
tenho que encontrar o neonazi
que há em mim.
Não é assim tão difícil como eu acho!
(Risos)
E ler!
É assim, a imaginação existe.
Tal como Deus existe.
Não sou tão arrogante
ao ponto de pensar
que uma coisa que não vejo à frente
não existe.
A questão é que eu nunca a vi.
E a imaginação, comigo, é como
— peço desculpa, mas somos
todos maiores de 18 anos -
é um pouco como, quando eu era
adolescente, nos bailes de bombeiros,
...as ereções.
(Risos)
(Risos)
As ereções, quando eu não queria
que elas viessem,
era quando elas vinham!
(Risos)
É como a imaginação.
Eu ia dançar com uma rapariga,
e a certa altura, aquilo...
(Risos)
Era terrível, porque mesmo assim
— naquela altura era um potente —
mesmo assim, ouvia:
"Eu sinto qualquer coisa aqui."
A certa altura, já estava...
(Risos)
Não interessa nada, agora.
Agora, acontece-me o contrário:
eu, agora, precisamente,
quero que a ereção venha,
e ela não vem.
(Risos)
No outro dia estava com a minha mulher
e aconteceu-me isto
e ela disse: "Não te preocupes, Rui".
"Isso também acontece aos outros".
(Risos)
Mas pronto!
(Aplausos)
O trabalho de escrever uma história
não é tanto o imaginar,
é mais o descalçar a bota.
Isto é que acho que é mesmo...
É resolver o problema
e contornar o obstáculo.
É aí que, às vezes,
aquilo a que nós chamamos imaginação
ou o que quiserem, vem.
É mais a arte do desenrasca.
Muitos dos exercícios num curso de escrita
são colocar obstáculos,
para uma pessoa ser obrigada
a contorná-los.
É essa a regra fundamental.
Uma máquina narrativa que vos ajuda,
melhora logo a vossa performance:
"Esta é a história de X,
"que, mais que tudo, quer fazer isto,
"mas não pode,
"porque alguém ou algo não o deixa."
E a partir daqui,
têm uma máquina de contar histórias
que podem aplicar.
Não quer dizer que a história seja isto;
este é o lado técnico.
Mas este é o lado que vos ajuda
a fazer o bolo.
Não é o bolo.
Não ajuda ao sabor do bolo,
mas ajuda o bolo a tomar forma.
É uma forma para dar forma ao bolo.
Se depois ele cresce,
ou tem levedura ou não, é convosco.
Isso é com cada um.
O contar uma história é ir de A a B.
Eu, quando começo a contar uma história,
sei sempre para onde é que quero ir.
Porque senão, não saio daqui.
É como o Colombo
que queria ir para a Índia,
o que é uma coisa estúpida,
porque já estava conhecida.
Depois, a certa altura,
sou desviado para Cuba.
Sou literalmente
— Colombo foi desviado para Cuba.
Foi ele que a inventou.
É o antecessor do Fidel Castro.
(Risos)
Tenho é que ser inteligente o suficiente
para aceitar ser desviado.
É estúpido aquele idiota que diz:
"Eu cumpro o plano!"
Eu cumpro o plano...
- Olha, vamos a esta festa?
- Não.
- Queres ir para a cama?
- Não."
- Queres ir para aqui?
- Não.
- Queres ganhar a lotaria?
- Não.
Temos é que estar disponíveis,
como um escultor,
para "escultar" o material.
Escrever é ler.
É uma dança a dois, entre nós e o mundo.
É tão simplesmente isso.
Devo dizer
que a melhor definição de estilo
que, até hoje, vi,
a melhor definição
de como contar uma história,
foi um cozinheiro que deu uma entrevista.
E ele disse simplesmente isto -
perguntaram-lhe:
"O que faz um bom chef?" -
e ele disse:
"Um bom cozinheiro é aquele
"que trabalha com boa matéria-prima
e não a estraga."
E isto — estudantes, tomem nota —
se têm uma grande história
para contar,
contem-na simplesmente.
Se a vossa história é uma porcaria,
façam um "soufflé".
(Risos)
Aí têm.
Ou façam como o Gaspar:
falem muito devagar.
(Risos)
Diz que é uma compulsão.
É usar as armas que temos,
é fazer das fraquezas força.
Bocage diz isso de uma forma lindíssima:
"Toda a gente ri do coxo,
"mas do coxo não ri
quem o coxo ama,
"porque só quem ama o coxo
sabe a graça que o coxo tem
"ao ir aos saltinhos pr'á cama."
(Risos)
A história que eu tenho para contar
está sempre perto de mim:
é a minha história!
Agora, explicando a história do karaté...
Para fechar,
eu tenho duas coisas.
Vou precisar de dois voluntários
daqui a pouco...
Primeiro, todos os escritores
tiraram cursos de escrita, todos
porque todos eles leram,
aprenderam, copiaram, imitaram.
