(Árabe) A paz esteja com vocês. Plateia: (Árabe) A paz esteja com você. Hana Saleh Eu tinha 17 anos, quando finalmente voltei à Líbia de forma definitiva. Tendo crescido na Suíça, achava que a pior coisa, a coisa mais desafiadora, quando eu era criança, era soletrar a palavra "Switzerland". Mesmo hoje, décadas depois, já como professora assistente, ainda odeio escrever essa palavra. No celular, inseri atalhos para essa palavra, usando a transliteração inglesa "Sweesra", que é a versão em árabe, para que escrevesse automaticamente. Que alívio! Obrigada à tecnologia. Existem tantas palavras assustadoras em quase todos os idiomas, seja pela pronúncia ou pelo próprio significado, mas não há desculpas para não aprendê-las. Dizem que a vida é uma escola, e há vários elementos que ajudam na formação do conhecimento. No início da vida, aprendemos com nossos pais, mas por causa de certas razões mundanas, eles não podem ensinar tudo. Talvez por isso tenhamos que ir à escola, para aprender com outros indivíduos, especializados em suas áreas. Assim, nossas capacidades linguísticas são estabelecidas, através da absorção de palavras que vêm dos materiais didáticos e saem das bocas dos nossos professores. Com as palavras que falamos, através da comunicação, nos expressamos e nos comunicamos uns com os outros. Porém, nem todos têm o dom do discurso. Eu particularmente não sou muito falante, sobretudo quando se trata de expressar meus pensamentos e emoções íntimos. Quando criança, eu era muito tímida, especialmente com estranhos, e logo encontrei conforto na escrita. No final do ensino fundamental, escrevi uma pequena composição sobre minha infância, e no final do dia, descobri que meu professor leu isso para quase metade da escola. Um tempo depois, ele me falou que minha carreira teria certamente algo a ver com a escrita, e ainda naquela época, tive um bom pressentimento que seria assim. No ensino médio, comecei a ler romances completos. Meu primeiro romance clássico foi escrito por Louisa May Alcott, "Mulherzinhas". Depois vieram trabalhos contemporâneos como os de Mills & Boon. Quando tinha 14 anos, fiquei obcecada por histórias em quadrinhos, como qualquer outro adolescente. Costumava ler Nabil Farouk. Ele é o autor de "Adham Sabri: The Man of the Impossible." Costumava ler também os quadrinhos da Archie Comics. Inspirei-me na personagem de Betty Cooper para escrever diários, e faço isso até hoje. Quando comecei a universidade, descobri que, de alguma forma, minhas técnicas de escrita enferrujaram, especificamente na organização, estruturação das sentenças e no foco. Até esse ponto, achava que tinha sido uma ávida leitora, e isso não seria um problema para mim. Porém, isso me estimulou a mudar minha abordagem em relação à leitura. Comecei a ler como estudante, ou seja, não apenas por prazer, mas também aprendendo os truques do ofício com os mestres. Através do incentivo dos meus colegas e da minha mentora, Sra. Sabah Kareem, Deus abençoe sua alma, decidi fazer meu mestrado em Letras, e no final de 2010, recebi meu certificado em Letras por desempenho e publicação da Universidade de Leeds. Tive a maior chance de todas lá, de explorar minhas habilidades com a escrita de contos, assim como escrevendo para o teatro e cinema. A escrita criativa honra a imaginação, então, por que parece ser uma área ou zona isolada que raramente investigamos a fundo para lhe dar espaço para prosperar e florescer? Permitam-me falar de minha experiência ensinando escrita criativa na Líbia. E digo Líbia como um todo, porque acredito que é um tema presente em quase todas as regiões da Líbia: o problema de aprender uma língua estrangeira e de realmente usá-la. No início de 2010, pouco depois de voltar do Reino Unido, inseri escrita criativa pela primeira vez na Universidade de Misurata. Estava tão entusiasmada com tudo, mas os estudantes aparentemente não. Apenas um estudante se matriculou naquele semestre. E, por isso, o curso foi cancelado. Contudo, o próximo semestre foi mais promissor. Consegui 11 estudantes, nada mau, depois vieram 50, e, então, incríveis 80 alunos em um semestre. Agora, para a escrita criativa, o número de alunos pode ser um problema, sobretudo quando estão amontoados em uma sala com 35 alunos ou mais. Mas a maior dificuldade, no entanto, é quando você percebe que eles não estão aprendendo. Como é isso? Independentemente das várias vezes em que eles vêm a mim e falam abertamente: "Odiamos escrever", considero que as principais razões, subjacentes a esse ódio, na opinião deles, sejam: "Eu não sei como escrever" e "Por que eu deveria? Não tenho que fazer isso". Temos então: "Como escrever?" versus "Por que escrever?" Agora, em relação a primeira pergunta, não irei falar sobre analfabetismo, porque, de fato, qualquer um que passou por um considerável período de escolarização saberá com certeza como escrever. Através da escrita criativa, estou lidando com a escritura de contos. Posto isso, é preciso estar munido de ideias. Normalmente, ideias surgem da inspiração, e parece que o que trava meus estudantes é a inspiração limitada. Eles se confinaram ou se restringiram a uma quantidade bastante limitada de tópicos e temas sem mencionar uma lista de palavras inadequadas usadas por eles. Agora, sinceramente, não sou muito talentosa para criar ou conduzir pesquisas, mas de acordo com minha experiência ensinando escrita criativa por três anos, penso que os temas e tópicos mais dominantes que encontrei são... Temos cinco categorias. Começamos pelo tema pobreza. O tema é um meio de, na verdade, levar o personagem principal a