Há algo na Física que me tem incomodado desde que sou criança. Está relacionado com uma pergunta que os cientistas vêm fazendo há quase 100 anos, sem obterem resposta. Como é que as coisas mais pequenas na natureza, as partículas do mundo quântico, se assemelham às coisas maiores na natureza — os planetas, as estrelas e as galáxias, unidas pela gravidade? Em criança, eu refletia sobre perguntas como esta. Brincava com microscópios e eletroímanes, e lia sobre as forças do "pequeno" e sobre a mecânica quântica e ficava fascinado com o facto de essa descrição se assemelhar tão bem às nossas observações. Depois olhava para as estrelas, e lia sobre como compreendemos tão bem a gravidade, e pensava que, seguramente, devia haver uma forma elegante de estes dois sistemas se ligarem. Mas não há. E os livros diziam: Sim, percebemos muito bem os dois reinos, em separado, mas quando tentamos uni-los matematicamente, tudo falha. E durante 100 anos, nenhuma das nossas ideias que tentam resolver este desastre da física foi sustentada por provas. E para o pequeno eu — o pequeno, curioso e cético James — isto era uma resposta extremamente insatisfatória. De resto, sou ainda um miúdo cético. Avancemos agora até dezembro de 2015, quando me encontrei no centro do mundo da física virado do avesso. Tudo começou quando nós no CERN vimos algo intrigante nos dados: um indicador de uma nova partícula, uma hipótese de resposta, possivelmente extraordinária. a esta pergunta. Continuo um miúdo cético, penso eu, mas agora sou também caçador de partículas. Sou físico no Grande Colisor de Hadrões (GCH), no CERN, a maior experiência científica alguma vez criada. É um túnel de 27 quilómetros na fronteira entre a França e a Suíça a cem metros debaixo do solo. Neste túnel, usamos ímanes supercondutores mais frios que o espaço exterior para acelerar protões quase à velocidade da luz e colidi-los uns contra os outros, milhões de vezes por segundo, recolhendo os detritos dessas colisões para procurar novas partículas fundamentais, não descobertas. O desenho e a construção levou décadas de trabalho de milhares de físicos de todo o mundo. No verão de 2015, estávamos a trabalhar sem descanso no GCH com a mais alta energia que os seres humanos já usaram numa experiência de colisão. Uma energia mais alta é importante porque, para as partículas, há uma correspondência entre energia e massa de partículas, e a massa é apenas um número colocado lá pela natureza. Para descobrir novas partículas, temos de alcançar esses números maiores. Para isso, tivemos de construir um colisor maior, de energia alta, o maior colisor de energias altas no mundo é o Grande Colisor de Hadrões. Fazemos colidir protões milhares de biliões de vezes, e obtemos esses dados lentamente, durante muitos meses. Podem aparecer novas partículas nos nossos dados como bossas — ligeiros desvios do que é esperado, pequenos aglomerados de dados que deformam a suavidade da linha Por exemplo, esta bossa, depois de meses a colecionar dados, em 2012, levou à descoberta da partícula de Higgs — o bosão de Higgs — e ao Prémio Nobel pela confirmação da sua existência. Este salto em energia, em 2015, representou a melhor hipótese que nós, enquanto espécie, tivemos de descobrir novas partículas — novas respostas a estas velhas questões, porque era quase o dobro da energia que tínhamos usado quando descobrimos o bosão de Higgs. Alguns dos meus colegas trabalharam para este momento, durante toda a carreira, e honestamente, para o pequeno curioso eu, este era o momento por que esperei durante toda a vida. Por isso, 2015 era o momento. Então, em junho de 2015, o GCH foi novamente ligado. Os meus colegas e eu retivemos a respiração e roemos as unhas, e finalmente vimos as primeiras colisões de protões à energia mais alta de sempre. Aplausos, champanhe, celebração! Foi um marco para a ciência. Não sabíamos o que iríamos encontrar nestes dados novos. Semanas mais tarde, encontrámos uma bossa. Não era uma bossa muito grande, mas era suficientemente grande para franzirmos o sobrolho. Numa escala de 10 de franzir o sobrolho, se 10 indica que encontrámos uma nova partícula, esta era um quatro. (Risos) Passei horas, dias, semanas em reuniões secretas, a analisar esta bossa com os meus colegas, manipulando- a com tudo o que tínhamos à mão para ver se iria resistir à observação. Mesmo meses depois de trabalhar sem descanso — a dormir no escritório e sem ir a casa, com barras de chocolate como jantar, e baldes de café, os