Olá, pessoal.
(Plateia) Olá.
Oi, Oprah, se estiver assistindo,
é minha chance de te mandar um oi.
Mas voltando ao assunto...
Bem, sei que nesta plateia
há alguns pais e mães, certo?
Dentre vocês que têm filhos,
quantos já tiveram
"aquela conversa" com eles?
Né?
É estranho, né? É esquisito.
Posso garantir a vocês,
como alguém que, quando criança,
teve essa conversa com os pais,
que é tão esquisito pra nós,
se não mais, quanto pra vocês.
A conversa aconteceu
quando eu tinha oito ou nove anos,
e foi estranho, acreditem.
Mas, por volta dos nove ou dez anos...
essa sou eu...
meus pais tiveram uma conversa
totalmente diferente comigo.
Não sei ao certo como eles decidiram
que aquele seria o dia para isso,
mas, numa tarde de domingo,
meu pai disse: "Tenho
que te mostrar uma coisa
e, depois, vamos conversar sobre ela".
Aí, ele colocou um documentário
do History Channel
e disse: "Não quero magoar você,
e sei que isso talvez te assuste,
mas é muito importante que você assista".
Aí, ele colocou um documentário
do History Channel,
e as primeiras imagens eram de um grupo
de membros muito agitados da Ku Klux Klan
e, pouco depois, apareciam homens negros
enforcados numa árvore.
Bem,
ele não me fez assistir ao documentário
todo porque eu era muito sensível,
mas aquela conversa
que meu pai teve comigo
é a mesma que muitas crianças negras
nos EUA precisam ter com os pais
sobre a discriminação e o racismo
que sofrerão em algum momento
por serem negros.
E meu pai disse: "Não quero te assustar.
Só quero que você saiba que, um dia,
talvez alguém queira te machucar
ou até te matar por você ser como é".
Lembro-me de ir
pro meu quarto depois disso,
me deitar na cama,
olhar pro teto e dizer:
"Por que eles nos odeiam?"
Imaginem aquela menininha já pensando
em por que as pessoas não gostavam dela,
por causa de como ela era.
Apesar da seriedade da conversa,
quando fui pra escola na segunda,
eu estava tranquila,
como as outras crianças,
contei aos meus amigos sobre a conversa
e percebi que eles ficaram
desconfortáveis.
E só percebi mais tarde
que o motivo era que alguns
dos meus amigos
não precisavam ter esse tipo
de conversa com os pais deles
sobre, de alguma forma, confrontar alguém
que, um dia, iria achar
que eles eram inferiores
ou querer machucá-los por serem como eram.
Após diversas outras
situações semelhantes,
simplesmente me dei conta
de que havia alguns grupos
com os quais eu não conseguiria
falar sobre racismo.
Então, mesmo em grupos
em que até as diferenças entre nós
eram gritantemente óbvias,
eu evitava o assunto,
porque não queria deixar
as pessoas desconfortáveis.
Vamos adiantar alguns anos.
Depois de formada na faculdade,
decidi usar meu diploma de jornalismo
e ensinar inglês na Coreia do Sul.
Foi uma experiência incrível,
em parte por causa das pessoas fantásticas
que conheci, de todas as partes do mundo.
Mas, acreditem, mudar-se
pro outro lado do mundo
pode trazer alguns desafios.
Certamente vocês sabem disso.
Quantos aqui já foram
o único diferente num lugar,
o único da sua cor, do seu gênero,
da sua sexualidade?
Como é a sensação?
Alguns vão dizer:
"Ah... nada demais. Fiquei bem".
Já outras pessoas se sentem
incrivelmente vulneráveis.
Imaginem essa sensação de desconforto
somada à memória das palavras do seu pai
sobre alguém talvez não gostar de você
só por você ser como é,
e multiplique essa sensação por mil
por você ser o único diferente
num país inteiro, praticamente.
(Risos)
Ai, ai...
Mas, francamente, foi uma fase divertida.
