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Será que a beleza pode abrir os nossos corações às conversas difíceis?

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    Acredito que há beleza
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    em ouvirmos as vozes das pessoas
    que não foram ouvidas.
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    [Abrindo as cortinas, 2014]
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    [O projeto de Jerome
    (asfalto e giz) III, 2014]
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    [Sob um sol que não perdoa
    (de um espaço tropical]
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    É uma ideia complexa,
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    porque as coisas que têm de ser ditas
    nem sempre são agradáveis.
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    [A distância entre o que temos
    e o que queremos (num espaço tropical)]
  • 0:26 - 0:29
    Mas ainda assim, se reflectem a verdade,
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    acho que, fundamentalmente,
    isso as torna belas.
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    Há a beleza estética do trabalho
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    [Terra e céu, 2012]
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    que, às vezes, funciona
    como um cavalo de Troia.
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    [Custo da retirada, 2017]
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    Permite-nos abrir os nossos corações
    a conversas difíceis.
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    [Vendo através do tempo, 2019]
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    Talvez nos sintamos atraídos pela beleza,
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    e enquanto a técnica nos obriga,
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    a cor,
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    a forma ou composição,
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    talvez a conversa difícil
    se intrometa.
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    [Retratos de alcatrão
    de Billy Lee e Ona Judge, 2016]
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    Aprendi a pintar sozinho,
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    passando tempo em museus
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    e olhando para as pessoas
    — ou melhor, os artistas —
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    de quem me disseram
    ser os mestres.
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    Ao olhar para os Rembrandt
    [A Ronda da Noite],
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    os Renoir [O Almoço dos Barqueiros],
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    os Manet [Almoço na relva],
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    torna-se evidente
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    que, se quero aprender
    a pintar um auto-retrato
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    ao estudar estes pintores,
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    vou ter um problema
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    quando tiver de misturar
    a cor da minha pele
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    ou da pele das pessoas na minha família.
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    Há fórmulas históricas, escritas,
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    a dizerem-me como pintar pele branca,
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    — que cores devo usar para a sub-pintura,
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    que cores devo usar para
    os realces do impasto —
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    coisa que não existe para a pele escura.
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    Não há nada.
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    Não há nada,
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    porque a realidade é que
    a nossa pele não era considerada bela.
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    A imagem, o mundo representado
    na história da pintura
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    não me reflecte.
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    Não reflecte as coisas a que dou valor,
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    e esse é o conflito com que me deparo
    com tanta frequência.
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    Adoro a técnica destes quadros,
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    aprendi com a técnica destes quadros,
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    e apesar disso, sei que eles
    não têm nada a ver comigo.
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    E por isso há tantos de nós
    a corrigir esta história,
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    só para podermos dizer
    que lá estivemos.
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    Lá porque não conseguem ver-nos
    não significa que não estivéssemos lá.
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    Estivemos ali, sim.
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    Estivemos aqui.
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    Continuámos a ser vistos
    como se não fôssemos belos,
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    mas somos,
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    e estamos aqui.
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    Tantas das coisas que produzo
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    acabam por ser tentativas falhadas
    de reforçar essa ideia.
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    [Abrindo as cortinas, 2014]
  • 3:28 - 3:30
    [Ver através do tempo, 2018]
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    Embora a minha formação
    tenha sido ocidental,
  • 3:36 - 3:40
    os meus olhos continuam atentos
    às pessoas que se parecem comigo.
  • 3:40 - 3:42
    Por isso, às vezes, no meu trabalho,
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    tenho usado estratégias como
    branquear o resto da composição
  • 3:49 - 3:54
    para pôr o foco numa personagem
    que, de outro modo, ficaria invisível.
  • 3:54 - 4:00
    Já recortei outras figuras da pintura,
  • 4:00 - 4:02
    primeiro, para realçar a sua ausência,
  • 4:02 - 4:08
    ou segundo, para colocar o foco
    nas outras figuras da composição.
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    [Intravenoso
    (de um espaço tropical), 2020]
  • 4:10 - 4:15
    "O Projecto Jerónimo", esteticamente,
    bebe em centenas de anos
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    de pinturas de iconografia religiosa,
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    [O projecto Jerónimo
    (a minha perda), 2014]
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    um tipo de estrutura estética
    que era reservada para a Igreja,
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    reservada para os santos.