físicos são máquinas que transformam o café em diagramas — (Risos) esta pequena bossa não desaparecia. Meses depois, apresentámos a bossa ao mundo com uma mensagem clara: "Esta bossa é interessante mas não é definitiva, "vamos manter os olhos nela enquanto obtemos mais dados". Estávamos a tentar ser descontraídos sobre o assunto. Mas o mundo acompanhou-nos. As notícias adoraram. As pessoas diziam que lhes fazíamos lembrar a bossa descoberta do bosão de Higgs. Melhor que isso, os meus colegas teóricos — adoro os meus colegas teóricos — escreveram 500 artigos sobre esta pequena bossa. (Risos) O mundo da física das partículas tinha dado uma reviravolta. Mas o que tinha esta bossa em particular que fez centenas de físicos perderem a cabeça? Esta pequena bossa era única. Esta pequena bossa indicava que estávamos a ver um grande número inesperado de colisões cujos destroços consistiam apenas em dois fotões, duas partículas de luz. E isso é raro. As colisões de particula não são como colisões de automóveis. Têm regras diferentes. Quando duas partículas colidem quase à velocidade da luz, passa-se para o domínio do mundo quântico. E no mundo quântico, estas duas partículas podem criar uma partícula nova que dura uma pequena fração de segundo antes de se separar noutras partículas que atingem o detetor. Imaginem uma colisão de dois carros que desaparecem com o impacto, e aparece uma bicicleta no lugar deles. (Risos) A bicicleta explode em dois "skates" que atingem o detetor. (Risos) Felizmente, não literalmente. São muito caros. Os momentos em que só dois fotões atingem o detetor são muito raros. Devido às propriedades quânticas especiais dos fotões, há um número muito pequeno de novas partículas possíveis — essas bicicletas míticas — que podem dar origem a apenas dois fotões. Mas uma dessas opções é enorme, e está relacionada com aquela velha questão que me incomodava em pequeno sobre a gravidade. A gravidade pode parecer-vos super forte, mas na verdade é fraca comparada com outras forças da natureza. Posso brevemente vencer a gravidade quando salto, mas não posso pegar num protão com a minha mão. A força da gravidade comparada a outras forças da natureza? É de 10 elevado a menos 39. Isso é um número decimal com 39 zeros. Pior que isso, todas as forças da natureza conhecidas estão perfeitamente descritas nesta coisa a que chamamos o Modelo Padrão que é a nossa melhor descrição da natureza na sua escala mais pequena, e, sinceramente, um dos maiores sucessos da humanidade — exceto para a gravidade, que está ausente do Modelo Padrão. É de loucos! É quase como se a maior parte da gravidade tivesse desaparecido. Sentimos um pouco dela, mas onde está o resto? Ninguém sabe. Mas uma explicação teórica propõe uma solução rebelde. Vocês e eu — até mesmo vocês aí ao fundo — vivemos em três dimensões espaciais. Espero que isto não seja uma declaração controversa. (Risos) Todas as partículas conhecidas vivem nestas três dimensões espaciais. Aliás, uma partícula é apenas outro nome para uma excitação num campo tridimensional; uma oscilação localizada no espaço. Mais importante, toda a matemática que usamos para descrever isto assume que só existem três dimensões espaciais. Mas a matemática é o que é, e podemos brincar com ela como quisermos E as pessoas têm brincado com dimensões espaciais extra há muito tempo, mas tem sempre sido um conceito matemático abstrato. Basta olhar à nossa volta — vocês aí ao fundo, olhem à vossa volta — há claramente apenas três dimensões espaciais. Mas e se isso não for verdade? E se a gravidade que falta desaparece numa dimensão extra-espacial que é invisível para todos nós? E se a gravidade for tão forte como as outras forças se a víssemos nesta dimensão extra-especial? E se o que nós verificamos é só uma pequena fatia da gravidade e por isso ela parece tão fraca? Se isto fosse verdade, teríamos de expandir o nosso Modelo Padrão de partículas para incluir uma nova partícula, uma partícula hiperdimensional de gravidade, um gravitão especial que existe em dimensões extra-espaciais. Posso ver pela expressão nas vossas caras que devem estar a perguntar: "Como iremos testar esta ideia louca, de ficção cientifica, "estando presos em três dimensões?" Da forma como sempre fizemos, fazendo colidir dois protões... (Risos) ... com a força suficiente para que a colisão vá ecoar nalguma dimensão extra-espacial que possa existir, criando momentaneamente este gravitão hiperdimensional que depois repercute para as três