Só que me sentia como se estivesse
sob um microscópio o tempo todo.
Passei por experiências
das mais interessantes.
Tipo, um dia eu estava subindo
a escada rolante numa loja,
e um homem se debruçou tanto
na borda da escada pra me ver de perto
que achei que ele fosse me beijar.
Pensei: "Pronto. Arranjei
um marido". Sabe?
Alguns dos meus alunos me chamavam
de "professora da África",
ou "professora da Jamaica",
o que era tranquilo de corrigir.
Era apenas desconhecimento.
Uma vez, peguei um táxi,
e o taxista ficou tão chocado ao me ver
quanto todo mundo ficava
e, após uma conversa frenética
em coreano falado super-rápido,
ele pediu a minha mão.
Eu pensei: "Em casamento? Como assim?"
Na verdade, ele só queria tentar
esfregá-la pra ver se o marrom saía.
(Risos)
Sim, sim! Isso aconteceu de verdade.
Aquilo foi mais divertido
que qualquer outra coisa,
e essas experiências que tive
foram mais, sabe, por desconhecimento.
Eles não estavam propositalmente
tentando me ofender.
Então, tudo bem.
Mas houve outras ocasiões em que
a intenção era realmente me agredir.
Um fim de semana,
fui até Ulsan visitar duas amigas.
Ulsan é uma cidade linda
no litoral sul da Coreia do Sul,
com muito mais estrangeiros e turistas.
Eu estava querendo muito
passar um fim de semana
onde menos pessoas
me encarassem, pelo menos.
Eu e minhas amigas
saímos e nos divertimos,
e terminamos o dia
num dos nossos bares favoritos.
De repente, enquanto conversávamos,
minha amiga à minha esquerda ficou pálida
como se tivesse visto um fantasma,
como se tivesse levado um susto.
Ela olhou pros três homens coreanos
sentados perto dela
e começou a gritar com eles!
"Como assim? O que está acontecendo?"
Eu e minha outra amiga
ficamos preocupadas.
Talvez eles tivessem dito a ela
algo inapropriado.
Eu estava pronta pra botar pra quebrar.
Sou pequena, mas sou forte!
Estava pronta pra brigar!
(Risos)
Aí,
ela olha pra mim e diz,
com lágrimas nos olhos:
"Eles acabaram de te chamar
de 'macaca idiota'".
Caramba.
A reação da minha
outra amiga foi visceral.
Ela também começou a gritar com eles,
os funcionários do bar se meteram...
Os caras ficaram freneticamente
tentando se explicar,
mas só porque foram pegos no flagra.
Minha amiga que havia ouvido primeiro
correu para o banheiro, chorando,
muito irritada.
Mas sabem de uma coisa?
No meio daquela confusão,
quando percebi que aquele era o problema,
fiquei bastante calma
porque era exatamente o que
eu vinha temendo desde os dez anos,
quando assisti a um documentário
sobre o fato de que alguém poderia dizer
exatamente o que aquele homem tinha dito,
e eu sobrevivi!
Sempre achei que um incidente
flagrantemente racista como aquele
seria como uma faca no meu peito.
Só que foi mais como cortar
o dedo com um papel:
uma dorzinha rápida,
uma pequena cicatriz,
um lembrete de que aquela não seria
a pior das coisas que eu ouviria,
e que eu sobreviveria.
Mas nem tudo na Coreia do Sul
foi tão dramático assim pra mim.
Só estou contando as partes mais doidas.
Francamente, foi a melhor
experiência da minha vida.
Me tornou uma pessoa mais forte,
mais confiante e mais resiliente.
Essa recém-descoberta confiança
foi provavelmente o motivo
de, três meses depois de voltar aos EUA
e receber a oferta
de emprego aqui em Bend,
eu ter agarrado a oportunidade.
Parecia o emprego dos sonhos
ser uma contadora de histórias,
e não apenas uma repórter.
