Como pode um bafômetro medir o nível de álcool no nosso sangue, horas depois da última ingestão, com base apenas no sopro? O ar exalado dos pulmões contém vestígios de centenas, até mesmo milhares, de compostos orgânicos voláteis: pequenas moléculas, leves o bastante para viajarem facilmente como gases. Uma delas é o etanol, que consumimos em bebidas alcoólicas. Ele viaja pela corrente sanguínea, até os alvéolos pulmonares, passando para o ar exalado a uma concentração 2 mil vezes menor, em média, do que no sangue. Quando alguém sopra em um bafômetro, o etanol presente no ar exalado passa para uma câmara de reação. Lá, ele é convertido em outra molécula, chamada acido acético, em um tipo especial de reator que produz uma corrente elétrica durante a reação. A força da corrente indica a quantidade de etanol na amostra de ar, e, por conseguinte, no sangue. Além dos compostos orgânicos voláteis, como o etanol ingerido dos alimentos e das bebidas alcoólicas, os processos bioquímicos de nossas células produzem muitos outros. E quando algo interfere nesses processos, como uma doença, os compostos orgânicos voláteis presentes no ar exalado também podem variar. Será que poderíamos detectar doenças analisando o ar exalado por uma pessoa, sem exames de diagnósticos mais invasivos como biópsias, radiação e exames de sangue? Teoricamente, sim. Mas os testes de doenças são bem mais complicados que os de nível alcoólico. Para identificar doenças, os pesquisadores precisariam considerar dezenas de compostos no ar exalado. Uma dada doença pode fazer com que alguns desses compostos aumentem ou diminuam de concentração, enquanto outros talvez não mudem. É provável que o perfil seja diferente para cada doença e que possa até mesmo variar em diferentes estágios dela. Por exemplo, os tipos de câncer estão entre os candidatos mais pesquisados para o diagnóstico pela análise do ar exalado. Uma das reações bioquímicas que muitos tumores podem causar é um grande aumento em um processo de geração de energia chamado glicólise, conhecido como "Efeito Warburg", Esse aumento da glicólise eleva os metabólitos, como o lactato, que, por sua vez, podem afetar uma série de processos metabólicos e, por fim, resultar na composição alterada do ar, possivelmente incluindo uma concentração aumentada de compostos voláteis, como o sulfóxido de dimetilo. Mas o Efeito Warburg é apenas um possível indicador de atividade cancerosa e não revela nada sobre o tipo de câncer. Mais indicadores são necessários para fazer um diagnóstico. Para encontrar essas diferenças sutis, os pesquisadores comparam o ar exalado por pessoas saudáveis com o de pessoas que sofrem de alguma doença, usando perfis baseados em centenas de amostras de ar. Essa análise complexa requer um tipo de sensor bem diferente e mais versátil que o bafômetro. Alguns estão sendo desenvolvidos. Alguns diferenciam os compostos individuais, observando como eles se movem por uma série de campos elétricos. Outros utilizam uma gama de resistores feitos de diferentes materiais, os quais alteram a resistência quando expostos a uma certa mistura de compostos orgânicos voláteis. Há outros desafios também. Essas substâncias estão presentes em concentrações incrivelmente baixas, geralmente apenas partes por bilhão, muito inferiores às concentrações de etanol no ar exalado. Os níveis dos compostos podem ser influenciados por fatores além da doença, incluindo idade, gênero, alimentação e estilo de vida. Por fim, existe a necessidade de distinguir quais compostos da amostra foram produzidos no organismo do paciente e quais foram inalados no ambiente, pouco antes do teste. Em razão desses desafios, a análise do ar exalado ainda não está disponível. Mas os testes clínicos preliminares em câncer nos pulmões, no cólon e em outros tipos de câncer têm apresentado resultados encorajadores. Um dia, a detecção precoce do câncer poderá ser tão fácil quanto inspirar e expirar.