dimensões do GCH e se divide em dois fotões, em duas partículas de luz. Este gravitão hipotético, extradimensional, é uma das novas partículas hipotéticas possiveis com as propriedades quânticas especiais que podem originar a nossa pequena bossa de dois fotões. A possibilidade de explicar os mistérios da gravidade e de descobrir dimensões espaciais extra — talvez agora percebam porque milhares de "geeks" da física perderam a cabeça com a nossa pequena bossa de dois fotões. Uma descoberta deste tipo faria reescrever os manuais. Mas lembrem-se, a mensagem dos experimentalistas que estavam por detrás deste trabalho, na altura, foi muito clara: precisamos de mais dados. Com mais dados, a nossa bossa ou se transforma num bom Prémio Nobel... (Risos) ... ou os dados extra preencherão o espaço à volta da bossa e torná-la-ão numa linha suave. Assim, pegámos em mais dados, e com cinco vezes mais dados, vários meses depois, a nossa pequena bossa tornou-se numa linha suave. As notícias relataram uma "enorme desilusão," uma "esperança sumida," e que os físicos de partículas "estavam tristes." Com este tom dos artigos, pensariam que tínhamos decidido desligar o GCH e ido para casa. (Risos) Mas não foi o que fizemos. E porque não o fizemos? Quer dizer, se eu não descobri uma partícula — o que não fiz — se não descobri uma partícula, porque estou aqui a falar? Porque não fico cabisbaixo, envergonhado, e volto para casa? Os físicos de partículas são exploradores. E muito do que fazemos é cartografia. Ponhamos as coisas assim: esqueçam por agora o GCH. Imaginem que são exploradores espaciais num planeta distante, à procura de extraterrestres. Qual seria a vossa primeira tarefa? Andar à volta do planeta, aterrar, olhar à volta procurando sinais óbvios de vida, e reportar de volta à base-mãe. É aí que estamos agora. Procurámos no GCH alguma partícula óbvia, nova e grande, e podemos reportar que não há nenhuma. Vimos um alienígena estranho numa montanha distante, mas quando nos aproximámos, vimos que era uma pedra. Então que fazemos? Desistimos e vamos embora? De modo nenhum; seriamos cientistas terríveis se o fizéssemos. Vamos passar as próximas décadas a explorar, a mapear o terreno, a peneirar a areia com um bom instrumento, a espreitar por baixo de cada pedra, a perfurar a superfície. Novas partículas podem aparecer imediatamente como bossas grandes e óbvias, ou podem-se revelar depois de anos de aquisição de dados. A Humanidade só agora começou a exploração no GCH com a sua energia alta, e temos muito para pesquisar. Mas e se, depois de 10 ou 20 anos, não descobrimos mais partículas novas? Construímos uma máquina maior. (Risos) Procuramos com energias ainda mais altas. Procuramos com energias ainda mais altas. Já estão a ser feitos planos para um túnel de 100 km que irá colidir partículas com 10 vezes mais energia que o GCH. Não decidimos onde a natureza coloca novas partículas. Só podemos decidir continuar a explorar. E se, mesmo com um túnel de 100 quiilómetros ou com um túnel com 500 km, ou um colisor com 10 000 km a flutuar no espaço entre a Terra e a Lua, não encontrarmos novas partículas? Então talvez estejamos a fazer mal a física de partículas. (Risos) Talvez tenhamos de repensar as coisas. Talvez precisemos de mais recursos, mais tecnologia e conhecimentos do que temos neste momento. Já usamos inteligência artificial e aprendizagem automática em partes do GCH, mas imaginem uma experiência de física de partículas usando algoritmos sofisticados que podem ensinar a si mesmos a descobrir gravitões hiper-dimensionais. Mas e se... uma última pergunta: E se a inteligência artificial não puder ajudar a responder às nossas perguntas? E se estas perguntas, velhas de séculos, estão destinadas a não terem resposta num futuro próximo? E se o que me tem incomodado desde a minha infancia não tiver respostas durante a minha vida? Então... ainda será mais fascinante. Seremos forçados a pensar de formas diferentes. Voltaremos às nossas premissas, e determinar se houve uma falha algures. Teremos de encorajar mais pessoas para se juntarem a nós a estudar ciência pois precisamos de olhos novos para estas questões centenárias. Não tenho as respostas e ainda as procuro. Mas alguém — talvez esteja na escola agora, talvez ainda não tenha nascido — talvez nos possa guiar para ver a física de forma diferente, para mostrar que talvez estejamos a fazer as perguntas erradas. O que não seria o fim da física, mas um novo começo. Obrigado. (Aplausos)