Olá a todos. Vou começar por fazer uma pergunta muito simples. É a seguinte: Quem quer criar um produto que seja cativante e envolvente como, por exemplo, o Facebook ou o Twitter? Quem quiser, levante a mão. Uma coisa tão cativante e envolvente como o Twitter. Mantenham as mãos no ar. Quem mantém a mão no ar, continue com a mão no ar se sente que gasta mais tempo do que devia em "sites" como o Facebook ou o Twitter, um tempo que seria mais bem gasto com amigos ou com os cônjuges ou a fazer coisas de que gostam. Ok. Os que ainda têm a mão no ar, conversem depois do intervalo. (Risos) Porque é que eu estou a fazer esta pergunta? Estou a fazê-la, porque hoje fala-se de persuasão moral, do que é moral e imoral em tentar alterar os comportamentos das pessoas usando a tecnologia e usando o "design". Não sei do que é que estão à espera mas, quando me pus a pensar neste problema, depressa percebi que não consigo dar-vos respostas. Não vos consigo dizer o que é moral ou imoral, porque vivemos numa sociedade pluralista. Os meus valores podem ser radicalmente diferentes dos vossos, o que significa que aquilo que considero moral ou imoral, com base neles, não será necessariamente aquilo que vocês considerarão moral ou imoral. Mas também percebi que há uma coisa que vos posso dar: aquilo que este sujeito aqui atrás, deu ao mundo... Sócrates. Ou seja, perguntas. O que eu posso fazer e gostaria de fazer convosco é dar-vos, tal como aquela pergunta inicial, um conjunto de perguntas para vocês imaginarem, camada a camada, como quem descasca uma cebola, chegarem ao âmago daquilo que acreditam ser persuasão moral ou imoral. Vou fazer isso com alguns exemplos, como disse, alguns exemplos de tecnologias em que as pessoas usaram elementos para levarem as pessoas a fazer coisas. Este é o primeiro exemplo que nos leva à primeira pergunta. É um dos meus exemplos preferidos de ludificação. O "Health Month" de Buster Benson. É uma aplicação simples em que nós estabelecemos normas de saúde para um mês. Normas como, "quero fazer exercício seis vezes por semana". Ou "não quero beber álcool". Todas as manhãs, recebemos um "email" que nos pergunta: "Cumpriste as tuas normas, ou não?" Respondemos sim ou não, às várias perguntas. Depois, na plataforma, vemos como nos comportámos. Podemos ganhar pontos e emblemas por isso. Essas informações são partilhadas com os nossos amigos e, se não cumprimos uma norma, perdemos um ponto de saúde, mas os amigos podem participar e curar-nos. Um belo exemplo, e creio que a maioria concordará comigo que tem o ar de ser uma persuasão ética, não é? Tem o ar de uma coisa que será bom fazer. Este é outro exemplo. Muito parecido, quanto ao tipo de pensamento por detrás dele, mas um exemplo muito diferente — Lockers. É uma plataforma social em que as pessoas criam um perfil. Nesse perfil, o principal é colocar imagens de produtos, imagens de produtos de que gostamos. Interligamos os perfis com os dos amigos. Sempre que eu clicar num desses produtos na vossa página, vocês recebem pontos. Sempre que vocês clicarem num produto da minha página, eu recebo pontos. Se comprarem qualquer coisa, eu recebo montes de pontos. Depois, podemos trocar esses pontos em percentagens desses produtos. Não sei o que vocês pensam, mas, pessoalmente, sinto que o Health Month é uma coisa que me parece muito benévola uma boa peça, uma peça moral de tecnologia, enquanto há qualquer coisa no Locker que me faz sentir um pouco enjoado. Ao pensar porque é que isso me faz sentir enjoado, neste caso, e não no outro, obtive uma resposta muito simples. É a intenção por detrás disso. Num caso, a intenção é: "Este 'site' quer que eu seja mais saudável, "e o outro 'site' quer que eu compre mais". Portanto, a princípio, há uma pergunta muito