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    [Madona com o menino]
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    [Folha dum salmo grego
    e Novo Testamento"]
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    [Cristo Todo-Poderoso]
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    É um projecto que explora
    o sistema de justiça criminal,
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    sem perguntar "Estas pessoas
    são inocentes ou culpadas?",
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    mas antes "É assim que devemos
    lidar com os nossos cidadãos?"
  • 4:49 - 4:51
    Comecei este trabalho
  • 4:51 - 4:55
    porque, depois de estar
    separado do meu pai
  • 4:55 - 4:57
    durante quase 15 anos,
  • 4:57 - 5:01
    voltei a estar em contacto com ele.
  • 5:03 - 5:07
    Não sabia como arranjar espaço
    para ele na minha vida.
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    Tal como a maioria das coisas
    que não entendo,
  • 5:11 - 5:13
    tento compreendê-las no estúdio.
  • 5:13 - 5:17
    Por isso comecei a fazer
    uns retratos criminais,
  • 5:17 - 5:21
    que comecei a fazer porque
    pesquisei o meu pai no Google,
  • 5:21 - 5:24
    perguntando-me que teria acontecido
    durante aqueles 15 anos.
  • 5:24 - 5:26
    Onde é que ele tinha ido?
  • 5:26 - 5:29
    E encontrei o retrato criminal dele,
    o que não me surpreendeu.
  • 5:29 - 5:34
    Mas nessa primeira pesquisa,
    encontrei mais 97 homens negros
  • 5:34 - 5:36
    exactamente com o mesmo
    primeiro e último nome,
  • 5:36 - 5:40
    e encontrei os retratos criminais deles,
    e isso sim, foi uma surpresa.
  • 5:40 - 5:42
    Não sabendo o que fazer,
  • 5:42 - 5:44
    acabei por começar a pintá-los.
  • 5:45 - 5:49
    Inicialmente, o alcatrão
    era uma fórmula para entender
  • 5:49 - 5:54
    quanto das vidas destes homens
    se tinha perdido na prisão.
  • 5:54 - 5:56
    Mas desisti disso,
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    e o alcatrão tornou-se bem mais simbólico
  • 5:59 - 6:00
    à medida que continuei,
  • 6:00 - 6:02
    porque o que entendi
  • 6:02 - 6:05
    foi que a quantidade de tempo
    que perdemos na prisão
  • 6:05 - 6:07
    é apenas o início de todo o tempo
  • 6:07 - 6:09
    em que sofreremos o seu impacto
    ao longo da vida.
  • 6:09 - 6:12
    Então, em termos de beleza nesse contexto,
  • 6:13 - 6:17
    sei através dos familiares dum amigo meu
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    que estiveram na prisão,
  • 6:19 - 6:21
    ou que lá estão actualmente,
  • 6:21 - 6:23
    as pessoas querem ser lembradas.
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    Querem ser vistas.
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    Nós prendemos as pessoas
    durante muito tempo,
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    em certos casos,
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    pela única coisa pior
    que alguma vez fizeram.
  • 6:33 - 6:35
    Até certo ponto,
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    é uma forma de dizer,
  • 6:39 - 6:40
    "Estou a ver-te.
  • 6:40 - 6:42
    "Estamos a ver-te."
  • 6:42 - 6:48
    E acho que esse gesto é belo.
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    Na pintura
    "Por trás do mito da benevolência",
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    há uma cortina com Thomas Jefferson
  • 6:56 - 7:03
    pintada e repuxada para revelar
    uma mulher negra escondida.
  • 7:03 - 7:08
    Esta mulher negra é,
    simultaneamente, Sally Hemings,
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    mas também todas as outras mulheres negras
  • 7:11 - 7:14
    na plantação de Monticello
  • 7:14 - 7:16
    e todas as demais.
  • 7:16 - 7:19
    Aquilo que sabemos sobre Thomas Jefferson
  • 7:19 - 7:22
    é que ele acreditava na liberdade,
  • 7:22 - 7:26
    talvez com mais força do que todos
    os outros que escreveram sobre isso.
