No filme "Interestelar", temos uma visão detalhada de um buraco negro supermassivo. Em contraste com um fundo de gás brilhante, a força gravitacional massiva do buraco negro direciona a luz em um círculo. No entanto, essa não é uma fotografia real, mas uma versão de computação gráfica, uma interpretação do que pode ser a aparência de um buraco negro. Cem anos atrás, Albert Einstein publicou sua teoria da relatividade geral. Desde então, cientistas já apresentaram muitos indícios que a confirmam. Mas algo previsto nessa teoria, os buracos negros, ainda não foi observado diretamente. Embora tenhamos uma ideia sobre a aparência de um buraco negro, na verdade, nunca fotografamos um. Entretanto, ficarão espantados em saber que talvez vejamos a primeira fotografia de um buraco negro nos próximos anos. Para isso, será necessária uma equipe internacional de cientistas, um telescópio do tamanho da Terra e um algorítimo que monta a imagem final. Não poderei mostrar uma fotografia real de um buraco negro hoje, mas quero dar a vocês uma breve visão do esforço envolvido em conseguir essa primeira foto. Meu nome é Katie Bouman e sou doutoranda no MIT. Faço pesquisas em um laboratório que tenta fazer com que computadores vejam além de imagens e vídeo. Apesar de não ser astrônoma, hoje quero mostrar como pude contribuir para esse interessante projeto. Se olharem além das luzes da cidade hoje, poderão ter a sorte de uma vista deslumbrante da Via Láctea. E, se olhassem além das milhões de estrelas, 26 mil anos-luz em direção ao interior do espiral da Via Láctea, encontrariam um aglomerado de estrelas bem ao centro. Espiando além da poeira galáctica com telescópios de infravermelho, astrônomos vêm observando essas estrelas por mais de 16 anos. Mas o mais espetacular é o que eles não veem. Essas estrelas parecem orbitar em torno de um objeto invisível. Monitorando o trajeto dessas estrelas, astrônomos concluíram que a única coisa pequena e pesada o suficiente para gerar o movimento é um buraco negro supermassivo, um objeto tão denso que suga tudo que passa por perto, até a luz. Mas o que acontece se olharmos mais a fundo? É possível enxergar algo que, por definição, é impossível de ser visto? Ocorre que, se dermos um close ao comprimento de ondas de rádio, esperamos ver um círculo de luz gerado pela lente gravitacional do plasma quente movendo-se em torno do buraco negro. Ou seja, o buraco negro lança uma sombra nesse cenário de material brilhante, criando uma esfera de escuridão. Esse círculo brilhante revela o horizonte de eventos do buraco negro, no qual a força gravitacional torna-se tão intensa que nem a luz consegue escapar. As equações de Einstein preveem tamanho e forma do círculo, então fotografá-lo não seria apenas legal: também ajudaria a verificar se as equações se sustentam nas situações extremas ao redor do buraco negro. No entanto, esse buraco negro está tão distante de nós que, da Terra, esse círculo aparece incrivelmente pequeno: do mesmo tamanho de uma laranja na superfície da Lua. Isso faz com que seja extremamente difícil fotografá-lo. Mas por quê? Tudo se resume a uma simples equação. Devido a um fenômeno chamado difração, há limites fundamentais para os menores objetos que conseguimos ver. Essa equação governante diz que, para vermos coisas cada vez menores, precisamos construir telescópios cada vez maiores. Mas, até com os telescópios ópticos mais potentes aqui na Terra, não chegamos nem perto da resolução necessária para retratar a superfície da Lua. Aliás, mostro aqui uma das imagens com maior resolução já tiradas da Lua daqui da Terra. Possui aproximadamente 13 mil pixels, e, ainda, cada pixel contém 1,5 milhões de laranjas. Então, quão grande deve ser o telescópio para podermos ver uma laranja na superfície da Lua e, por extensão, nosso buraco negro? Bem, analisando os números, calculamos facilmente que precisaríamos de um telescópio do tamanho da Terra. (Risos) Se conseguíssemos construir esse telescópio, poderíamos começar a avistar esse distinto círculo de luz que indica o horizonte de eventos do buraco negro. Essa fotografia não mostraria todos os detalhes que vemos nas versões de computação gráfica, mas permitiria que tivéssemos a primeira visão do ambiente intermediário ao