simples, muito óbvia, que eu vos queria fazer: Quais são as nossas intenções quando concebemos qualquer coisa? Obviamente, as intenções não são tudo, por isso, eis outro exemplo de uma destas aplicações. Neste momento, há uns quantos destes painéis de instrumentos Eco, painéis de instrumentos de automóveis, que nos motivam a obtermos o melhor rendimento de combustível. Este é o MyLeaf da Nissan, em que o nosso comportamento de condutor é comparado com o comportamento de outras pessoas. Competimos com quem conduz com o melhor rendimento de combustível Estas coisas são muito eficazes, mas são tão eficazes, que motivam as pessoas a ter uma condução pouco segura, como não parar num sinal vermelho, porque, dessa forma, terão que desligar e voltar a ligar o motor, e isso consumirá algum combustível. Apesar de ser uma aplicação com muito boas intenções, obviamente tinha um efeito lateral. Este é outro exemplo para um desses efeitos laterais. Commendable: um "site" que permite que os pais deem emblemas aos filhos por fazerem as coisas que os pais querem que os filhos façam, como atar os sapatos. A princípio, isto soa bem, muito benévolo, cheio de boas intenções. Mas acontece que, se investigarmos o quadro mental das pessoas, preocupadas com os resultados, preocupadas com o reconhecimento público, preocupadas com este tipo de prémios de reconhecimento não será propriamente grande ajuda para o bem-estar psicológico a longo-prazo. É melhor preocuparmo-nos em aprender qualquer coisa. É melhor quando nos preocupamos connosco do que como nos apresentamos diante de outras pessoas. Este tipo de instrumento de motivação que é usado, por si só, tem um efeito lateral a longo-prazo, porque, sempre que utilizamos uma tecnologia, que usa qualquer coisa como reconhecimento ou estatuto público, estamos possivelmente a interiorizar isso como uma coisa boa e normal com que nos preocuparmos. Dessa forma, poderá ter um efeito prejudicial no bem-estar psicológico a longo-prazo de nós mesmos, enquanto cultura. Assim, há uma segunda pergunta, muito óbvia. Quais são os efeitos do que fazemos, os efeitos que vamos sentindo, com o dispositivo, como menos combustível, assim como os efeitos das ferramentas que estamos a usar para levar as pessoas a fazer coisas? Reconhecimento público? É só isso... um efeito de intenções? Há algumas tecnologias que, obviamente, combinam as duas coisas. Os bons efeitos a longo-prazo e a curto-prazo e uma intenção positiva, como o "Freedom" de Fred Stutzman, em que o objetivo da aplicação é... Habitualmente, somos tão bombardeados com pedidos constantes de outras pessoas com este dispositivo, que fechamos a ligação à Internet no nosso PC durante um certo tempo pré-definido, para conseguirmos trabalhar um pouco. Penso que a maioria concordará que é uma coisa com boas intenções e também tem boas consequências. Nas palavras de Michel Foucault, é uma "tecnologia do ego". É uma tecnologia que dá poder ao indivíduo para determinar o curso da sua vida, para se modelar. Mas o problema, conforme Foucault faz notar, é que toda a tecnologia do ego tem uma tecnologia de domínio no seu lado negativo. Como vemos hoje, nas modernas democracias liberais, a sociedade, o estado, não só nos permite determinarmo-nos a nós mesmos, a modelarmo-nos, como assim o exige. Exige que nos otimizemos, que nos controlemos, que estejamos sempre a autogerirmo-nos, porque é a única forma de uma sociedade liberal funcionar. De certa forma, o tipo de dispositivos como o "Freedom" de Fred Stutzman, ou o "Health Month" de Buster Benson, são tecnologias de domínio, porque querem que nós sejamos (Voz de robô) mais adaptados, mais felizes, mais produtivos, mais confortáveis, que não bebamos demais, que façamos exercício no ginásio três vezes por semana, que