  • 7:26 - 7:29
    E se sabemos que isso é verdade,
    se acreditarmos nisso,
  • 7:29 - 7:33
    então a única coisa benevolente
    para fazer nesse contexto
  • 7:33 - 7:37
    seria estender essa liberdade.
  • 7:37 - 7:39
    E então, neste trabalho,
  • 7:39 - 7:43
    uso duas pinturas diferentes
  • 7:43 - 7:48
    que são forçadas a conviver
    uma sobre a outra
  • 7:48 - 7:55
    para realçar a relação tumultuosa
    entre negros e brancos
  • 7:55 - 7:57
    nestas composições.
  • 7:57 - 8:01
    E então, essa contradição,
  • 8:01 - 8:06
    essa realidade devastadora
    que está sempre por trás da cortina,
  • 8:06 - 8:11
    o que sucede nas relações raciais
    neste país —
  • 8:12 - 8:15
    esta pintura é sobre isso.
  • 8:19 - 8:23
    Este quadro chama-se
    Outra luta pela memória.
  • 8:23 - 8:25
    O título fala de repetição.
  • 8:25 - 8:32
    O título fala dum tipo
    de violência contra negros
  • 8:32 - 8:34
    pela polícia
  • 8:34 - 8:37
    que já aconteceu
    e continua a acontecer,
  • 8:37 - 8:40
    e agora temo-la visto acontecer outra vez.
  • 8:41 - 8:47
    O quadro é mais ou menos editado
    como um quadro sobre Ferguson.
  • 8:48 - 8:50
    Não deixa de ser sobre Ferguson,
  • 8:51 - 8:56
    mas também não deixa de ser sobre Detroit,
  • 8:56 - 9:01
    nem deixa de ser sobre Minneapolis.
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    Comecei o quadro porque,
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    durante uma viagem a Nova Iorque,
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    em que tinha ido ver a minha arte
    com o meu irmão,
  • 9:12 - 9:15
    passámos horas e horas
    a entrar e a sair de galerias,
  • 9:15 - 9:22
    o dia culminou com
    um carro de polícia à paisana
  • 9:22 - 9:23
    a mandar-nos parar no meio da rua.
  • 9:23 - 9:26
    Estes dois polícias
    com as mãos nas armas
  • 9:26 - 9:28
    mandaram-nos parar.
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    Puseram-nos contra a parede.
  • 9:29 - 9:33
    Acusaram-me de roubar obras de arte
  • 9:33 - 9:37
    duma galeria onde, na verdade,
    eu estava a exibir as minhas obras.
  • 9:37 - 9:40
    E enquanto eles estavam ali
    com as mãos nas armas,
  • 9:40 - 9:45
    perguntei ao polícia
    o que era diferente da minha cidadania
  • 9:45 - 9:48
    da de todas as outras pessoas
  • 9:48 - 9:52
    que não estavam a ser incomodadas
    naquele momento.
  • 9:52 - 9:56
    Ele informou-me que nos andavam
    a seguir há duas horas
  • 9:56 - 10:00
    e que tinham recebido queixas
    acerca de dois homens negros
  • 10:00 - 10:03
    dois homens negros
    a entrar e a sair de galerias.
  • 10:04 - 10:08
    O quadro é sobre a realidade,
  • 10:09 - 10:11
    que nem sequer é uma questão
  • 10:12 - 10:16
    de se isto vai acontecer outra vez,
  • 10:16 - 10:18
    é uma questão de quando.
  • 10:21 - 10:24
    Este trabalho mais recente
    chama-se De um espaço tropical.
  • 10:24 - 10:28
    Esta série de quadros
    é sobre mães negras.
  • 10:28 - 10:34
    Esta série de quadros tem lugar
    no mundo super saturado,
  • 10:34 - 10:37
    talvez surrealista,
  • 10:37 - 10:40
    não distante daquele em que vivemos.
  • 10:40 - 10:42
    Mas neste mundo,
  • 10:42 - 10:45
    os filhos destas mulheres negras
  • 10:46 - 10:48
    estão a desaparecer.
