Eu sou do sul de Chicago,
e no sétimo ano, tinha
uma melhor amiga chamada Jenny
que vivia no sudoeste de Chicago.
A Jenny era branca,
e se sabem alguma coisa sobre
a demografia segregada de Chicago
sabem que não há muitos negros
a viver no sudoeste de Chicago.
Mas ela era minha amiga
e por isso convivíamos muitas vezes
depois das aulas e aos fins de semana.
Um dia estávamos a passar o tempo
na sala de estar dela,
a falar de coisas de pré-adolescentes,
e a Rosie, a irmã mais nova da Jenny,
estava na sala connosco,
estava sentada atrás de mim,
a brincar com o meu cabelo,
e eu não estava a pensar muito
naquilo que ela estava a fazer.
Mas numa pausa no meio da conversa,
a Rosie tocou-me no ombro e disse:
"Posso fazer-te uma pergunta?"
Eu respondi: "Sim, Rosie. Claro."
"És negra?"
(Risos)
A sala congelou.
Silêncio.
A mãe da Jenny e da Rosie
não estava muito longe,
estava na cozinha, ouviu a conversa,
ficou em estado de choque e disse:
"Rosie! Não podes perguntar
coisas dessas às pessoas".
Jenny era minha amiga, e eu sei
que ela ficou muito constrangida.
Senti-me mal por ela,
mas na verdade não estava ofendida.
Percebi que não era culpa da Rosie que,
nos seus curtos 10 anos de vida na terra,
a viver no sudoeste de Chicago,
não tivesse 100% de certeza
de como era uma pessoa negra.
É natural.
Mas o mais surpreendente para mim
foi que, depois do tempo todo que passei
com a família da Jenny e da Rosie,
a conviver com elas,
a brincar com elas,
até a interagir fisicamente com elas,
só quando a Rosie pôs as mãos
no meu cabelo
é que pensou em perguntar-me
se eu era negra.
Foi a primeira vez que percebi
quão grande era o papel
da textura do meu cabelo
na confirmação da minha etnia,
mas também que tinha
um papel fundamental
na forma como sou vista pela sociedade.
Garrett A. Morgan e Madame CJ Walker
foram pioneiros
da indústria de tratamento e beleza
do cabelo negro no início do século XX.
Ficaram conhecidos como os inventores
dos cremes à base de substâncias químicas
e dos aparelhos para alisar o cabelo,
concebidos para alterar
a textura do cabelo negro
de forma permanente ou semipermanente.
Muitas vezes quando pensamos
na história dos negros nos EUA,
pensamos nos atos hediondos
e nas várias injustiças
que sofremos como pessoas de cor
por causa da cor da nossa pele,
quando, de facto, após
a Guerra Civil Americana,
era o cabelo de um afro-americano,
homem ou mulher,
que era a maior "característica de
identificação" do estatuto social do negro
mais do que a cor da pele.
Portanto, antes de se tornarem parte
da indústria multimilionária
dos cuidados do cabelo,
a nossa dependência
dos aparelhos e produtos,
como o creme relaxante
ou o pente quente,
era mais sobre a nossa sobrevivência
e progresso como raça
nos EUA pós-escravatura.
Com o passar dos anos,
acostumámo-nos a esta ideia
de que quanto mais longo e esticado
é o cabelo, melhor e mais bonito é.
Tornámo-nos obcecados culturalmente
com esta ideia de ter aquilo
a que costumamos chamar...
"um bonito cabelo."
Isto basicamente quer dizer:
quanto menos encaracolado,
melhor é o cabelo.
E deixámos que esta institucionalização
de ideias formasse uma falsa hierarquia
que determina o que era considerado
um bom tipo de cabelo
e o que não era.
O pior é que deixámos
que estas falsas ideologias
invadissem a nossa perceção de nós mesmos,
e elas continuam a infetar
a nossa identidade cultural
como mulheres afro-americanas de hoje.
Então, o que fazíamos?