Quando falei ao telefone
com o meu hoje chefe,
ele me informou que Bend
não tinha muita diversidade...
(Risos)
"Não tinha muita diversidade"
significava que havia muita gente branca!
(Risos)
Mas tudo bem!
Eu disse: "Bem, sabe, eu já morei
num país completamente diferente".
Qual o problema em morar
num estado completamente diferente?
A diferença, senhoras e senhores,
é que, na Coreia do Sul,
eu tinha outras pessoas ao meu redor
com a mesma sensação de forasteiro,
a sensação de não pertencer ao lugar.
Aqui em Bend, eu não tive muitas
outras pessoas que sentissem o mesmo,
e eu estava vivendo tudo isso
sendo uma pessoa pública.
Os jornalistas não podem expressar
opiniões publicamente.
Somos figuras imparciais da comunidade,
algo com que tive dificuldade
em alguns aspectos,
mas que, em grande parte, compreendo,
porque isso era tudo
que sempre quis fazer,
e faz parte do trabalho.
Mas ser a única negra na TV
pode trazer desafios únicos,
e me vejo colocando a mim mesma
em duas categorias com frequência:
a Anyssa jornalista e a Anyssa moça negra.
Essas duas categorias se chocaram
pela primeira vez no verão passado,
na mesma semana em que Philando Castile
e Alton Stirling, dois homens negros,
foram baleados e mortos
em estados diferentes;
a mesma semana em que cinco policiais
foram baleados e mortos em Dallas
em reação àquelas mortes.
Foi uma semana difícil para os EUA,
e com certeza foi uma semana
difícil para o jornalismo.
Mas, na manhã do dia seguinte
à morte de Alton Stirling,
vi o vídeo chocante de Philando Castile
morrendo em seu carro.
Me senti mais exausta
que qualquer outra coisa.
Eu assisti ao vídeo durante alguns minutos
e me aprontei pra ir trabalhar,
entrei no carro,
dei partida
e, uns três metros à frente, se muito,
comecei a chorar.
Ainda é muito difícil pra mim
falar sobre isso sem me emocionar,
porque esses homens eram pessoas
que poderiam ser meus conhecidos.
Poderiam ser meus amigos, familiares,
colegas de trabalho antigos.
Quando cheguei ao trabalho e ninguém
estava comentando sobre aquilo,
me senti mais sozinha do que nunca.
Foi como se o que havia acontecido
com aqueles homens
não tivesse importância.
Me senti como se eu
não tivesse importância,
e ninguém nem se deu conta.
Então, depois da nossa reunião matinal,
perguntei ao nosso produtor por que
não estávamos cobrindo as mortes,
e ele disse que tínhamos que achar
um jeito de adaptar a história.
Tudo bem.
Ele sugeriu que entrevistássemos
pessoas nas ruas.
Não fiquei muito empolgada,
mas pensei: "Tá bom, vamos lá".
Eu e meu câmera fomos ao centro da cidade
e não encontramos
muita gente disposta a falar.
Sabe, coisas desagradáveis
simplesmente não cabem
num dia ensolarado de verão em Bend.
Mas encontramos um casal
que nos deu uma opinião modesta,
e fiquei bem contente
porque não achava
que conseguiríamos coisa alguma.
Já estávamos falando em guardar tudo
e nos preparando para ir embora,
quando um homem se aproximou de bicicleta:
branco, 40 e poucos anos,
o tipo típico de Bend,
e perguntou o que estávamos fazendo.
Então, dissemos:
estávamos colhendo opiniões
sobre as mortes que haviam ocorrido.
E ele disse: "Tenho opinião,
mas não quero falar sendo filmado".
Perguntamos várias vezes a ele:
"Tem certeza? Tem certeza?"
Porque, sabe, a conversa não avançava.
Com certeza ele queria
compartilhar sua opinião.
E antes que conseguíssemos convencê-lo
de que talvez ele devesse nos contar
enquanto a câmera filmava,
ele começou a dar uma longa opinião
sobre tudo, de muçulmanos a imigrantes,
e aí ele concluiu dizendo:
"Detesto dizer isso,
porque você é negra..."