  • 10:49 - 10:53
    O tema deste trabalho é o trauma,
  • 10:53 - 10:57
    aquilo que as mulheres negras
    e de cor, em particular,
  • 10:57 - 10:58
    na nossa comunidade
  • 10:58 - 11:03
    têm de enfrentar
    para encaminharem os filhos
  • 11:03 - 11:05
    para o caminho da vida.
  • 11:06 - 11:08
    O mais encorajador para mim
  • 11:08 - 11:13
    é que esta prática
  • 11:13 - 11:16
    deu-me a oportunidade
  • 11:16 - 11:20
    de trabalhar com os jovens
    da minha comunidade.
  • 11:20 - 11:23
    Tenho a certeza
    de que as respostas não estão em mim,
  • 11:23 - 11:24
    mas se tenho esperança,
  • 11:24 - 11:27
    é de que essas respostas
    estejam neles.
  • 11:27 - 11:31
    O NXTHVN é um projecto
    que começou há cerca de cinco anos.
  • 11:32 - 11:35
    O NXTHVN é uma incubadora de arte
    com uns 3700 metros quadrados
  • 11:35 - 11:37
    no centro do bairro de Dixwell
  • 11:37 - 11:39
    em New Haven, Connecticut.
  • 11:39 - 11:42
    Este bairro é predominantemente negro.
  • 11:42 - 11:48
    É um bairro com a história do "jazz"
    em cada esquina.
  • 11:48 - 11:52
    O nosso bairro tem sido
    privado de investimento.
  • 11:52 - 11:59
    As escolas têm tido dificuldades
    na preparação da nossa população
  • 11:59 - 12:01
    para o futuro.
  • 12:01 - 12:06
    Eu sei que a criatividade
    é uma competência essencial.
  • 12:07 - 12:10
    É preciso criatividade
  • 12:11 - 12:15
    para conseguirmos imaginar
    um futuro muito diferente
  • 12:16 - 12:18
    do que aquele
    que temos à nossa frente.
  • 12:18 - 12:25
    Por isso, todos os artistas do programa
    têm um assistente estudante do secundário
  • 12:25 - 12:29
    um estudante do ensino secundário
    que vem da cidade de New Haven
  • 12:29 - 12:32
    para trabalhar e aprender
    com eles o ofício,
  • 12:32 - 12:34
    a prática deles.
  • 12:34 - 12:36
    E temos visto as formas
  • 12:36 - 12:41
    como mostrando às pessoas
    o poder da criatividade
  • 12:41 - 12:43
    isso as pode mudar.
  • 12:44 - 12:47
    A beleza é complicada,
  • 12:48 - 12:50
    por causa da forma como a definimos.
  • 12:51 - 12:56
    Eu acredito que a beleza e a verdade
  • 12:56 - 12:59
    de certa forma estão ligadas.
  • 12:59 - 13:01
    Há algo
  • 13:03 - 13:04
    belo
  • 13:04 - 13:06
    em dizer a verdade.
  • 13:08 - 13:09
    Ou seja:
  • 13:10 - 13:13
    esse acto de dizer a verdade
  • 13:14 - 13:18
    e a miríade de formas
    como isso se manifesta ,
  • 13:18 - 13:20
    há beleza nisso.
Title:
Será que a beleza pode abrir os nossos corações às conversas difíceis?
Speaker:
Titus Kaphar
Description:

A cor ou a composição de uma obra de arte pode atrair-nos — e levar-nos a ter conversas difíceis e importantes, diz o artista Titus Kaphar. Nesta magnífica palestra, ele reflete a sua evolução artística e leva-nos numa viagem pela sua carreira — desde "O Projecto de Jerome", que se baseia na iconografia religiosa para analisar o sistema judicial criminal dos EUA, até a "Desde um Espaço Tropical", um trabalho avassalador cujo foco são mães negras cujos filhos desapareceram. Kaphar partilha também a ideia que deu origem à NXTHVN, uma incubadora de arte e uma comunidade para jovens na sua cidade natal.

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Video Language:
English
Team:
closed TED
Project:
TEDTalks
Duration:
13:35

Portuguese subtitles

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