Íamos ao cabeleireiro
a cada seis ou oito semanas,
sem falta,
e submetíamos o nosso couro cabeludo
a químicos de alisamento agressivos
desde tenra idade
— às vezes com 8, 10 anos —
o que resultava em perda de cabelo,
peladas,
às vezes até queimaduras
no couro cabeludo
Fritamos o nosso cabelo a temperaturas
de 200 e tal graus Celsius ou mais,
quase diariamente,
para manter o alisamento.
Ou simplesmente tapamos o cabelo
com perucas e extensões,
só para deixarmos as raízes em paz
onde ninguém sabe
o que realmente se passa.
Adotámos estas práticas
nas nossas comunidades,
e por isso não é novidade
que hoje o aspeto típico ideal
de uma mulher negra profissional,
especialmente no mundo
empresarial americano,
tenha tendência para ter este aspeto,
em vez deste.
E certamente não terá este aspeto.
Em setembro deste ano.
um tribunal federal tornou legal
que uma empresa se recuse
a contratar um trabalhador
baseando-se no facto
de ele ou ela usar rastas.
No processo,
a gestora de contratação
em Mobile, Alabama
diz, conforme está registado:
"Não digo que o seu é desleixado,
"mas...
"sabe do que estou a falar."
Bem, do que é que ela estava a falar?
Ela achou que eram feias?
Ou talvez que fossem
demasiado afrocêntricas
com um aspeto demasiado à negro,
para o seu gosto.
Ou talvez não seja pela afrocentricidade
mas sim por serem um pouco
"urbanas" demais
para o ambiente profissional.
Talvez ela tivesse uma preocupação genuína
de que parecessem "assustadoras"
e que intimidassem os fregueses
e a sua carteira de clientes.
Todas estas palavras são
demasiadas vezes associadas
com o estigma atribuído
ao nosso penteado natural.
E isto...
Isto tem de mudar.
Em 2013,
um livro branco publicado
pelo Deloitte Center,
para a liderança e a inclusão,
estudou 3 mil indivíduos
em cargos de liderança
sobre o conceito de encobrimento
no local de trabalho
com base na aparência,
na defesa, na afiliação e na associação.
No que toca ao encobrimento
baseado na aparência
o estudo mostrou
que 67% das mulheres de cor
encobrem a sua aparência
no local de trabalho.
Do total de inquiridos que confessaram
esconder a sua aparência,
82% disseram que era algo
extremamente importante
para elas, para a sua
evolução profissional.
Esta é Ursula Burns.
É a primeira afro-americana diretora
executiva de uma empresa Fortune 500
— da Xerox.
É conhecida pelo seu visual,
que podem ver aqui.
Uma africana baixa, com um bom corte,
de unhas bem cuidadas.
Ms. Burns é uma pessoa a que gostamos
de chamar uma "rapariga natural."
Ela está a preparar o caminho
e a mostrar-nos que é possível
uma mulher afro-americana
avançar na carreira
e usar penteados naturais.
Mas hoje em dia, a maioria
das mulheres afro-americanas
que continuamos a ver como líderes,
ícones e modelos a seguir,
continuam a optar por ter cabelos lisos.
Ora bem,
talvez seja porque querem
— porque é assim que se sentem bem —
mas talvez
— e aposto —
algumas delas se tenham sentido
obrigadas a fazê-lo
de modo a ter o sucesso
que alcançaram presentemente.
Há um movimento de cabelo natural
que está a ganhar força no país
e também nalgumas partes da Europa.
Milhões de mulheres estão a explorar
o que significa ter o cabelo natural,
e estão a cortar anos e anos
de pontas secas e estragadas
para restaurar o padrão
encaracolado e natural.
Eu sei porque tenho sido uma defensora
e embaixadora deste movimento
há quase três anos.
Depois de 27 anos de calor excessivo
e produtos químicos agressivos,
o meu cabelo começou a mostrar
sinais extremos de desgaste.