Vamos parar aqui
para aprendermos uma coisinha:
nenhuma frase boa jamais...
(Risos)
começa com "detesto ser racista, mas...".
(Risos)
Então, ele disse:
"Detesto dizer isso, porque você é negra,
mas vocês são grandes,
mais fortes, mais rápidos,
e às vezes a polícia precisa atirar
porque fica com medo".
(Plateia) Oh...
"E, estatisticamente,
os negros são mais violentos.
É só você pesquisar."
Eu fiquei totalmente paralisada.
Não conseguia acreditar
no que ele havia dito.
E ele me disse isso num dia ensolarado,
bem no centro de Bend,
tão naturalmente quanto se estivesse
me dizendo que o céu era azul.
Foi como uma facada.
Então,
agora que contei isso a vocês,
algumas semanas atrás, fizemos uma matéria
sobre eu contando essa mesma história,
e a repercussão e os comentários
foram assustadores.
Muitas pessoas ficaram incomodadas
pelo fato de eu ter feito
"todo mundo em Bend parecer racista",
e disseram que nunca mais
assistiriam à nossa programação.
Outras sugeriram
que, se eu quisesse diversidade,
eu devia sair da cidade!
Aí, claro, houve o infame comentário
das "cinco pessoas negras em Bend".
Se eu pudesse voltar atrás em algo,
seria isso.
Recentemente eu disse
que havia cinco de nós em Bend,
e as pessoas retrucaram, dizendo:
"Conheço pelo menos
12 negros aqui em Bend".
(Risos)
"Treze, até!"
(Risos)
A essas pessoas, eu digo: "Acho
que não entenderam o cerne da questão",
e elas meio que confirmaram
sem querer o que eu disse.
Não importa se você conhece 12 negros,
ou 13, ou 25 negros em Bend.
O fato de poderem contar quantos somos
numa cidade com milhares de habitantes
devia fazer vocês refletirem.
Meu objetivo não era dar
uma contagem de censo
nem chamar todos da região de racistas.
Pra mim, a questão continua sendo
que temos que achar uma forma de falarmos
confortavelmente sobre racismo.
Assim que mencionei isso,
foi modo de ataque, de defensiva.
Frequentemente as pessoas querem evitar
reconhecer o fato de que sou negra.
A frase de que menos gosto é:
"Não enxergo sua cor".
Sei que quem diz isso quer dizer
que vê todos como iguais,
mas por que não pode me ver
como igual e negra?
Eu jamais diria:
"Não enxergo você como branco".
(Risos)
(Aplausos)
Sabe, vocês devem reconhecer
que sou negra, pois pra mim tudo bem.
Quero que saibam que sou uma profissional
e que sou negra.
Também quero que saibam
que, embora possa haver
mais do que cinco de nós em Bend,
às vezes sinto como se fosse a única
num mar de literalmente milhares,
e isso às vezes é bem difícil e cansativo
em dias em que já não estou muito bem.
Quero que saibam que morar aqui em Bend
pode ser tão incrível
quanto foi morar na Coreia do Sul,
mas também é assustador
quando estou andando na rua
e fico imaginando quem está
passando ao meu lado
pensando exatamente a mesma coisa
que aquele homem me disse uma vez.
Não quero sair daqui
deixando generalizações simplistas
tipo "todos os negros são vitimizados"
ou "todos os brancos são racistas".
Mas, numa comunidade como Bend,
de maioria branca,
quero saber: como podemos aprender juntos?
Como podemos criar uma comunidade melhor
se nunca enxergamos nossas diferenças,
só nossas semelhanças?
Se reconhecermos nossas diferenças
e enxergarmos uns aos outros por inteiro,
imaginem o quanto podemos melhorar
não só Bend, mas o mundo.
Obrigada.
(Aplausos) (Vivas)