trabalhar em funções sem prestígio. Por exemplo, ele trabalha em uma cozinha, ou ele trabalha com diarista, ou, até mesmo, ele virou um criminoso. O segundo tema, que, a propósito, é bastante popular entre as garotas, é o casamento. A personagem principal tem que deixar aquele que ela ama para casar-se com outra pessoa, sabe, que é mais rico ou tem mais influência na sociedade. Câncer parece ser o tópico preferido entre as doenças. Sempre que têm uma chance, eles falam sobre alguém que ficou doente e depois morreu. Essa é a maneira mais fácil de se começar a falar sobre a morte. Depois vem acidentes de carro. Esse é meio surpreendente para mim, porque todas as vezes que eles querem matar os pais, imaginam eles em um acidente de carro. Disputas sociais, ou seja, herança é um tema comum, sabe, sempre o tio malvado. Também o triângulo amoroso que acontece na escola. Bem, alguns de vocês podem pensar, de fato, que isso é bom, devido ao histórico dos estudantes. De fato, é, porque as pessoas tendem a escrever sobre aquilo que conhecem muito bem. Mas o problema é quando elas têm que escrever histórias que acreditam ser o que as outras pessoas esperam delas. É aí que a limitação repousa. Agora, imagine, voltando o slide, imagine que essas cinco colunas são a estrutura de nossa cultura, incrivelmente limitadas e, ao mesmo tempo, muito cansativas quando você se submete a isso todo semestre. Houve um semestre em que eu decidi anunciar aos meus alunos: "Por favor, não matem os pais em acidentes de carro. Se não querem que eles na história, mantenham-nos em casa sãos e salvos, e comecem a falar de algo que valha a pena". Precisamos pensar além desses padrões culturais. Um colega meu uma vez me disse: "Estamos lidando com estudantes que não experimentaram a vida". E ele está correto. Como podemos esperar criatividade dos estudantes, cuja experiência contempla três dos cinco tópicos que eu citei? É esse o momento em que temos que por um livro nas mãos deles. A leitura não só faz de você um escritor melhor. Ao viver a vida de personagens fictícios, aprendemos como eles lidam com circunstâncias atípicas e aprendemos através de seus erros. Podemos mergulhar em culturas diversas, de qualquer parte do mundo, e sem precisar sair do lugar, expandimos nossas mentes de forma exponencial e estamos praticamente prontos para o extraordinário. Assim, voltando àqueles padrões culturais, e supondo que temos estudantes que já leram livros que falam sobre esses temas e tópicos, quais são as possibilidades? Quais são as possibilidades criativas que eles serão capazes de apresentar? Então, temos os cinco tópicos que eu mencionei mais cedo, esses cinco tópicos que parecem se repetir tanto, e exemplos de romances que lidam com esses temas. "Jogos Vorazes" é um ótimo exemplo que trata do assunto pobreza, escrito por Suzanne Collins. A personagem principal é forçada a entrar em um torneio em que os participantes matam uns aos outros para ganhar. Essa é uma ideia. O segundo, "Orgulho e Preconceito", de Jane Austen. Esse é um romance escrito há quase 200 anos, dois séculos atrás. O que faz ele durar tanto e ainda ser lido, me refiro ao enredo sobre casamento, é porque a personagem principal, Elizabeth Bennet, se opõe aos padrões sociais. Imaginem isso acontecendo naquele tempo. "Uma Prova de Amor", de Jodi Picoult, traz temas brilhantes, fala de problemas de saúde. Há mais de um problema de saúde, além do câncer. Temos a leucemia mieloide aguda, que é câncer de sangue e medula óssea, há também abuso de drogas nesse romance, assim como um caso de epilepsia. Não vou falar do acidente de carro. Por favor, não matem os pais. Então, adentrando ao último tema, disputas sociais, "In the Country of Men", escrito por Hisham Matar, é uma história que se passa em um caos político que, com efeito, afetou a vida cotidiana, como resultado do que aconteceu na Líbia na década de 70. Então, antes de avançarmos, gostaria de creditar rapidamente alguns dos trabalhos anteriores de meus alunos, que conseguiram produzir histórias extremamente criativas. Um deles escreveu sobre um norte-americano que se converteu ao islamismo após viver com um grupo de tuaregues na Líbia. Um segundo bom exemplo é de um aluno que escreveu sobre a luta de um homem que tenta fugir da guerra civil de Ruanda nos anos 90. O terceiro exemplo que gostaria de apresentar a vocês é sobre um ser nascido da névoa que é o último do seu tipo, o único capaz de resistir diante do mal. A propósito, foi escrito pelo tradutor que está traduzindo para vocês. Então, voltando às questões: como escrevo após fazer essas leituras, após expandir minha mente? Bem, é claro que precisa começar lendo livros nos quais tenha interesse e de autores que... cujo estilo de escrita lhe atraia. É assim que você começa a deslizar a caneta no papel. Você faz um esboço, depois um rascunho, reorganiza, talvez, umas 100 vezes, e aí está pronto. A segunda questão é por que devo escrever? Na verdade, você não é obrigado a escrever exceto se for um dos meus alunos, aí você tem que escrever. Contar histórias é uma arte, ajuda-o a traduzir os pensamentos mais íntimos e até a sua filosofia de vida. Na verdade, é por isso que as pessoas apreciam a leitura. Existe uma literatura que precisa ser transmitida, coexistindo e se entrelaçando através de gerações. Gostaria de concluir com uma citação de Elif Shafak, o autor de "The Forty Rules of Love". Certo. "Conectar pessoas a terras, países e culturas distantes não é uma das maiores virtudes da boa literatura? Realmente é. Então, permita-se pensar fora da caixa. Obrigada. (Aplausos)