Partia-se,
estava fininho,
tinha um aspeto seco e quebradiço.
Todos estes anos a tentar alcançar
aquela imagem convencional de beleza
que vimos há pouco
começaram a fazer-se sentir.
Queria fazer alguma coisa quanto a isso,
por isso comecei aquilo a que chamei
"O Desafio contra o Calor,"
no qual me abstive de usar aparelhos
de aquecimento no meu cabelo
durante seis meses.
E como um bom membro
da geração da Internet,
documentei isso nas redes sociais.
(Risos)
Documentei como eu,
relutantemente,
cortara oito a dez centímetros
do meu querido cabelo.
Documentei a minha dificuldade
em dominar estes penteados naturais,
e também a minha dificuldade
em aceitá-los
e em achar que eram realmente bonitos.
E documentei como a textura do meu cabelo
começou a mudar aos poucos.
Ao partilhar abertamente o meu percurso,
aprendi que não era a única mulher
a passar por isto
e que de facto existiam milhares
e milhares de outras mulheres
que ansiavam por fazer o mesmo.
Por isso vinham falar comigo e diziam:
"Cheyenne, como fizeste
aquele penteado natural
"que eu vi no outro dia?
"Que produtos é que começaste a usar
"que sejam melhores
para a textura do meu cabelo
"agora que ele está a mudar?"
Ou: "Quais são alguns dos teus hábitos
de tratamento do cabelo natural
"que eu devia adotar para restaurar
a saúde do meu cabelo?"
Mas também descobri que havia
um grande número de mulheres
que estavam extremamente hesitantes
em dar o primeiro passo
porque estavam paralisadas pelo medo.
O medo do desconhecido
— qual seria o seu aspeto depois?
Como é que se iam sentir-se consigo mesmas
com estes penteados naturais?
E acima de tudo,
como é que os outros iam olhar para elas?
Nos últimos três anos
depois de inúmeras conversas com amigas
e também com estranhas de todo o mundo
aprendi algumas coisas muito importantes
sobre a relação entre a identidade das
mulheres afro-americanas e o seu cabelo.
E, por isso, quando penso
naquela gerente de contratação
em Mobile, Alabama, eu diria:
"Honestamente, não.
"Não sabemos do que você está a falar."
Mas estas são algumas
das coisas que sabemos.
Sabemos que, quando as mulheres negras
gostam do seu cabelo natural,
isso ajuda a inverter
a ideia que nos ensinam
de que o cabelo negro
natural não é bonito,
ou que é algo para se esconder ou tapar.
Sabemos que as mulheres negras
expressam a sua individualidade
e sentem-se mais poderosas
ao experimentar diferentes
penteados regularmente.
Também sabemos
que, quando somos convidadas a usar
o cabelo natural no local de trabalho,
isso reforça que somos
excecionalmente valorizadas
e, consequentemente, isso ajuda-nos
a crescer e avançar profissionalmente.
Deixo-vos com isto.
Numa época de tensão racial e social,
abraçar este movimento
e outros deste género
ajuda-nos a erguermo-nos
de entre as limitações do status quo.
Por isso, quando virem uma mulher
com tranças ou rastas pelas costas abaixo,
ou repararem na vossa colega
que deixou de alisar o cabelo
para ir trabalhar,
não se limitem a abordá-la, a admirá-la
e a pedirem para lhe mexer no cabelo.
(Risos)
Valorizem-na de verdade.
Aplaudam-na.
Caramba, deem-lhe mesmo mais cinco
se for isso que desejam fazer.
Porque isto
é mais do que um penteado.
É amor próprio e autoestima.
É ser suficientemente corajosa
para não se deixar pressionar
pelas expetativas dos outros.
E saber que decidir afastar-se da norma
não define quem somos
mas sim revela quem somos.
E por fim,
ser corajosa é mais fácil
quando podemos contar
com a empatia dos outros.
Por isso, a partir de hoje,
espero poder contar com todos vocês.
Obrigada.
(Aplausos)