Acho que existe beleza no ato de escutar as vozes de pessoas que não têm sido ouvidas. ["Drawing the Blinds" - 2014] ["The Jerome Project (Asphalt and Chalk) III" - 2014] É complicado, pois as coisas que devem ser ditas nem sempre são bonitas. Mas se, de alguma maneira, elas forem reflexo da verdade, acho que, fundamentalmente, isso as torna bonitas. (Música) Existe a beleza estética do trabalho, que, em alguns casos, age mais como um cavalo de Troia. Ela nos permite abrir nosso coração para conversas difíceis. Pode ser que sejamos atraídos pela beleza, e, enquanto somos compelidos pela técnica, pelas cores, pela forma ou composição, talvez a conversa difícil acabe vindo à tona. ["Billy Lee and Ona Judge Portraits in Tar" - 2016] Aprendi a pintar, de verdade, porque passei muito tempo nos museus observando as obras dos grandes mestres. Após observar quadros de Rembrandt ["The Night Watch"], Renoir ["Luncheon of the Boating Party"], Manet ["Luncheon on the Grass"], ficou muito claro que se eu fosse aprender a pintar um autorretrato estudando essas pessoas, eu teria um grande desafio quando tivesse que misturar a cor da minha pele ou a cor da pele das pessoas da minha família. Há, literalmente, fórmulas registradas que mostram como se pinta a pele branca, quais cores usar na pintura de base e quais usar nos reflexos do "impasto", pois isso não existe para pele escura. Isso não existe. E isso acontece porque nossa pele não era considerada linda. As imagens e o mundo refletidos na história das pinturas não me representam. Não representam as coisas que eu valorizo, e esse é o conflito que sempre tenho, pois amo a técnica usada nessas pinturas, aprendi com elas, mas sei que elas não têm consideração por mim. Então muitos de nós estão alterando essa história simplesmente para mostrar que estávamos lá. Só porque você não pode nos ver, não significa que não estávamos lá. Estivemos lá. Estivemos aqui. Continuamos não sendo considerados bonitos, mas nós somos e estamos aqui. Muitas das coisas que eu crio acabam sendo tentativas fúteis de reforçar essa ideia. ["Drawing the Blinds" - 2014] ["Seeing Through Time" - 2018] Apesar de ter recebido aprendizado ocidental, meu olho ainda se concentra nas pessoas que se parecem comigo. Então no meu trabalho, muitas vezes uso técnicas como tinta branca sobre o resto da composição para dar destaque ao personagem que provavelmente passaria despercebido. Já recortei outras figuras das pinturas, tanto para enfatizar a ausência delas, como também para dar destaque às outras pessoas na composição. ["Intravenous (From a Tropical Space)" - 2020] O " Jerome Project" se baseia esteticamente em centenas de anos de pintura de ícones religiosos, um tipo de estrutura estética que era reservada para a igreja, reservada para os santos. ["Leaf from a Greek Psalter and New Testament"] ["Christ Pantocrator"] Esse projeto explora o sistema de justiça criminal. Não foi criado para julgar se as pessoas são culpadas ou inocentes, e sim para questionar se essa é a maneira de lidar com nossos cidadãos. Iniciei esse conjunto de obras porque, após ficar separado do meu pai durante quase 15 anos, entrei em contato com ele novamente, mas eu não sabia como encaixá-lo na minha vida. E muitas das coisas que não entendo acabam sendo trabalhadas no estúdio. Então comecei a fazer retratos de fotos de fichas criminais, porque procurei pelo meu pai no Google, imaginando o que havia acontecido durante esses 15 anos. Para onde ele tinha ido? E achei uma foto da ficha criminal dele, que, claro, não me surpreendeu. Mas nessa primeira busca, também achei outros 97 homens negros exatamente com o mesmo nome e sobrenome, e achei as fotos da ficha criminai deles e isso sim foi uma surpresa. Sem saber o que fazer, simplesmente comecei a pintá-los. Inicialmente o piche era um jeito de saber quanto tempo de vida esses homens perderam na cadeia. Mas desisti disso, e o piche tornou-se muito mais simbólico durante o andamento do processo, pois percebi que o tempo de encarceramento é só o início do resto da vida deles que será afetado por isso. Então, em termos de beleza nesse contexto, eu sei, pela família dos meus amigos, que aqueles que foram presos ou estão presos no momento, querem ser lembrados. Querem ser vistos. Afastamos as pessoas