nos demos melhor com os nossos sócios ou empregados da altura. À vontade. Comendo bem. Sem jantares de micro-ondas e saturados de gorduras. Um condutor paciente, melhor condutor, um carro mais seguro. que durma bem, sem pesadelos. SD: Estas tecnologias querem que nós continuemos no jogo que a sociedade concebeu para nós. Querem que nos encaixemos cada vez melhor. Querem que nós nos otimizemos para nos encaixarmos. Não estou a dizer que é propriamente uma coisa má. Mas penso que este exemplo aponta-nos uma perceção geral que é: qualquer que seja a tecnologia ou "design" para que olhemos, mesmo uma coisa que consideramos bem-intencionada, e tão boa nos seus efeitos como o "Freedom" de Stutzman, tem sempre incorporados determinados valores. Podemos pôr em causa esses valores. Podemos perguntar: Será uma coisa boa que estejamos sempre a otimizarmo-nos, para nos encaixarmos melhor nesta sociedade? Ou, para vos dar outro exemplo, aquele que apresentei inicialmente: Que tal um pedaço de tecnologia persuasiva que convença as muçulmanas a usar os seus véus? Será uma tecnologia boa ou má nas suas intenções ou nos seus efeitos? Basicamente, isso depende do tipo de valores que tivermos para fazer este tipo de julgamento. Então, uma terceira pergunta: Que valores pensamos que usamos? E, por falar de valores, reparei que, na análise da persuasão moral "online" e quando falo com pessoas, mais frequentemente do que não, há um preconceito estranho. Esse preconceito é que perguntamos: Isto ou aquilo "ainda" é ético? "Ainda" é aceitável? Perguntamos coisas como: "Ainda" é aceitável aquele formulário Oxfam de doação em que, por defeito, se estabelece uma doação mensal, e as pessoas, talvez sem terem essa intenção, são encorajadas ou empurradas para fazer uma doação regular em vez de uma doação única, isso "ainda" é aceitável, "ainda" é ético? Andamos a pescar em águas turvas. Com efeito, esta pergunta, " 'Ainda' é ético?" é apenas uma das formas de olhar para a ética. Porque, se olharmos para o início da ética na cultura ocidental, vemos uma ideia muito diferente do que a ética também pode ser. Para Aristóteles, por exemplo, não se tratava da pergunta "Isto ainda é bom, ou é mau?" A ética tratava da questão de como viver bem a vida. Ele colocou isso na palavra "arête", que nós traduzimos do latim por "virtude", mas que, na realidade, significa "excelência". Significa viver com o potencial total de um ser humano. Penso que esta é uma ideia que Paul Richard Buchanan transmitiu brilhantemente num ensaio recente, em que disse: "Os produtos são argumentos vivos "sobre como devemos viver a nossa vida". Os nossos "designs" não são éticos nem deixam de o ser, lá por usarem meios de persuasão éticos ou pouco éticos. Têm um componente moral no tipo de visão e na aspiração de uma vida boa que nos apresentam. Se olharmos para o ambiente concebido, à nossa volta, com este tipo de lentes e perguntarmos: "Qual é a visão de uma vida boa "que os nossos produtos, o nosso 'design' nos apresentam?" sentiremos calafrios, por causa de quão pouco esperamos uns dos outros, de quão pouco esperamos da nossa vida e de como parece uma vida boa. Há uma quarta pergunta com que vos queria deixar: Que visão de uma vida boa transmitem os nossos "designs"? Por falar de "design", hão de reparar que já alarguei a discussão porque já não é só de tecnologia persuasiva que estamos a falar é de qualquer peça de "design" que pomos no mundo. Não sei se vocês sabem, o grande investigador e comunicador Paul Watzlawick que, nos anos 60, afirmou que não podemos deixar de comunicar. Mesmo que optemos por estar calados, que escolhamos o silêncio, comunicamos qualquer coisa ao escolhermos estar calados. Do mesmo modo que não podemos não comunicar, não podemos deixar de