redor do buraco negro. No entanto, como podem imaginar, construir um telescópio do tamanho da Terra é impossível. Mas, nas palavras de Mick Jagger: "Você nem sempre consegue o que quer, mas, se tentar, às vezes, vai perceber que consegue o que precisa". Conectando telescópios do mundo todo, uma parceria internacional chamada Event Horizon Telescope está criando um telescópio computacional do tamanho da Terra que soluciona estruturação no nível do horizonte de eventos do buraco negro. Essa rede de telescópios deve tirar a primeira foto de um buraco negro no ano que vem. Todos os telescópios nessa rede mundial trabalham juntos. Ligados pelo horário preciso dos relógios atômicos, as equipes de pesquisadores em cada local congelam a luz coletando milhares de terabytes em dados. Esses dados são processados em um laboratório aqui em Massachusetts. Então, como funciona isso? Lembram-se de que, para vermos o buraco negro no centro na galáxia, precisamos construir aquele telescópio do tamanho da Terra? Por um momento, vamos imaginar que conseguimos construir esse telescópio. Seria como transformar a Terra em uma bola de espelhos gigante. Cada espelho receberia luz que poderíamos, então, juntar para formar uma imagem. Agora, imaginem que removamos a maior parte dos espelhos, deixando restar apenas alguns. Ainda poderíamos juntar essas informações, mas agora há muitos buracos. Os espelhos restantes representam os locais onde temos telescópios. É um número incrivelmente pequeno de leituras para formar uma imagem. Mas, apesar de só recebermos luz em alguns locais, conforme a Terra gira, podemos ver outras leituras. Ou seja, conforme a bola de espelhos gira, os espelhos mudam de lugar e podemos observar partes diferentes da imagem. Os algorítimos de imagem que desenvolvemos preenchem os espaços na bola de espelhos para reconstruir a imagem subjacente do buraco negro. Se tivéssemos telescópios em todos os lugares do globo, ou seja, a bola de discos inteira, isso seria trivial. No entanto, vemos apenas algumas amostras e, por isso, há um número infinito de imagens possíveis que são coerentes com as leituras dos telescópios. Mas nem todas as imagens são criadas igualmente. Algumas parecem mais com nossa ideia de imagem do que outras. Meu papel ao ajudar a fotografar o buraco negro pela primeira vez é desenvolver algorítimos que encontrem a imagem mais aceitável que se encaixe nas leituras do telescópio. Assim como desenhistas forenses usam descrições limitadas para reconstruir uma fotografia com conhecimento em estruturas faciais, os algorítimos que desenvolvo usam dados limitados do telescópio para nos levar a uma imagem que também se pareça com as substâncias no universo. Usando esses algorítimos, podemos reconstruir imagens a partir desses poucos dados ruidosos. Aqui está um exemplo de reconstrução feita com dados simulados, em que simulamos apontar os telescópios para o buraco negro no centro da galáxia. Apesar de ser apenas uma simulação, esse tipo de reconstrução nos dá esperança de que logo poderemos, de fato, fotografar um buraco negro e, a partir disso, determinar sua circunferência. Gostaria muito de falar sobre os detalhes desse algorítimo, mas, para a sorte de vocês, não temos tempo. Ainda assim, quero dar uma breve noção sobre como definimos a aparência do universo e como usamos isso para reconstruir e verificar nossos resultados. Como há um número infinito de imagens possíveis, que bem explicam as determinações do telescópio, temos que escolher entre elas de alguma forma. Fazemos isso classificando as imagens com base na probabilidade de serem imagens do buraco negro e escolhendo a mais provável. O que isso significa? Imaginem que tentamos montar um modelo que mostra a probabilidade de uma imagem aparecer no Facebook. Seria preferível que ele mostrasse que é bem improvável que alguém poste essa imagem ruidosa à esquerda, e que é bem provável que alguém poste uma "selfie" como a da direita. A imagem ao centro está desfocada, então, embora seja mais provável vê-la no Facebook do que a imagem ruidosa, é menos provável vê-la ao compará-la com a "selfie". Mas, quando se trata de imagens do buraco negro, deparamo-nos com um enigma: nunca vimos um buraco negro. Então, como deve ser a imagem de um