Não estiveram foi numa sala,
com um papel branco
e um monitor a dizer:
"Olha, agora faz isto".
Mas todos eles tiraram.
Era o que faltava!
Camões teve grandes mestres.
Camões — aliás, os Lusíadas
começam por homenagear
um dos seus mestres.
O génio é aquele que acha
que é um gigante aos ombros de anões.
Ora, o artista a sério, para mim,
é aquele que sabe que é um anão
aos ombros de gigantes.
Portanto, todos fomos à escola
e quem não foi à escola... coitado!
Depois, o que acontece
com a história do karaté,
para explicar simplesmente isto,
o karaté é isto:
é a finta.
Quando eu disse: "Sei karaté",
"peso 103 quilos",
um metro e oitenta e quatro,
estas cicatrizes todas...
"Venço o Mike Tyson, venço
os homens todos em duelo,"
é evidente que estava a dizer a verdade.
Ou seja, tudo isso é verdade:
peso a mais,
peso mais 30 quilos do que devia.
Mas essa não é a questão;
fiz aquilo que fazem os ilusionistas,
que é: apontei para um lado.
Apontei para um duelo de carácter físico.
Ora, o que acontece, é que é verdade:
consigo vencer qualquer um,
é uma verdade.
Qualquer eu,
qualquer um de nós aqui decide.
E esta é a regra fundamental da arte
— ou pelo menos da arte escrita —
que é feita com a matéria
que todos nós conhecemos.
É simplesmente isto:
"Ah, eu ganho qualquer duelo,
"com qualquer pessoa à face da Terra,
"desde que seja eu a decidir
quais as regras do duelo."
(Risos)
Se ele é mais forte que eu,
vamos jogar xadrez.
Se ele é melhor a xadrez que eu,
vamos jogar damas.
Se ele é melhor a jogar damas do que eu,
vamos jogar pingue-pongue.
Se ele é melhor a isso tudo
e mais interessante que eu,
então, a regra do duelo é:
qual de nós é que sabe
em que lugar é que eu hoje estava sentado
no alfa a caminho de Coimbra?
(Risos)
Eu encontro sempre forma de ganhar!
E agora...
vou fazer o tal salto que prometi fazer.
Por favor, duas pessoas.
Eu pedi duas pessoas, dois voluntários!
Ah, por favor!
Eu sei que vocês não têm
grande material aqui...
É um problema,
mas eu venho sempre preparado.
Isto é uma coisa para ajudar.
Eu não consegui melhor!
Mas... peço-vos que venham aqui.
Portanto, eu vou dar um salto...
...de dez metros!
Só duma vez!
Só os grandes escritores
é que conseguem fazer isto.
Só os grandes artistas.
Por favor, comecem aqui.
Meus senhores, peço o vosso aplauso.
(Aplauso)
É devido.
Se calhar, vou-me magoar!
Então, agora, por favor...
Ponham mais alto, se não eles vêm-me!
(Risos)
Agora acompanhem-me, vá!
Tarã!
(Risos)
Ah!
(Aplausos)
É isto que um escritor faz.
É dar a ilusão
de que deu um salto gigante,
quando, na verdade,
deu pequenos passinhos.
É uma letra atrás da outra.
Querem escrever?
Todos os dias sentem-se meia hora,
a tentar escrever uma história,
a tentar ir para algum lado.
O que acontece hoje em dia
é que, com o culto do génio,
com o culto romântico do génio.
o artista, para ter sucesso,
passou a precisar de fingir
que não faz nenhum.
É isso que tem em comum
com o burocrata:
o burocrata, para ter sucesso,
precisa de fingir
que o simples levantar de um papel
é um trabalho enorme.
"Isto é muito complicado!"
Enquanto o artista precisa de fingir
que não deu trabalho nenhum.
Ambos mentem!
E ambos são vítimas de um tempo vil,
de um tempo "gasparizado".
(Risos)
Ler é ser livre,
ler é escrever,
ler é...
Para mim, a verdadeira liberdade
está na leitura.
Quando estou a escrever,
estou preso no meu pequeno mundo.
Eu tenho poucas...
Eu tenho respostas,
mas algumas são pinguinhas.
Em contrapartida, quando eu leio,
tenho a liberdade toda do mundo.
E é esse precisamente o diálogo
entre o mundo lá fora e o mundo cá dentro,
que é ler com o corpo todo.
Eu sou a caneta,
eu sou o papel,
e um curso de escrita limita-se,
para os preguiçosos,
a fornecer-lhes esta moldura externa.
O que vocês põem é o que vocês recebem.
Como tudo o que há
de interessante na vida.
E fazer amor é mais interessante,
ligeiramente mais interessante
— nem sempre, mas é mais
interessante, às vezes —
do que ouvir a explicação
de fazer amor.
Assim, estudantes de ciências,
tomem nota:
até mesmo do que ver
pornografia na Internet.
Obrigado.
(Aplausos)