persuadir, façamos o que façamos ou nos abstenhamos de fazer, tudo o que pusermos no mundo, cada peça de "design", tem um componente persuasivo. Tenta afetar as pessoas. Coloca uma certa visão de uma vida boa em frente de nós. É o que diz Peter-Paul Verbeek, o filósofo holandês da tecnologia: "Quer nós, os "designers" tencionemos ou não, "materializamos a moral". Tornamos determinadas coisas mais difíceis e mais fáceis de fazer. Organizamos a existência das pessoas. Colocamos uma determinada visão do que é bom ou mau ou normal ou habitual em frente das pessoas, com tudo o que pomos cá fora no mundo. Mesmo uma coisa tão inócua como um conjunto de cadeiras escolares como o conjunto de cadeiras em que estão sentados e eu estou sentado à vossa frente, é uma tecnologia persuasiva, porque apresenta e materializa uma certa visão de uma vida boa. Uma vida boa em que ensinar, aprender e escutar significa uma pessoa a ensinar e as outras a escutar; significa que a aprendizagem se faz sentados, significa que aprendemos por nós mesmos, significa que não devemos alterar estas regras, porque as cadeiras estão presas ao chão. E mesmo uma coisa tão inócua com uma cadeira de "design" simples como esta de Arne Jacobsen, é uma tecnologia persuasiva, porque, de novo, comunica uma ideia de uma vida boa, uma vida boa que nós, enquanto "designers", aceitamos, dizendo: "Numa vida boa, os bens são produzidos de forma sustentável ou insustentável "como esta cadeira. "Os trabalhadores são tratados tão bem ou tão mal "como foram tratados os que construíram esta cadeira". Uma vida boa é uma vida em que o "design" é importante porque alguém despendeu tempo e dinheiro, por este tipo de cadeira bem concebida, em que a tradição é importante; porque é um clássico tradicional e alguém se preocupou com isso; e em que há qualquer coisa como um consumo conspícuo, em que é correto e normal gastar uma soma extravagante de dinheiro nesta cadeira, para indicar às outras pessoas qual é o nosso estatuto social. São estes tipos de camadas, os tipos de perguntas que eu queria fazer-vos hoje: Quais são as intenções que vocês transportam quando estão a conceber qualquer coisa? Quais são os efeitos, intencionais ou não, que estão a ter? Quais são os valores que utilizam para os avaliar? Quais são as virtudes, as aspirações que estão a exprimir nisso? Como é que isso se aplica, não apenas à tecnologia persuasiva, mas a tudo o que concebem? Ficamos por aí? Penso que não. Penso que todas essas coisas acabam por refletir o âmago de tudo isto e isto não é mais do que a própria vida. Se a pergunta sobre o que é uma vida boa reflete tudo aquilo que concebemos, porque é que não suspendemos o "design" e nos interrogamos: "Como é que isso se aplica na nossa vida?" "Porque é que o candeeiro, ou a casa "devem ser um objeto de arte e a nossa vida não?" como Michel Foucault disse. Só para vos dar um exemplo prático de Buster Benson, que referi no início. Este é Buster a montar uma máquina de flexões no gabinete da sua nova "startup" Habit Labs, onde estão a tentar criar outras aplicações como o "Health Month" para as pessoas. Porque é que ele está a construir uma coisa destas? Este é o conjunto de axiomas que a Habit Labs, a "startup" de Buster, adotou sobre como queriam trabalhar juntos, enquanto equipa, quando estivessem a criar estas aplicações. Um conjunto de princípios morais que estabeleceram para trabalharem em conjunto. Um deles é: "Cuidamos da nossa saúde e gerimos o nosso cansaço". Porque, em última análise, como poderemos interrogar-nos e como poderemos encontrar resposta sobre qual a visão de uma vida boa queremos transmitir e criar com os nossos "designs" sem fazer esta pergunta: "Que visão de uma vida boa queremos viver?" E com isso, Obrigado. (Aplausos)