buraco negro, e o que supor sobre a estrutura dos buracos negros? Podemos tentar usar imagens de simulações que fizemos, como a imagem do buraco negro de "Interestelar", mas, se fizermos isso, podemos causar sérios problemas. O que aconteceria se a teoria de Einstein não fosse sustentada? Ainda íamos querer reconstruir um cenário preciso do que estava acontecendo. Se incorporarmos demais as equações de Einstein em nossos algorítimos, vamos acabar vendo o que esperamos ver. Queremos deixar as opções em aberto para caso haja um elefante gigante no centro da galáxia. (Risos) Tipos diferentes de imagens têm características bem distintas. Podemos diferenciar facilmente imagens de simulação do buraco negro das fotos tiradas todos os dias aqui na Terra. Precisamos saber dizer aos algorítimos como as imagens são sem aplicar somente um tipo de característica. Uma forma de contornarmos isso é aplicando características de diferentes tipos de imagens para ver como o tipo de imagem que adotamos afeta as reconstruções. Se todos os tipos de imagem produzem uma imagem similar, podemos começar a ficar mais confiantes de que as suposições que estamos fazendo não influenciam muito a foto. É quase como dar a mesma descrição a três desenhistas de diferentes partes do mundo. Se todos produzirem um rosto parecido, podemos começar a confiar que não estão aplicando suas tendências culturais nos desenhos. Uma forma de aplicarmos diferentes características de imagem é usando partes de imagens existentes. Pegamos um grande conjunto de imagens e as repartimos em pequenos pedaços. Podemos considerar cada pedaço uma peça de quebra-cabeça. E utilizamos peças comumente vistas para montar uma imagem que se encaixa nas leituras do telescópio. Tipos diferentes de imagens têm conjuntos diferentes de peças. Então, o que acontece quando pegamos os mesmos dados mas usamos conjuntos diferentes de peças para reconstruir a imagem? Vamos começar com as peças da simulação da imagem do buraco negro. Bem, parece aceitável. É como esperamos que seja um buraco negro. Mas será que a obtivemos porque utilizamos partes de imagens de simulação do buraco negro? Vamos tentar outro conjunto de peças de outros objetos astronômicos. Conseguimos uma imagem semelhante. E que tal partes de imagens cotidianas, como as fotos que tiramos com nossas câmeras? Ótimo, vemos a mesma imagem. Quando obtemos a mesma imagem de todos os conjuntos de peças, podemos começar a ficar mais confiantes de que as suposições que fazemos não influenciam muito a imagem final. Também podemos pegar o mesmo conjunto de peças, como aquelas extraídas de imagens cotidianas, e usá-las para reconstruir vários tipos diferentes de imagens originais. Então, nas simulações, imaginamos que um buraco negro se parece com outros objetos astronômicos, bem como imagens cotidianas se parecem com elefantes no centro da galáxia. Quando os resultados dos algorítimos abaixo são semelhantes à simulação de imagem real acima, podemos começar a confiar em nossos algorítimos. E quero destacar aqui que todas essas images foram criadas juntando pequenas peças de fotografias cotidianas, como as que tiramos com nossas câmeras. Então, uma imagem de um buraco negro jamais vista pode ser criada se juntarmos imagens que vemos o tempo todo. Ideias de imagens como essas permitirão que tiremos as primeiras fotos de um buraco negro e, com sorte, comprovemos as famosas teorias com as quais os cientistas contam diariamente. Mas é claro que a obtenção de ideias como essas nunca teria sido possível sem a incrível equipe de pesquisadores com quem tenho o privilégio de trabalhar. Ainda me surpreende que, embora tenha começado o projeto sem conhecimento em astrofísica, o que alcançamos por meio dessa colaboração singular poderá resultar nas primeiras imagens de um buraco negro. Mas grandes projetos como o Event Horizon Telescope obtêm êxito devido a todo o conhecimento interdisciplinar que pessoas diferentes trazem. Somos uma mistura de astrônomos, físicos, matemáticos e engenheiros. Em breve, será possível alcançar algo que já foi considerado impossível. Gostaria de encorajá-los a saírem e ajudarem a ampliar os limites da ciência, mesmo que, no início, pareça tão misterioso quanto um buraco negro. Obrigada. (Aplausos)