por muito tempo, e em alguns casos, por aquela pior coisa que fizeram. Então, até certo ponto, é apenas uma maneira de dizer: "Nós vemos você". Acho que isso é um gesto bonito. Na obra "Behind the Myth of Benevolence", existe quase uma cortina com a pintura de Thomas Jefferson puxada para o lado, revelando uma mulher negra que está escondida. Essa mulher negra não é apenas Sally Hemings, mas ela também representa qualquer outra mulher negra naquela plantação de Monticello e em todas as outras. O que sabemos sobre Thomas Jefferson é que ele acreditava na liberdade, talvez mais do que qualquer um que já tenha escrito sobre ela. E se sabemos e acreditamos que isso seja verdade, então a única coisa benevolente a fazer nessa situação seria estender essa liberdade. Neste trabalho uso duas pinturas diferentes que são "forçadas" uma sobre a outra, para enfatizar a tumultuada relação entre os negros e brancos das composições. Assim, aquela contradição, essa realidade devastadora que está sempre atrás da cortina, coisas que estão acontecendo nas relações raciais desse país, são tratadas nesta pintura. Esta pintura é chamada "Another Fight for Remembrance". Esse título tem a ver com a repetição. Ele fala sobre a violência policial contra os negros, a qual nunca deixou de existir, e que agora está acontecendo novamente. A pintura é meio que apresentada como um reflexo dos tumultos de Ferguson. Não é que não seja sobre Ferguson, mas não é que não seja sobre Detroit, nem que não seja sobre Minneapolis. A pintura começou porque, em uma viagem a Nova York com meu irmão, para ver um pouco da minha própria arte, após passarmos horas entrando e saindo de galerias, terminamos o dia sendo parados por um carro da polícia disfarçado. Os dois policiais, com a mão na arma, nos mandaram parar, nos colocaram contra a parede, e me acusaram de furtar peças de arte da galeria onde eu, na verdade, estava exibindo o meu trabalho. E enquanto estavam em pé com a mão na arma, perguntei ao policial qual era a diferença entre a minha cidadania e a de todas as outras pessoas que não estavam sendo perturbadas naquele momento. Ele me informou que estavam nos seguindo por duas horas e que estavam recebendo reclamações sobre dois homens negros que estavam entrando e saindo de galerias. Essa pintura é sobre a realidade: a questão não é "se" acontecerá novamente, é sobre "quando" será a próxima vez. Esse trabalho mais recente se chama "From a Tropical Space". Essa série de pinturas é sobre mães negras. Ela se passa em um mundo supersaturado, talvez até surrealista, não muito longe daquele em que vivemos. Mas nesse mundo, os filhos dessas mulheres negras estão desaparecendo. Esse trabalho é na verdade sobre o trauma, as coisas pelas quais as mulheres negras e de cor da nossa comunidade têm que suportar para conseguir colocar seus filhos no caminho da vida. O que é encorajador para mim é que essa minha prática me deu a oportunidade de trabalhar com jovens da minha comunidade. Tenho certeza que as respostas não estão em mim, mas se tenho alguma esperança, é a de que elas possam estar neles. "NXTHVN" é um projeto que começou há cerca de cinco anos. É uma incubadora de artes de 12 mil m² no coração do bairro de Dixwell em New Haven, Connecticut. Esse é um bairro essencialmente composto por negros e pardos. E a história do jazz está por todos os cantos desse bairro. Nossa vizinhança, de diversas formas, tem sofrido com a falta de investimento. As escolas estão lutando para preparar bem nossa população para o futuro delas. Eu sei que a criatividade é um recurso essencial. É preciso ter criatividade para conseguir imaginar um futuro tão diferente do que está diante de nós. Todo artista do nosso programa tem um assistente de estúdio na escola secundária: um aluno do ensino médio vem da cidade de New Haven, trabalha com eles e aprende o ofício e a prática deles. Então conseguimos ver as diversas maneiras com as quais o encaminhamento dessas pessoas ao poder da criatividade pode mudá-las. A beleza é complicada, por causa de como a definimos. Acho que a beleza e a verdade estão, de alguma forma, entrelaçadas. Acho que existe algo lindo ao falar a verdade. Ou seja: existe beleza no ato de falar a verdade e nas diversas maneiras em que ela se manifesta. Existe beleza nisso.